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Festival Sesc Culturas Negras resgata herança do tempo para celebrar a existência negra

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Fotos: Divulgação

Em 2025, o Festival Sesc Culturas Negras celebra sua segunda edição e traz como tema a “Existência Negra”, conceito que vai além do simples ato de viver para assumir a trajetória histórica de saberes, da resistência, da resiliência e dos afetos moldados por ensinamentos ancestrais. A programação com atrações gratuitas e pagas, que ocorre entre 10 e 15 de junho em São Paulo, transforma o festival em um grande quintal que celebra passado, presente e futuro entrelaçando-os por meio de apresentações artísticas, oficinas, rodas de conversa e vivências.

A abertura acontece no Sesc Vila Mariana, localizado na zona sul da capital paulista e recebe a intervenção “Encruzilhadas”, um encontro artístico multicultural com Zé Manuel, Ayô Tupinambá e Safira, seguido da apresentação da Orquestra e Balé Afrikanse, que une o pensamento do renomado jornalista e intelectual com o talento de músicos, percussionistas e dançarinos africanos e/ou imigrantes residentes no Brasil.

No segundo dia do festival, o Sesc Pompeia celebra sua programação especial como Quintal do Samba, fazendo uma homenagem aos mestres do samba rock que fizeram história nos bailes da cidade. O show Os Opalas: da Batucada ao Groove traz um repertório que propõe uma viagem nostálgica pelos sucessos do gênero, além da interpretação de canções autorais da banda. Já o Sesc Santana abre a noite com o Podcast +PRETA ao vivo, apresentado pela jornalista Adriana Couto, que possui uma trajetória profissional no jornalismo musical, com participação do cantor Salgadinho, ícone do pagode dos anos 90.

A infância também terá um espaço especial nos quintais do festival, em especial no Sesc Consolação, nomeado como Quintal dos Erês. Que receberá um bate-papo sobre Infâncias Negras, com a presença da professora e escritora Kiusam de Oliveira, Leticia Nascimento e mediação de Jerusa Gomes. O encontro levará uma reflexão sobre as potencialidades das crianças como portadoras de legados e saberes ancestrais. Além disso, a unidade oferecerá uma aula aberta intergeracional que celebra o canto e as danças congolesas, conduzida pela multiartista congolesa, atriz, dançarina, ativista em prol dos direitos humanos e promotora de oficinas de afrobeats e de cultura do Congo, Prudence Kalambay

Parte fundamental da experiência negra, a moda terá espaço no Quintal da Imagem, no Sesc Campo Limpo, com o desfile da coleção Acredite no seu Axé, da estilista Isa Silva, que apresenta um manifesto de identidade, resistência e beleza negra através de suas criações carregadas de brasilidade e ancestralidade negra.

Confira a programação completa no site: sescsp.org.br/culturasnegras

Devido a questões de saúde, Muniz Sodré não participará mais do bate-papo no dia 10/6, no Sesc Vila Mariana.

Esse conteúdo é fruto de uma parceria entre Mundo Negro e Sesc São Paulo

Primeiro prefeito negro de Tulsa anuncia fundo de US$ 105 milhões para descendentes do Massacre de 1921

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O prefeito de Tulsa Monroe Nichols - Foto AP

Em um gesto histórico, Monroe Nichols, o primeiro prefeito negro da cidade de Tulsa, anunciou neste domingo (1º) a criação de um fundo privado de US$ 105 milhões para tentar reparar os impactos duradouros do Massacre Racial de 1921. O plano inclui recursos voltados à moradia, bolsas de estudo, preservação cultural e apoio a pequenos negócios de descendentes das vítimas do ataque.

O anúncio aconteceu no Greenwood Cultural Center, no coração do distrito de Greenwood — área que, no início do século 20, era uma das comunidades negras mais ricas dos Estados Unidos. Conhecida como “Black Wall Street”, Greenwood foi destruída em 1921 por uma turba branca armada, em um dos maiores atos de violência racial da história americana. Estima-se que até 300 pessoas negras foram assassinadas, mais de 10 mil ficaram desabrigadas, e mais de mil residências e negócios foram incendiados.

Hoje, mais de 100 anos depois, ainda há sobreviventes vivos do massacre, como Viola Fletcher e Lessie Randle, ambas com mais de 110 anos, que seguem cobrando reparações e reconhecimento pelos danos sofridos.

“Eu estou aqui querendo justiça” disse Viola Fletcher. “Eu estou aqui pedindo para o meu país reconhecer o que acontece em Tulsa, em 1921”. Foto: Reprodução NPC.

O fundo, chamado Greenwood Trust, será dividido em três eixos: US$ 24 milhões para garantir acesso à moradia e propriedade a famílias descendentes; US$ 60 milhões para reabilitar estruturas históricas, revitalizar espaços urbanos e remover áreas degradadas; e US$ 21 milhões voltados a microcrédito, bolsas de estudo e aquisição de terrenos para empreendimentos liderados por pessoas negras.

O prefeito pretende captar todo o valor por meio de doações privadas até junho de 2026, com administração independente e conselho gestor próprio. “Vamos fazer esses investimentos para reconstruir o distrito de Greenwood e devolver a Tulsa a comunidade que deveríamos ter sido”, declarou Nichols durante a cerimônia, marcada também pela criação de um feriado municipal em memória às vítimas do massacre.

Embora o plano não ofereça compensações financeiras diretas aos sobreviventes, Damario Solomon-Simmons, advogado das vítimas e fundador da organização Justice for Greenwood, elogiou o anúncio. “Muitas das propostas refletem o que nossa comunidade vem exigindo há anos. Estamos prontos para transformar essas ideias em resultados concretos”, afirmou.

Além dos investimentos, Nichols anunciou a liberação de mais de 45 mil registros históricos e documentos públicos sobre o massacre, muitos deles inéditos. “É hora de tirar nossa história das sombras”, disse.

50 Cent quer impedir que Diddy receba perdão presidencial de Trump: “Não é aceitável”

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Fotos: Jamie McCarthy/ Getty Images; Paras Griffin/Getty Images; e Getty Images

50 Cent continua fazendo barulho nas redes sociais com tudo o que envolve o caso Diddy. O rapper e empresário deixou claro que pretende conversar diretamente com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para desencorajar qualquer possibilidade de perdão presidencial ao magnata Sean “Diddy” Combs.

Ele quer garantir que Trump não considere a hipótese de clemência para o colega da indústria musical, atualmente envolvido em uma série de acusações que incluem assédio, abuso sexual, violência doméstica e tráfico sexual.

“Ele disse que consideraria o perdão para qualquer pessoa injustiçada, não é o caso do Puffy Daddy”, rebateu em um post afiado nas redes sociais. Nos comentários, ainda declarou: “Ele [Diddy] já disse coisas muito ruins sobre o Trump, não é aceitável. Vou entrar em contato com ele [Trump] para que ele saiba o que penso a respeito desse cara”.

Em seguida, o rapper também publicou o print de uma matéria internacional sobre sua intenção de conversar com Trump, e na legenda escreveu: “Donald Trump não leva desrespeito para casa e não se esquece de quem opta por ir contra ele… Em meio aos seus trabalhos para tornar a América grande outra vez, não há espaço para distração”.

Durante um evento na Casa Branca, na última sexta-feira (30), Trump falou sobre a possibilidade de perdoar o rapper. “Primeiro, eu daria uma olhada no que está acontecendo”, afirmou. “Não tenho acompanhado com muita atenção. Ele gostava muito de mim, mas acho que quando me candidatei, esse relacionamento acabou.” E completou: “Bem, ninguém perguntou. Eu sei que as pessoas estão pensando nisso. Eu olharia os fatos”. Em 2015, Diddy elogiou o republicano durante uma entrevista. “Donald Trump é um amigo meu e ele trabalha pesado”.

Em meio a uma série de postagens sarcásticas e provocativas de 50 cent sobre o caso Diddy, a mais recente traz o print de um tabloide britânico afirmando que ele pretende “bombardear as chances de perdão” ao artista. Ele rebateu direto: “Não disse que vou bombardear nada, só falei que faço questão que o Trump saiba das coisas”.

Os advogados do magnata Diddy negam veementemente as acusações, alegando que todos os relacionamentos sexuais do artista foram consensuais. Ainda assim, ele segue detido em uma penitenciária federal em Nova York, depois que diversos pedidos de fiança foram rejeitados, e segue em julgamento.

Caso Miguel completa 5 anos e mãe ainda luta por justiça

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Foto: Reprodução

Hoje, 2 de junho, completa-se cinco anos da morte de Miguel Otávio Santana da Silva, 5, que caiu do 9º andar de um prédio de luxo no Recife (PE) após ser deixado sozinho em um elevador. O caso, ocorrido em 2020, teve grande repercussão nacional e ainda aguarda um desfecho judicial definitivo.

Para marcar a data e reforçar a cobrança por justiça, a mãe Mirtes Renata, junto a Articulação Negra de Pernambuco (Anepe), e outros coletivos e movimentos sociais, organiza um ato a partir das 15h, em frente ao Edifício Maurício de Nassau — conhecido como Torres Gêmeas — no bairro do Cais de Santa Rita, área central da capital pernambucana.

A manifestação deve seguir em caminhada até o Tribunal de Justiça de Pernambuco, no bairro de Santo Antônio. A mobilização busca manter viva a memória do menino e denunciar o que movimentos sociais apontam como um caso emblemático de negligência, racismo estrutural e desigualdade social.

Sari Corte Real e Sérgio Hacker, ex-patrões de Mirtes Renata. (Foto: Reprodução)

Nas redes sociais, Mirtes publicou um vídeo no domingo (1º), no qual relembra o dia da morte do filho e lamenta a lentidão da Justiça. Em desabafo, ela criticou a impunidade da ex-patroa Sari Corte Real, que deixou Miguel sozinho no elevador enquanto a mãe realizava tarefas domésticas. “Miguel não caiu. Miguel foi deixado cair”, afirmou.

“Quem cometeu esse crime, uma mulher branca, rica, que deveria ter a empatia de cuidar do meu filho, porque me obrigou a trabalhar, segue livre, estudando medicina, vivendo sua vida em paz, enquanto eu coleciono noites insones e passos firmes por justiça”, completou.

Sari Corte Real chegou a ser presa em flagrante por homicídio culposo — quando não há intenção de matar —, mas foi liberada no mesmo dia após pagar fiança de R$ 20 mil. Desde então, responde ao processo em liberdade. Ela é casada com Sérgio Hacker (PSB), ex-prefeito de Tamandaré, em Pernambuco.

A história de Miguel também foi levada à televisão no especial ‘Falas Negras’, exibido pela TV Globo. No episódio de 2020, a atriz Tatiana Tiburcio viveu o papel da Mirtes Renata em um monólogo que emocionou o público e reforçou a denúncia sobre o racismo estrutural no Brasil. A performance evidenciou a dor de uma mãe e a força de sua luta por responsabilização.

Povo negro: da invisibilidade ao protagonismo

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Foto: Claudio Gatti

Texto: Rachel Maia

Após a abolição da escravatura no Brasil em 13 de maio de 1888, nossos ancestrais enfrentaram inúmeros desafios, como a falta de políticas de inclusão, racismo estrutural e exclusão social. Ainda assim, ao longo do tempo, conquistaram importantes avanços em diversas áreas. E nós como frutos dessa resistência seguimos o legado dos que vieram antes de nós, ocupando com pertencimento cada lugar alcançado, abrindo portas e janelas para os que vêm depois.

Ser o primeiro — e muitas vezes o único — em espaços de tomada de decisão não é fácil. Os julgamentos, os olhares desconfiados, as cobranças sempre estiveram lá. Mas nós sabemos: nossa missão é maior. Por isso, seguimos plantando tamareiras, mesmo sabendo que talvez não sejamos nós a colher os frutos mais doces. Pois a certeza de que as gerações futuras encontrarão sombra e um caminho mais justo, proporcional às lutas e conquistas de séculos, nos impulsiona continuar. 

Tudo que alcançamos até aqui mostra, para além da nossa dor, que somos capazes e que seguiremos lutando. A educação e o acesso ao ensino superior são exemplos do resultado da luta do povo negro. Um grande feito é a política de cotas, implementada oficialmente em 2012, que possibilitou o aumento significativo da presença de pessoas negras nas universidades federais.

A produção e crescimento da intelectualidade negra nas mídias, com nomes como Lélia Gonzalez, Abdias do Nascimento, Sueli Carneiro e tantos outros, que contribuíram com reflexões essenciais sobre racismo, cultura e identidade, são um marco no século XXI. Potencializando o nosso saber e levando para a sociedade debates contundentes. 

Assim como a Lei n° 10.639/03, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas, valorizando a contribuição do povo negro à formação do país. O Estatuto da Igualdade Racial (2010), que assegura a igualdade de oportunidades e combate a discriminação racial, também impulsiona os avanços da sociedade brasileira. 

Sabemos que estamos longe do cenário ideal, mas, identificar, nos veículos de grande mídia, uma representatividade significativa da sociedade é a prova que nossas lutas não são em vão e de que a diversidade de pessoas, culturas e saberes contribui para uma sociedade mais justa. 

Estamos percebendo o fortalecimento das manifestações culturais negras — samba, capoeira, candomblé, maracatu e outras expressões afro-brasileiras — como patrimônio cultural. A representatividade na mídia promove um debate discriminatório e possibilita desmistificar estereótipos atribuídos às pessoas negras, assim como aos povos originários. 

O conhecimento amplo ofertado à sociedade em sua totalidade permitirá que todos os indivíduos tenham seus direitos garantidos. E, assim sendo, a sociedade brasileira terá acesso a uma diversidade cultural ampla, que conduzirá o país de maneira orgânica e crescente a uma economia equilibrada.

O aumento da presença de pessoas negras em cargos políticos, nas mídias, na educação, em cargos executivos e na publicidade faz parte de uma luta histórica e necessária para que mais de 50% da população brasileira saia da invisibilidade. O pódio pode até ser o lugar de poucos, mas é certo que todos têm o direito de concorrer a ele. Estamos ainda mais próximos de chegar lá, mas sabemos que ainda há muito a fazer. 

Juiz Edinaldo César Santos Júnior, referência na luta por direitos humanos e equidade racial, morre aos 45 anos

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Foto: Reprodução/Instagram

O juiz Edinaldo César Santos Júnior, conhecido por sua atuação em direitos humanos, defesa da infância e juventude e combate ao racismo institucional no Judiciário, foi encontrado morto neste domingo (1º), aos 45 anos. A causa da morte não foi divulgada.

Natural de Aracaju (SE), Edinaldo era juiz de Direito no Tribunal de Justiça de Sergipe (TJ-SE) e atuava como juiz auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ocupava posições estratégicas no sistema de Justiça e se destacava por seu trabalho técnico e político em prol de uma Justiça mais inclusiva.

Doutorando em Direitos Humanos pela Universidade de São Paulo (USP), era mestre na mesma área pela Universidade Tiradentes. Ao longo da carreira, teve papel central na formulação de políticas públicas voltadas à proteção de crianças e adolescentes, tanto no TJ-SE quanto no CNJ.

No CNJ, também esteve à frente de iniciativas para promoção da equidade racial. Foi um dos idealizadores do Encontro Nacional de Juízes e Juízas Negros (Enajun), que discute anualmente o enfrentamento ao racismo institucional no sistema judiciário brasileiro.

A morte do Dr. Edinaldo tem sido lamentada por muitas figuras políticas e do movimento negro. Entre elas, Macaé Evaristo, ministra dos Direitos Humanos, fez uma publicação nas redes sociais, se despedindo do juiz. No mês passado, ambos estiveram na 99ª Sessão do Comitê dos Direitos da Criança da ONU na Suíça.

“Estivemos juntos na missão para Genebra, representando o Brasil. Me encantei com seu jeito doce e alegre, com sua inteligência e com seu comprometimento com a defesa dos direitos da criança e do adolescente.”, escreveu a ministra, ao recordar da 99ª Sessão do Comitê dos Direitos da Criança da ONU em Genebra, “Minha solidariedade à família e aos amigos. O Brasil perde hoje um grande defensor dos direitos humanos.”, finalizou o texto.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também lamentou a morte: “Deixa um legado inestimável para o Direito e para a promoção da justiça racial no Brasil. Sua trajetória é exemplo para toda a magistratura.”

Além da atuação institucional, Edinaldo era autor e organizador de obras jurídicas, professor universitário e colaborador na formação de novos profissionais do Direito. Colegas de diferentes regiões destacaram sua generosidade, firmeza ética e o compromisso com os direitos fundamentais.

Equidade de Educação para as relações étnico-raciais, uma reparação histórica

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Foto: Reprodução/Biblioteca Nacional

Em conversa animada com o saudoso Professor Eduardo de Oliveira, autor do Hino à Negritude, ele comentou que em dada ocasião, lá pelos idos da década de 1950, estava em campanha para ser candidato a vereador no Município de São Paulo. Então teve a brilhante ideia de fazer a rifa de um liquidificador, utensilio doméstico muito disputado na época. Em um baile da moçada, ele apresentou a seguinte ideia: cada pessoa que apresentasse o seu título de eleitor ganharia um número para concorrer ao liquidificador. Foi um alvoroço no baile. Porém, qual foi a grande surpresa? No baile, que deveria ter cerca de mil pessoas, quase ninguém tinha o título de eleitor. A maioria dos presentes era analfabeta e não tinha o direito de votar.

O direito ao voto dos analfabetos só foi conquistado em 1985. Há pouco mais 40 anos! Pouca gente sabe, mas durante o período de escravização, as pessoas negras foram proibidas de frequentar a escola. A Lei nº 1 de 14 de janeiro de 1837 soma-se a outras leis e portarias de províncias e de instituições de ensino, que deixaram demarcado de forma explícita o impedimento de pessoas negras de estudarem. As poucas escolas públicas criadas no início do século XIX foram proibidas aos homens negros e mulheres negras.

Lei n. 1, de 1837, e o Decreto nº 15, de 1839, sobre Instrução Primária no Rio de Janeiro, o Artigo 3º da lei de 1837 dizia: “São prohibidos de frequentar as Escolas Publicas: 1º Todas as pessoas que padecerem de moléstias contagiosas. 2º Os escravos, e pretos ainda que sejão livres, ou libertos” [sic]. Ao longo do século XIX, o esforço de ensinar a ler e escrever coube às Irmandades de cor, aos Clubes Sociais Negros e às Organizações Negras, que criaram a imprensa negra e as iniciativas de professores negros como professor Pretextato, em 1856, no Rio de Janeiro e Antônio Cesarino, em 1860, na cidade de Campinas no estado de São Paulo . O Estado brasileiro se omitiu e proibiu que os negros pudessem frequentar escolas.

Os efeitos desta tragédia humana impactaram no acesso à educação e criaram obstáculos à participação política de homens e mulheres negras. A aprovação da Emenda Constitucional nº 25 de 1985 iniciou mudanças a esse cenário e, em seguida, a Constituição Federal de 1988 ampliou o direito ao voto de pessoas analfabetas. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu um arcabouço reconhecendo a importância da educação para pessoas negras, em especial os Artigos 4º,5º, 205º,206º,208º,211º,212º, 212ºA, 213º e 214º. O resultado desses marcos institucionais, fruto da luta do movimento negro, é que hoje podemos formular políticas públicas de equidade para enfrentar as múltiplas desigualdades que ainda persistem em nosso sistema educacional.

O Ministério da Educação, no dia 14 de maio de 2024, lançou a Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola (PNEERQ) coordenada pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi). O objetivo é fortalecer ações e programas educacionais sobre relações étnico-raciais e a educação escolar quilombola, com impacto em 5.570 municípios das 27 unidades federativas. Uma verdadeira revolução, como nunca foi realizado na história da educação brasileira. É a continuidade de um processo de reparação histórica, realizada pela luta do movimento negro ao longo do século XX e XXI contra a omissão e o racismo do Estado brasileiro.

Neste primeiro ano, houve adesão recorde à PNEERQ: de 97,3% das secretarias municipais e 100% das secretarias estaduais. Nos estados de Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará e Rio de Janeiro, houve a adesão de 100% dos municípios, reforçando o compromisso nacional com a implementação da política. Sua capilaridade é assegurada por uma rede nacional de governança, composta por mais de 1.500 agentes de articulação e formação distribuídos em todo o território nacional. Até 2027, a PNEERQ investirá R$ 1,5 bilhão em ações afirmativas para educação básica brasileira.

Para a secretária da Secadi, Zara Figueiredo, a PNEERQ, que completou um ano, é tida como a política mais estratégica do MEC para promover equidade racial na educação básica. “É a primeira vez que introduzimos um princípio de ação afirmativa na educação básica. Ela nasce da certeza de que existe uma dívida histórica com a população negra e quilombola, mas, também, do reconhecimento de todos os que vieram antes de nós e pavimentaram este caminho. Equidade racial e educação para as relações étnico-raciais dizem respeito à garantia do direito à educação, com um padrão de qualidade para essas populações”, ressalta.

Conhecendo o professor Eduardo de Oliveira, acredito que ele daria uma gargalhada bem gostosa de alegria com os resultados e o impacto do PNEERQ na vida de nossa gente, ele, que foi sempre otimista em relação à força do movimento negro no enfrentamento do racismo. Depois, eu o veria com o semblante sério, e com a voz animada nos convidaria a entoar os versos do Hino à Negritude:

“De um passado de heróico labor
Todos numa só voz
Bradam nossos avós
Viver é lutar com destemor
Para frente marchemos impávidos
Que a vitória nos há de sorrir
Cidadãs, cidadãos
Somos todos irmãos
Conquistando o melhor por vir
Ergue a tocha no alto da glória
Quem, herói, nos combates, se fez
Pois que as páginas da História
São galardões aos negros de altivez”

Em 28 de maio de 2014 foi promulgada a lei nº 12981 que dispõe do hino à Negritude de autoria do Professor Eduardo de Oliveira (1926-2012).

Origem do termo “comida afetiva” e “cozinha afetiva”

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Fotos: Arquivo pessoal/Junia Mamedir

Texto: Junia Mamedir

O termo comida afetiva — ou cozinha afetiva ganhou notoriedade nas últimas décadas para descrever alimentos que evocam lembranças, emoções e vínculos familiares. Originalmente inspirado no conceito inglês “comfort food”, que remete à comida que “conforta” emocionalmente, o termo foi sendo apropriado em diferentes contextos culturais. No Brasil, ele ganhou uma profundidade maior ao se conectar com histórias de resistência, memória e pertencimento — especialmente das populações negras e periféricas.

Enquanto no uso popular a comida afetiva é muitas vezes associada à “comida da avó” ou aos pratos tradicionais da infância, sua raiz mais profunda está nas práticas alimentares que surgiram em ambientes onde o afeto era, mais do que nunca, um ato de resistência. É o caso dos quilombos, das cozinhas de senzala, das casas de axé e dos terreiros, onde a comida se tornou instrumento de cuidado coletivo, ancestralidade e sobrevivência.

Quilombos e casas: o berço da verdadeira cozinha afetiva

Durante a escravidão, pessoas negras escravizadas encontraram formas de ressignificar o pouco que lhes era oferecido. Com criatividade, sabedoria ancestral e profundo senso de comunidade, elas transformaram ingredientes “descartados” em alimentos ricos, saborosos e simbólicos. Esses espaços, muitas vezes invisibilizados pela historiografia tradicional, são os verdadeiros núcleos da cozinha afetiva brasileira.

As casas negras — casas de mães e tias de santo, cozinhas de quilombos, lares de famílias negras rurais e urbanas — foram os primeiros territórios de afeto onde o alimento não era apenas nutrição, mas também acolhimento, espiritualidade e memória coletiva. A feijoada, o angu, o acarajé, o vatapá, o caruru, a farofa — pratos hoje amplamente consumidos — têm origens que misturam escassez, invenção e conexão espiritual.

A comida nesses espaços servia para curar feridas, celebrar vidas, acalmar tristezas e manter vivas as tradições de um povo que teve sua liberdade arrancada, mas jamais deixou de resistir através do afeto e da oralidade.

O risco da apropriação e do esvaziamento de sentido

Nas últimas décadas, o termo “cozinha afetiva” foi amplamente apropriado pelo marketing gastronômico, muitas vezes desvinculado de qualquer comprometimento com a sua origem histórica e cultural. Hoje, é comum ver restaurantes de alto padrão se referirem à comida afetiva como um “conceito de marca”, com pratos requintados, ambientes gourmetizados e preços inacessíveis para as mesmas pessoas que criaram e preservaram essa cultura.

Essa tendência esvazia o sentido profundo da comida afetiva, reduzindo-a a uma estética ou narrativa superficial. Quando um negócio usa o termo “afeto” apenas como estratégia de venda, sem compromisso com a memória coletiva, a inclusão de pessoas negras ou a valorização das raízes culturais do prato, ele contribui para a exclusão da própria história que a cozinha afetiva representa.

É essencial reconhecer que afeto não é apenas uma decoração na mesa ou um storytelling bonito para redes sociais. Afeto, nesse contexto, é memória viva, é resistência preta, é cuidado ancestral — e isso não pode ser comercializado sem consciência ética.

Caminhos possíveis

Para que o uso da expressão “cozinha afetiva” em empreendimentos gastronômicos seja legítimo e responsável, é fundamental que ele venha acompanhado de:

  • Reconhecimento histórico: Saber e declarar de onde vêm as receitas e tradições.
  • Representatividade: Incluir pessoas negras nos processos de criação, gestão e valorização cultural da cozinha.
  • Acesso: Garantir que a comida continue sendo um meio de afeto real, e não apenas um produto de luxo.
  • Respeito: Não romantizar a escassez ou invisibilizar o sofrimento que também compõe essa história.

Conclusão

A comida afetiva não é um modismo. É uma expressão de identidade, memória e resistência, especialmente para o povo negro brasileiro. Ao esvaziar esse termo em nome do lucro, o mercado gastronômico corre o risco de repetir a lógica colonial: explorar saberes, apagar histórias e excluir sujeitos.

Valorizar a cozinha afetiva é, antes de tudo, valorizar as pessoas que a criaram com suas dores, amores e memórias — e isso exige respeito, reparação e verdade.

Nova geração da moda africana contemporânea ocupa a Galeries Lafayette, em Paris

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Com sua vocação para inspirar através da moda e da cultura, a Galeries Lafayette Paris Haussmann, uma das lojas mais tradicionais de departamentos da Europa, inaugura uma nova temporada sob o olhar potente da estética africana. Entre os dias 18 de junho e 8 de julho, o espaço recebe a pop-up store “Africa Now”, um mergulho vibrante e criativo do continente africano. A iniciativa, realizada em parceria com a Canex (Creative Africa Nexus), Adama Paris e o projeto Africa Fashion Up + Studio Ka, reafirma o compromisso da maison em valorizar narrativas plurais e identidades que moldam a moda global.

A ação chega meses após o sucesso da exposição Wax, que transformou os corredores da Lafayette em uma ode visual ao emblemático tecido africano, e marca mais um capítulo de conexão com as expressões artísticas vindas da África.

Com curadoria primorosa, a “Africa Now” apresenta criações de nomes emergentes e potentes da moda contemporânea. A Canex leva ao público os trabalhos das marcas Late For Work, Boyedoe, Wuman e We Are NBO. Já Adama Paris, estilista e empreendedora visionária, exibe suas próprias peças ao lado das assinaturas de Nene Yaya, Ibrahim Fernandez e Sisters Of Afrika. Por fim, a colaboração entre Africa Fashion Up e o sofisticado Studio Ka aposta em talentos como Banke Kuku e Algueye, além das marcas Bandama e Collé Sow Ardo.

Africa Now_We are NBO

“É uma satisfação receber esta nova geração de criadores moda contemporânea do continente africano. Iniciativas como essa demonstram que a Galerias Lafayette segue firme no propósito de revelar ao público toda a magia e energia desse processo criativo”, afirma Alix Morabito, diretora de Compras e Projetos Especiais de Moda Feminina da Galeries Lafayette.

Os parceiros por trás da iniciativa:

Canex (Creative Africa Nexus)
Idealizado pelo Afreximbank, o programa nasceu para impulsionar as indústrias criativas africanas, conectando talentos e marcas a oportunidades globais. Há seis temporadas, a CANEX ocupa um lugar de destaque nos desfiles da Tranoï, plataforma oficial da Semana de Moda de Paris, abrindo portas para que designers africanos brilhem no epicentro da moda internacional.

Adama Paris
Nascida em Kinshasa e com atuação internacional, Adama Amanda Ndiaye é uma das vozes mais ativas da moda africana. Fundadora da Semana de Moda de Dakar e da Black Fashion Xperience (realizada em cidades como Paris, Praga e Salvador), a estilista também lançou o Fashion Africa Channel, o primeiro canal africano totalmente dedicado à moda. Além do trabalho criativo, Adama é reconhecida por sua luta pelo empreendedorismo feminino no Senegal e em toda a diáspora.

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Africa Fashion Up x Studio Ka
Primeira grande vitrine da moda africana contemporânea em Paris, o Africa Fashion Up aposta na força transformadora da juventude criadora do continente. Com apoio de nomes como Balenciaga, HEC Paris e da própria Galeries Lafayette, o programa oferece mentoria, formação de excelência e acesso a redes estratégicas do setor. Em 2024, o Studio Ka, destaque do programa, organizou sob o domo da Lafayette a primeira venda de designers africanos, levando suas criações à Paris Fashion Week e às vitrines mais influentes da moda global.

Negra Li comemora 30 anos de carreira com o novo álbum “O Silêncio Que Grita”

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Foto: Bruno Sabongi

Uma das vozes mais marcantes do rap nacional, Negra Li celebra três décadas de trajetória com um novo trabalho que ecoa como manifesto e cura. Sete anos após seu último disco, a cantora, compositora e atriz lança “O Silêncio Que Grita”, um álbum visceral que une lirismo, identidade e resistência. O projeto estreou nas plataformas digitais na última quinta-feira (29).

Com 11 faixas, o trabalho mergulha em temas urgentes como feminismo, raça, política e autoestima, costurados por beats poderosos e melodias que atravessam o tempo. É um encontro entre o clássico e o contemporâneo — do rap raiz às sonoridades africanas — que conecta ancestralidade e futuro numa mesma frequência.

Entre os convidados que somam potência ao projeto estão Liniker, Gloria Groove e Djonga, nomes que também simbolizam a força da arte como ferramenta de transformação. O álbum propõe uma viagem sonora que celebra a pluralidade da música preta, com passagens por gêneros como reggae, afrobeat, samba, boombap, R&B, blues e gospel. As participações criam camadas que vão do grito à sutileza, oferecendo ao ouvinte atmosferas que tocam corpo e alma.

Cada faixa é tratada como um capítulo íntimo, onde a estética moderna do som se entrelaça com raízes culturais profundas. Um dos pontos altos do disco é a nova versão de “Olha o Menino”, clássico lançado por Negra Li em 2005 em parceria com Helião. Agora, ela divide os versos com Djonga, trazendo uma releitura intensa e atual da canção.

O clipe da música foi gravado na Brasilândia, na zona norte de São Paulo, onde a artista cresceu e reforça esse elo com as origens. Rodado inteiramente em preto e branco, o vídeo acompanha a trajetória de um jovem negro diante das encruzilhadas da vida urbana. A crítica social é clara, mas o desfecho emociona: há luz, há caminho, há renascimento.

“O Silêncio Que Grita” é mais do que um álbum: é um gesto artístico de quem aprendeu a transformar dor em beleza, opressão em força, silêncio em voz.

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