Segundo o levantamento Nascer no Brasil da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de 2012, aponta que 45% das mulheres atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) sofrem violência obstétrica, enquanto da rede privada são 30% das pacientes. E de acordo com o Ministério da Saúde, 65,9% das vítimas são negras.
Para a ginecologista Cecilia Oliveira Pereira, do grupo Ifé Medicina, “esses números oferecem apenas o fator da amostragem, mas entendendo a violência obstétrica como apropriação dos corpos e dos processos reprodutivos das mulheres por profissional de saúde, durante o período da gestação, do parto e do puerpério, e entendendo que, historicamente, a medicina é majoritariamente composta por profissionais brancos, há portanto estruturalmente, uma relação de iniquidade entre a figura que está no poder intelectual e técnico e a que está em situação de conformidade”.
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A médica também alerta sobre os cuidados com o bebê, especialmente, quando a mãe vive em vulnerabilidade social. “É importante que os cuidados com o bebê não sejam de sua responsabilidade exclusiva. É necessário o apoio de toda a família, bem como de toda a sociedade e do Estado” e completa: “estratégias essenciais visam o fortalecimento de vínculo de confiança entre gestantes e os profissionais, especialmente garantindo pré-natal a essas pacientes, tentar oferecer recursos necessários à família de origem é uma maneira de promover a manutenção da criança do seio familiar quando possível, cuidado à saúde mental e fortalecimento a autonomia, estímulo ao alojamento conjunto, que é um direito e que favorece o estabelecimento efetivo do aleitamento materno”.
Dra. Cecília também explica que a maioria dos obstetras serem homens brancos impacta na falta de um parto humanizado. “Devido a institucionalização do parto, houve uma mudança no perfil ao atendimento a paciente, transferindo a função das parteiras para para os médicos, profissão historicamente masculina e elitista. Durante esse processo, a construção da relação médico paciente se baseava não só na necessidade pelo serviço de quem detinha o conhecimento, mas no privilégio estrutural que a profissão proporcionava”.
“O atendimento respeitoso à mulher percorre, portanto, a forma que a mulher é tratada em inúmeros aspectos pela sociedade, e especialmente, se tratando de mulheres pretas, de como essa sociedade trata a base da pirâmide sócio-racial”, finaliza.
Nesta semana, o público tem acompanhado o caso do anestesista Giovanni Quintella Bezerra que foi flagrado estuprando uma mulher enquanto ela estava sedada para realizar uma cesárea no Hospital Heloneida Studart, em São João de Meriti (RJ).
Depois da repercussão das imagens, uma mulher negra também abriu um boletim de ocorrência por suspeitar também ter sido vítima de violência sexual. Na ocasião, ela ainda perdeu o filho que sequer conseguiu pegar nos braços devido a anestesia em excesso. A polícia civil informou que está investigando 30 possíveis casos de estupro de pacientes deste médico.
Além do crime de abuso sexual, também pode ser considerado uma violência obstétrica negar o direito a acompanhante, garantido por lei durante todo o processo do parto e pós parto, agressão física e verbal, discriminação racial e negação de atendimento, por exemplo.
Em caso violência obstétrica, a vítima pode realizar a denúncia: “no próprio hospital através de ouvidoria e auxílio do serviço social hospitalar, além de órgãos públicos como a Defensoria Pública, Disque Saúde (136) ou Disque violência contra a Mulher (180), ainda é possível acionar o Conselho Regional de Medicina e, para apurar a existência de algum crime, como lesão corporal ou homicídio, por exemplo, a vítima deve procurar a polícia ou o Ministério Público. Em caso de ser beneficiária de plano de saúde a denúncia pode ser feita na ouvidoria da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)”.
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