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“12º Round: A História de Emile Griffith” — quando o corpo negro dança, luta e se recusa a cair

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Foto: Rony Hernandes

Texto: Rodrigo França

O palco do Sesc Ipiranga, transformado em ringue e encruzilhada, nos lembra: ser negro e dissidente nunca foi só existir — é, sobretudo, enfrentar o mundo e, apesar do peso, permanecer inteiro.

Emile Griffith foi esse corpo impossível de domar. Negro, caribenho, bissexual, campeão mundial em três categorias de peso — mas carregando nos ombros algo muito maior do que cinturões: o peso de quebrar as algemas invisíveis que o mundo impôs a corpos como o dele. O menino que saiu das ilhas do Caribe pra brilhar no ringue dos Estados Unidos não imaginava que sua maior luta não seria contra os adversários, mas contra o preconceito, a homofobia e o racismo que atravessam gerações.

Quando o chamaram de “bicha” em rede nacional — o insulto cuspido por Kid Paret ecoou como um soco forte no estômago. Griffith respondeu com os punhos, mas também com as contradições que acompanham nossos passos. Paret não sobreviveu, e Emile nunca mais pôde andar sem o fantasma desse golpe.

É desse lugar de dor, glória e silenciamento que nasce o espetáculo 12º Round: A História de Emile Griffith, um teatro que não se limita à cena, mas que pulsa como chamado ancestral. Bruno Lourenço, ator premiado e agora diretor desse rito cênico, costura a montagem com elegância e firmeza. Não é sobre vitrine de sofrimento. É sobre dar corpo, voz e dignidade a quem tentaram apagar da história. E, como bom griot moderno, Bruno também assina a trilha sonora, um passeio sofisticado entre a memória e o agora.

A dramaturgia de Sérgio Roveri tem fôlego de maratonista e precisão de poeta. São 12 rounds —cenas que avançam e recuam como as marés, como as memórias embaralhadas de quem carrega cicatrizes. A linearidade aqui não existe, porque também não existe linearidade na travessia preta, na vida dissidente, na luta de quem ousa sonhar fora da caixa.

E que lindo é ver Fernando Vitor dar vida — e que vida! — a Emile Griffith. Como se Griffith fosse entidade atravessando o tempo para cobrar o que lhe é devido. Cada gesto, cada silêncio, cada olhar dele carrega dignidade, dor, beleza, contradição e força. Ao lado dele, Letícia Calvosa que transita entre personagens com a sabedoria de quem sabe que a mãe, a amante, a amiga, a ancestral podem habitar o mesmo corpo. Letícia é firme, delicada, precisa. É ela quem, em muitos momentos, sussurra pra gente que, por trás da dor, existe também o cuidado, o afeto, a resistência que brota das mulheres negras.

Alexandre Ammano veste diferentes peles em cena — o adversário, o aliado, o reflexo — e em cada aparição reafirma: ser homem negro também é lidar com as fronteiras da força e da vulnerabilidade, com o jogo cruel que tenta nos colocar uns contra os outros. Alexandre carrega no olhar a firmeza dos que vieram antes e a inquietação dos que querem um outro amanhã.

A direção de movimento de Tainara Cerqueira transforma o palco em território sagrado, onde o corpo vira linguagem, onde o soco vira poesia, onde o deslocamento é denúncia. Tainara faz o corpo negro dançar e lutar ao mesmo tempo — como se estivesse numa roda de samba, numa gira, numa esquina de Salvador ou Harlem.

O 12º Round não é teatro para aplaudir e esquecer. É teatro que atravessa, que mexe, que dá soco e abraço ao mesmo tempo. É espetáculo que reafirma que, mesmo cansados, mesmo feridos, seguimos. E como Emile Griffith, seguimos dançando, lutando, dizendo ao mundo: aqui ninguém cai fácil.

E que o gongo toque. Porque nós estamos prontos para o próximo round.

Serviço

O espetáculo “12º Round: A História de Emile Griffith” estará em cartaz até o dia 13 de julho.

Horário: Sextas-feiras e sábados, às 20h | Domingos e feriados, às 18h

Sessões Extras: 9 de julho (qua), às 18h; 10 de julho (qui), às 20h

Ingressos: R$ 18 (Credencial Plena), R$ 30 (meia-entrada), R$ 60 (inteira)

Link da Atividade: https://www.sescsp.org.br/programacao/12o-round-a-historia-de-emile-griffith/

Sommelier brasileira denuncia racismo em Portugal após ser demitida para “dar um ar mais limpo” ao bar

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Foto: Letícia Diniz

A sommelier carioca Namíbia Kaiowa, de 38 anos, denunciou ter sido vítima de racismo em Portugal enquanto trabalhava em um bar na cidade de Lisboa. Segundo ela, foi demitida sob a justificativa de que era preciso “dar um ar mais limpo” ao local, após ser considerada um incômodo para a clientela.

O caso foi revelado pela coluna Portugal Giro, do jornal O Globo, e expõe mais um episódio de racismo enfrentado por pessoas negras no país europeu — especialmente no contexto de migração.

Namíbia relata que foi dispensada de forma arbitrária pela própria dona do estabelecimento. “Ela me chama na parte da manhã, me despede de modo ilícito dizendo que não precisava mais do meu trabalho, que ‘clientes’ se ‘incomodavam’ com a minha presença e isso não era bom para o negócio”, disse.

Ao questionar seus direitos, como o pagamento pela quebra de contrato, a sommelier foi pressionada a assinar um acordo de demissão mútua. Segundo a empresária portuguesa, provar o racismo seria “perda de tempo”.

“Ela afirmou que quer dar um ar ‘mais limpo’ no bar. Que era melhor eu assinar como se fosse mútuo acordo e que provar, aos olhos da lei portuguesa, que foi racismo estrutural, seria uma perda de tempo”, relembrou Namíbia.

Mesmo o racismo não sendo criminalizado em Portugal, Namíbia foi orientada por uma advogada a formalizar a denúncia. “A ideia é justamente não deixar que continue acontecendo e que as pessoas se animem a dizer”, afirmou.

Aumento dos casos de racismo em Portugal

Segundo relatório da Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância (ECRI), ligada ao Conselho da Europa, os casos de discurso de ódio e discriminação racial aumentaram significativamente em Portugal no último ano. De acordo com o documento, imigrantes, pessoas negras, a comunidade cigana e LGBTI+ têm sido alvos constantes de ataques, especialmente nos espaços públicos.

A ECRI também destacou a ausência de dados oficiais sobre crimes de ódio em Portugal, o que dificulta o enfrentamento efetivo do problema e expressou preocupação com o crescimento da xenofobia e do discurso anti-imigração, frequentemente impulsionado por informações falsas que associam imigrantes à criminalidade ou a um suposto peso para o sistema de seguridade social do país.

Ex-funcionária de Alexandre Pires é condenada por furtar R$ 1,5 milhão do cantor

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Foto: Van Campos/Agnews

A ex-administradora financeira Uiara Regina Cardoso Teixeira foi condenada a mais de 16 anos de prisão pelos crimes de furto qualificado e lavagem de dinheiro. Segundo a decisão da 3ª Vara Criminal de Uberlândia, ela desviou cerca de R$ 1,5 milhão das contas pessoais e empresariais do cantor Alexandre Pires e de sua esposa, Sara Campos, entre os anos de 2014 e 2018.

O marido de Uiara, Elcione Cassiano, também foi condenado a seis anos de prisão por lavagem de dinheiro. Ambos respondem em liberdade enquanto aguardam julgamento de recurso apresentado pela defesa ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).

De acordo com o processo, a movimentação financeira da ex-funcionária chamou atenção pelo padrão de vida considerado incompatível com o salário de cerca de R$ 4 mil que recebia na época. Segundo Alexandre Pires, ela passou a ostentar viagens, carros de luxo e procedimentos estéticos, o que levantou suspeitas.

A Justiça também identificou uso indevido de procurações que deram a Uiara acesso a contas bancárias e documentos do casal. O juiz André Ricardo Botasso destacou em sua sentença que a ex-funcionária movimentou valores “muito acima do que recebeu no período”, sem apresentar comprovação de origem dos recursos.

Além da pena de prisão, Uiara foi condenada a pagar R$ 1,5 milhão em indenização e teve bens bloqueados para ressarcimento das vítimas. A sentença também prevê o pagamento de multa.

O Ministério Público de Minas Gerais apresentou denúncia em 2020, apontando que Uiara se valeu da relação de confiança para cometer os crimes. Ainda segundo o MP, ela ocultou a origem do dinheiro, comprou imóveis e promoveu reformas em nome próprio e de terceiros.

Durante o processo, a defesa alegou que os valores movimentados eram compatíveis com empréstimos e ajudas recebidas. Também solicitou perícia contábil, mas os argumentos não foram acolhidos pela Justiça.

Em nota divulgada nesta segunda-feira (30), a advogada Luciana Aparecida de Freitas, que representa os réus, afirmou que a defesa vai comprovar a inocência do casal. Segundo ela, existe uma ação cível sigilosa em andamento que busca recuperar documentos que comprovariam o destino dos valores.

“A defesa de UIARA TEIXEIRA, vem à público declarar que a sentença proferida já foi alvo de recurso e que o Egrégio Tribunal de Minas terá a oportunidade de reformar a decisão, absolvendo-a”, diz o comunicado.

Outras três pessoas que também foram denunciadas por participação no suposto esquema de lavagem de dinheiro e falsidade ideológica foram absolvidas.

A assessoria de Alexandre Pires informou que o cantor e sua esposa não irão se pronunciar sobre o caso.

Corpo de Juliana Marins deve chegar ao Brasil nesta terça (1º) e passará por nova autópsia

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Foto: Reprodução

O corpo de Juliana Marins, publicitária brasileira que morreu após cair em vulcão no Monte Rinjani, na Indonésia, está a caminho do Brasil. O traslado foi confirmado pela companhia aérea Emirates, responsável pelo transporte. A previsão é que o desembarque em São Paulo seja nesta terça-feira, 1º de julho, de onde seguirá para o Rio de Janeiro.

Em nota divulgada na segunda-feira (30), a empresa comunicou que os preparativos para o transporte foram feitos em “coordenação com a família”, afirmou a companhia.

Logo após a chegada, o corpo passará por uma nova autópsia, conforme solicitação da Defensoria Pública da União (DPU), acolhida pela Advocacia-Geral da União (AGU). A petição foi encaminhada à 7ª Vara Federal de Niterói e pede que o exame seja realizado em até seis horas após o desembarque.

A medida foi motivada por inconsistências entre o médico legista Ida Bagus Alit e a Basarnas, a agência nacional de buscas e resgates da Indonésia, que divergem quanto ao momento preciso da morte de Juliana, que pode ter ocorrido entre 12 e 24 horas antes da chegada da equipe de resgate. As autoridades afirmam que Juliana foi localizada já sem vida na noite de terça-feira (24), mas o médico relata que ela pode ter sobrevivido até quarta-feira.

A defensora pública Taísa Bittencourt, responsável pelo caso, afirmou que a nova perícia busca esclarecer lacunas no laudo internacional. Também foi solicitado que o traslado até o Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto, no Rio, seja feito por viatura da Polícia Civil ou da Polícia Federal, que já se colocaram à disposição para colaborar com o transporte.

Segundo Bittencourt, a rápida deterioração do corpo pode comprometer a coleta de elementos fundamentais para determinar a causa e o tempo exato da morte, informações consideradas cruciais para apurar eventual omissão de socorro por parte das autoridades indonésias.

A AGU também confirmou a realização de uma audiência de emergência nesta terça-feira, às 15h, com participação da DPU e do governo do Rio de Janeiro, para definir os detalhes sobre a realização da nova autópsia. A reunião foi determinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Paralelamente, a DPU encaminhou ofício à Superintendência da Polícia Federal no Rio pedindo a abertura de inquérito para apurar as circunstâncias da morte da brasileira.

Juliana foi encontrada morta quatro dias após desaparecer em uma área de difícil acesso. De acordo com o atestado de óbito emitido pelas autoridades indonésias. O velório e o sepultamento de Juliana estão previstos para ocorrer em Niterói (RJ), onde ela morava com a família.

O cansaço seletivo da internet e a pressa em esquecer Juliana Marins

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Fonte: reprodução

Por Priscilla Lopes Arantes

Nos últimos dias, acompanhamos com tristeza, indignação e uma avalanche de informações contraditórias a notícia da morte de Juliana Marins, jovem niteroiense que caiu durante uma trilha em um vulcão na Indonésia. O caso rapidamente mobilizou a imprensa, as redes sociais e gerou uma onda de solidariedade – que durou pouco. Desde então, o que se vê é um sentimento crescente de saturação, como se houvesse um tempo determinado para a dor alheia ser considerada relevante.

Juliana ainda não voltou para casa. Seu corpo ainda está em trânsito. A família, em um processo de luto interrompido, segue lutando por respostas e por um desfecho digno. Mesmo assim, já há quem diga: “chega desse assunto”, “isso não vai trazê-la de volta”, “deixem ela descansar”. Mas como descansar se não houve sequer o direito ao luto completo? Como virar a página de uma história que sequer foi lida por inteiro?

Esse tipo de “cansaço seletivo” tem se tornado uma marca cruel da era digital. A comoção pública é intensa e performática, mas também descartável. O algoritmo exige novidade. A empatia, por sua vez, parece ter prazo de validade. A dor precisa ser rápida, contida e silenciosa. O luto só é aceito quando não exige demais.

É impossível não notar como esse padrão se repete especialmente quando a vítima é uma mulher negra. Juliana era uma mulher negra, e embora isso não devesse determinar a forma como sua morte é tratada, sabemos que determina. A indignação coletiva parece ter um filtro racial, e a empatia, um limite de cor e classe. A insistência da família por uma nova autópsia, os relatos de demora no resgate e as falhas de comunicação das autoridades indonésias são vistos, por muitos, como “exagero” ou “vitimização”. Se não for para virar notícia de consumo imediato, então que se esqueça. A pressa em silenciar sua história é um espelho desconfortável do quanto ainda naturalizamos a desumanização de determinadas vidas.

E como se não bastasse o abandono narrativo, agora começa também a tentativa de responsabilizar Juliana por sua própria morte. Em vez de solidariedade, surgem as críticas disfarçadas de bom senso: “ela era adulta”, “sabia dos riscos”, “por que não contratou seguro?”, “quem mandou se aventurar?” Como se o desejo de viver intensamente fosse um privilégio reservado a alguns corpos. A tentativa de culpabilizá-la é cruel – e comum quando a vítima não se encaixa no ideal social de inocência ou merecimento. Juliana não morreu porque foi imprudente. Morreu porque algo deu errado. E mesmo que tivesse sido uma fatalidade – o que, até agora, segue sem confirmação técnica – culpar quem partiu é uma violência dupla. Quando a vítima é uma mulher negra, essa violência raramente encontra freios.

O que se espera, ao menos, é dignidade. Dignidade para a memória de Juliana. Dignidade para a dor da sua família. Dignidade para que seu nome não seja tratado como um “assunto superado” antes mesmo que o avião que traz seu corpo tenha pousado. O Brasil precisa aprender a lidar com a morte para além do espetáculo, e com o luto para além do clique.

A internet tem o poder de amplificar vozes e gerar mobilização. Mas também carrega o vício de reduzir tragédias a entretenimento, de tratar vidas como virais, e dores como “notícias velhas”. Precisamos nos perguntar: quem tem direito à comoção contínua? Quem pode viver – e até morrer – sem ser culpado por isso?

Juliana merece mais do que o silêncio apressado das redes. Ela merece justiça. E sua família, respeito.

As últimas palavras da mãe de Michelle Obama deram a ela uma reflexão sobre o tempo e a finitude

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Por Silvia Nascimento

Em entrevista ao podcast Wild Card, da NPR, Michelle Obama compartilhou um dos momentos mais marcantes que viveu ao lado da mãe, Marian Robinson, que morreu em maio de 2024, aos 86 anos. Durante os últimos meses de vida, Marian ficou na casa da filha no Havaí, cercada de cuidados médicos e do afeto da família. Michelle contou que “a última fase da doença” foi difícil, mas também um presente, porque a mãe precisou aceitar que seria cuidada: “Ela não queria ser um peso”.

Em um dia comum, enquanto assistiam a um dos programas de tribunal preferidos de Marian, ela se virou para Michelle e disse, com serenidade: “Isso passou rápido”. A frase curta, mas poderosa, fez Michelle refletir sobre como o tempo pode parecer breve mesmo para quem vive uma vida plena. Ela contou: “Essa mulher que se preparou para a morte, que sempre falava ‘Estou pronta para morrer, ninguém precisa ficar velho demais’, naquele momento percebeu que estava chegando ao fim”. Ao segurar a mão da mãe, Michelle perguntou do que ela estava falando, e Marian respondeu apenas: “A vida”.

Michelle disse que aquelas palavras mostraram que “mesmo quando você se prepara e vive uma vida boa, nunca está realmente pronto para ela terminar”. Ela afirmou: “Eu gostaria que eu tivesse mais tempo. Então tento viver minha vida pensando nisso”.

A ex-primeira-dama também revelou que não sente medo da morte, mas faz questão de ser consciente sobre a forma como passa seus dias. Ela comentou: “Se eu for realmente abençoada, ainda terei cerca de 25 verões. Quero que os próximos dez anos passem devagar”. Ao refletir sobre a velocidade com que o tempo passa, Michelle disse: “Se não prestarmos atenção, os anos simplesmente escorrem. Você acaba gastando um ano e, no fim, se pergunta: fez algo com quem você queria? Fez o que realmente queria fazer?”.

Após a morte da mãe, Michelle compartilhou que Barack Obama, em um tom que misturava humor e realidade, disse a ela que agora era “a próxima”. A observação reforçou seu sentimento de que a vida vai se renovando e que cada um passa a ocupar outro lugar na família. Esse período, somado ao momento em que as filhas deixaram a casa, a motivou a retomar a terapia e a pensar com mais profundidade sobre o tempo que ainda tem. Para Michelle Obama, as últimas palavras de Marian foram mais do que uma despedida: “O que aquilo me disse é que, se você está vivendo uma boa vida, sempre vai sentir que queria mais tempo”.

“Mfinda”: o primeiro afro-anime da história une Japão, Congo e Viola Davis na produção

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Créditos: Divulgação e Too Fab/Associated Press

Texto: Carolina Viana

Uma floresta mística, duas meninas de épocas diferentes e uma jornada espiritual guiada pelos Nkisi — recipientes sagrados que guardam espíritos ancestrais. Assim começa a narrativa de “Mfinda”, o primeiro afrime (afro-anime) já anunciado, e que promete revolucionar a representatividade negra no universo da animação.

Produzido pela N LITE, empresa multimídia criada por Christiano Malik, o longa é uma coprodução com o Japão e conta com nomes de peso na equipe. A atriz e produtora Viola Davis se une ao projeto por meio da JuVee Productions, ao lado de Masao Maruyama, lenda da animação japonesa e cofundador dos estúdios Madhouse e MAPPA, responsáveis por obras como Tokyo Godfathers.

Ambientado na República Democrática do Congo dos anos 1970, o filme acompanha Odi, uma menina de 12 anos em meio a uma crise familiar durante um momento de instabilidade política. Ao se ver em perigo, ela é transportada para Mfinda, uma floresta ancestral e espiritual no reino pré-colonial congolês. Lá, encontra Nasambi, jovem de outro tempo. Juntas, enfrentam forças sombrias em busca dos mágicos Nkisi — que podem ser a chave para retornar ao mundo real.

Segundo Malik, a N LITE nasceu da ideia de “iluminação”, palavra que atravessa tanto filosofias budistas quanto saberes afro-indígenas, e que inspira a missão da empresa: criar histórias que mostrem o mundo como ele é, e como sonhamos que ele seja. “Mfinda” é só o primeiro passo. A N LITE já planeja parcerias para desenvolver novas animações e séries focadas em culturas negras e indígenas ao redor do mundo.

Ainda sem data de estreia, “Mfinda” já está entre os lançamentos mais esperados por quem acompanha o avanço da representatividade preta na animação global. Um afrofuturismo animado, ancestral e inédito.

Cidade de Deus é um dos melhores filmes do século: mas o que ele nos diz sobre a vida de pessoas negras?

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Crédito: Netflix

Por: Luciano Ramos

A escolha de Cidade de Deus como um dos melhores filmes do século XXI não causa
espanto. A obra tem ritmo, força estética, narrativas marcantes. É, sem dúvida, uma aula
de cinema. Mas a aclamação do filme também nos obriga a encarar uma questão
incômoda: por que as histórias de dor, violência e morte de pessoas negras se tornaram
nosso principal produto cultural de exportação?

Cidade de Deus é, essencialmente, um filme sobre juventudes negras. Mas não sobre
seus sonhos, suas invenções ou suas alegrias. É sobre sua criminalização, sua morte
precoce, sua exclusão brutal. E isso importa. Porque quando o cinema brasileiro e
internacional celebra essa narrativa como obra-prima, o que se está exaltando não é
apenas o cinema, é o imaginário de que corpos negros são sinônimo de tragédia, de
barbárie, de violência.

O que significa para o Brasil que um dos seus maiores sucessos audiovisuais seja a
romantização, com boa trilha sonora e fotografia caprichada , da falência do Estado
sobre um povo majoritariamente negro e favelado? Que lugar esse filme ocupa na nossa
memória coletiva? Que tipo de humanidade ele permite que a gente enxergue nas
personagens negras que retrata?

Mais que isso: quem se beneficiou com esse sucesso? Muitos dos atores negros,
retirados diretamente das favelas para dar realismo à obra, voltaram ao anonimato, à
precariedade, à mesma marginalização que o filme denuncia. O Brasil que aplaudiu o
filme não garantiu sequer oportunidades reais para os jovens negros que o interpretaram
com tanta verdade. Isso também é racismo estrutural.

Cidade de Deus é brilhante, sim. Mas sua consagração internacional também revela uma
lógica perversa: a sociedade brasileira só parece interessada em escutar vozes negras
quando elas falam de dor. Quando o negro chora, morre ou mata — a câmera liga.
Quando ele sonha, lidera, constrói ou transforma — o enquadramento desaparece.

É preciso perguntar: e se Cidade de Deus fosse sobre crianças negras que escrevem,
inventam, aprendem, dançam, curam, governam, cuidam umas das outras? Será que
teria sido aclamado do mesmo jeito?

Precisamos tensionar essa narrativa.

Porque não basta aplaudir o talento do filme, se não nos indignarmos com o projeto de
país que ele revela — e que ainda se mantém: um país que filma meninos negros com
armas, mas nega a eles livros, filmes, verbas, visibilidade e existência plena.

Celebrar Cidade de Deus é, sim, reconhecer a potência do cinema brasileiro. Mas é
também oportunidade para denunciar que ainda são os corpos negros os que mais
sangram para sustentar a estética do nosso cinema. Está na hora de esses corpos também
contarem suas próprias histórias — não só com dor, mas com dignidade, afeto e futuro.

Atenção às manchas escurecidas: pode ser acantose nigricans

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Por Rafa Bastos – Nutricionista

Manchas escurecidas com textura aveludada na pele — especialmente no pescoço, axilas e virilhas — não são sujeira, nem sinal de falta de higiene. Esses sinais podem indicar um desequilíbrio metabólico importante, como resistência à insulina, condição comum em pessoas com obesidade, pré-diabetes ou diabetes tipo 2.


Esse quadro clínico é conhecido como acantose nigricans, uma alteração cutânea provocada pelo excesso de insulina circulante no sangue. A insulina em níveis elevados estimula hormônios como o IGF-1 (fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1), que atua nas células da epiderme e provoca o escurecimento e o espessamento da pele em regiões específicas do corpo.


É fundamental destacar que a população negra é desproporcionalmente afetada pelo diabetes tipo 2, uma realidade fortemente influenciada pelo racismo estrutural, que impacta o acesso à saúde, alimentação adequada e oportunidades de cuidado preventivo.
Por isso, reconhecer sinais como a acantose nigricans é um passo importante para o diagnóstico precoce e a interrupção do avanço de doenças silenciosas, mas graves. No Brasil, quase metade das pessoas com diabetes não sabem que têm a doença — estima-se que 46% vivem com o diagnóstico desconhecido. Isso reforça a importância da informação, do cuidado e da escuta atenta aos sinais que o corpo dá.
Diante de sinais como estes, é importante buscar avaliação com profissionais de saúde qualificados. Investigar precocemente alterações metabólicas pode prevenir o agravamento de condições como o diabetes tipo 2, especialmente em populações mais vulnerabilizadas pelo racismo estrutural.


A atuação integrada de médicos, nutricionistas e outros profissionais é essencial para o diagnóstico e manejo adequado, promovendo não apenas o controle da doença, mas também mais qualidade de vida e acesso a cuidados que respeitem as especificidades de cada pessoa.

Chef Bianca Oliveira compartilha saberes e sabores ancestrais em celebração ao Orgulho LGBTQIAPN+

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Foto: Rafael Borgatto

Neste Dia do Orgulho LGBTQIAPN+, 28 de junho, celebramos histórias que rompem padrões em uma sociedade racista e heteronormativa. Uma dessas figuras é a empresária e afrochef Bianca Oliveira, idealizadora da Casa do Dendê Aracaju, é uma mulher preta, lésbica, mãe solo e filha de axé, que transforma a cozinha em ferramenta de existência e reconexão com nossas raízes.

Recentemente, durante as celebrações do Mês do Orgulho, ela levou seu conhecimento para uma vivência especial na Casa Linda Brasil, em parceria com a Casa Mor LGBTQIAPN+, também na capital de Sergipe. Compartilhando saberes da culinária afro-brasileira, além de trocas potentes sobre cultura, pertencimento e coletividade.

“Muito feliz de estar aqui com os meus iguais para transmitir um pouco da cultura culinária afro-brasileira, afro-diaspórica, trazendo alguns alimentos, alguns insumos. Essa vivência funciona de uma forma em que todos cozinham comigo, o preparo é feito de forma coletiva para que a gente realmente transmita a nossa energia para o alimento, o nosso axé”, declarou em vídeo publicado nas redes sociais. 

A Casa do Dendê, da Chef Bianca, dedicada à culinária afro-brasileira, é reconhecida por pratos como caruru, vatapá e moqueca de banana-da-terra. Em 2024, foi homenageada no quadro “Acredite em Quem Quiser”, exibido no Domingão com Huck. O programa destacou a importância da culinária de terreiro e a potência de espaços como o criado por Bianca, que resgatam tradições e fortalecem a autoestima preta por meio da comida.

O estabelecimento também promove eventos como o Mesa Ancestral, encontros que reúnem chefs negras para compartilhar saberes e sabores ancestrais.

Em 2023, a sergipana ainda foi eleita Top 10 da Expo Favela Brasil, figurando entre as iniciativas mais inspiradoras de empreendedorismo nas periferias e comunidades negras do país.

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