Abdias Nascimento e Rio de Janeiro após megaoperação em 28 de outubro de 2025. (Fotos: Senado Federal e Raull Santiago)
Hoje, 29 de outubro, é comemorado o Dia Nacional do Livro. A data refere-se à fundação da Biblioteca Nacional do Brasil em 1810, no Rio de Janeiro. E, em diálogo com a celebração, não podemos perder de vista as famílias que choram as dezenas de mortes ocorridas ontem na operação militar no Complexo do Alemão e na Penha. Nesse contexto, indicamos dois livros importantes para quem pretende compreender a situação das pessoas negras nesta sociedade. Estas são a maioria das vítimas da recente tragédia.
O primeiro livro é o Quarto de Despejo: Diário de uma favelada. Escrito por Carolina de Jesus, mulher negra, e publicado em 1960, o material é considerado uma obra-prima. Nesse diário, Carolina de Jesus conta o cotidiano da favela do Canindé. Com uma linguagem simples, mas carregada de enorme profundidade e sensibilidade, ela aborda temas como a fome, habitação, racismo e política, violência doméstica, educação infantil, maternidade, capitalismo, alcoolismo, etc.
Outro livro que recomendamos é O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um Racismo Mascarado, lançado em 1978. Esse livro foi escrito por um dos mais importantes nomes do Movimento Negro, Abdias do Nascimento. Ele faz críticas contundentes e indiscutíveis sobre o mito da democracia racial, que consolidou o racismo na sociedade brasileira. Discute a escravidão desconstruindo a ideia do “senhor benevolente”, o genocídio, a religião, o embranquecimento cultural, a exploração sexual da mulher africana, e fala sobre o Teatro Experimental do Negro (TEN) como reação ao racismo.
Precisamos ter em mente que a resistência ao racismo depende de uma educação teorizada pelos intelectuais negros, algo que a escola tradicional não nos ofertará. É por meio do conhecimento da realidade contemporânea e histórica que mobilizaremos instrumentos práticos para a sobrevivência coletiva do povo negro. Incentivar a leitura na comunidade é um ato antirracista. Lutemos para que o quarto de despejo não continue sendo um campo de extermínio.
Silvio Almeida publicou em suas redes na noite de ontem (28), um vídeo onde afirma que: “O mercado financeiro quer o dinheiro do crime sem se sujar.” A fala ressoa com plena urgência diante do massacre ocorrido nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, onde mais de 120 pessoas foram mortas, incluindo ao menos 72 corpos encontrados por moradores em áreas de mata e levados à Praça São Lucas. Enquanto o governo do estado classificou a ação como “sucesso”, os relatos das comunidades mostram o oposto: uma operação de extermínio conduzida sob a narrativa da segurança pública.
Ao afirmar que “o mercado financeiro quer o dinheiro do crime”, Almeida desloca o foco do discurso policial tradicional para a infraestrutura oculta: não é apenas “o bandido” quem está em cena, mas os circuitos que transformam violência em lucro e invisibilidade. Ele aponta para os mecanismos de infiltração de capitais ilícitos em empresas, bancos e fintechs, uma síntese entre economia legal e ilegal que sustenta o funcionamento da máquina.
Quando acrescenta “sem sujar suas mãos”, o ministro evidencia o arranjo maquiado: os agentes formais não precisam empunhar armas, basta oferecer canais. O sistema se retroalimenta, de um lado, o Estado usa força letal sobre territórios periféricos; do outro, o capital formal lucra com a circulação dos mesmos recursos que nascem da violência. Nesse processo, corpos negros e periféricos tornam-se o principal combustível de uma engrenagem que decide quem vive e quem morre.
O massacre no Rio mostra essa articulação em tempo real. O Estado mobiliza tanques e helicópteros; o governador Cláudio Castro celebra resultados; e a sociedade assiste, mais uma vez, à gestão da morte como política. As comunidades golpeadas são as mesmas que geram o crime e, por extensão, alimentam os lucros que Almeida denuncia.
Esse é o ponto essencial: não se trata de erro operacional nem de falha isolada, mas de um modelo de poder que usa a violência seletiva como ferramenta política e econômica. Silvio Almeida não apenas protesta; ele decodifica o funcionamento da necropolítica brasileira, uma engrenagem onde genocídio periférico e economia formal se entrelaçam.
Interromper esse ciclo exige uma agenda mínima e concreta: rastreamento de beneficiários finais de lavagem de dinheiro, plano nacional de prevenção de homicídios que vá além da repressão, e uma reforma profunda das práticas estatais de segurança, voltada à proteção das comunidades, não à sua patrulha.
A construção social da educação inclusiva não depende apenas de boas ideias ou intenções nobres — exige políticas públicas e o compromisso de todos os envolvidos no processo educativo: professores, gestores, famílias e profissionais de apoio.
A formação docente inclusiva é o elo entre o ideal das políticas públicas e a valorização da sala de aula. É o professor, no cotidiano escolar, quem transforma princípios legais em experiências concretas de aprendizagem e pertencimento. No entanto, sem o suporte adequado das instituições e do poder público, essa missão se torna sobrecarregada — e, muitas vezes, inviável.
No caso dos estudantes com deficiência e neurodivergentes, esse compromisso se amplia, envolvendo também especialistas como intérpretes, cuidadores, psicopedagogos, terapeutas e fisioterapeutas que, em parceria com a escola, podem garantir condições reais de aprendizagem e participação.
A professora Sandra Aparecida Atayde, doutora em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), com residência em Ortopedia pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP), é também fisioterapeuta docente do curso de Fisioterapia da Universidade Paulista (UNIP) desde 2001 — e contribui com essa pauta tão necessária: a inclusão de alunos com deficiência.
“Como professora e fisioterapeuta, tenho vivenciado de perto os desafios da inclusão escolar, que exige sensibilidade, empatia e conhecimento técnico — aspectos que só se fortalecem com investimento e valorização da formação docente”, afirma Sandra.
Professores, alunos e, consequentemente, seus pais enfrentam desafios em suas múltiplas dimensões — étnica, racial, cultural e socioeconômica. Vale destacar que o capacitismo é agravado quando o aluno também se depara com o racismo, como mostra a matéria no Jornal da USP sobre a pesquisa de mestrado realizada por Georgton Anderson da Silva, na Faculdade de Educação (FE) da USP, que apresenta a trajetória escolar de pessoas negras com deficiência.
A pesquisa aponta que alunos negros com deficiência têm maior chance de evasão escolar — apenas 23,8% dos que têm 25 anos ou mais concluem o ensino básico. A falta de acessibilidade em escolas públicas e a abordagem pedagógica e didática são fatores determinantes. Isso evidencia que o que cada criança ou adolescente precisa para aprender e pertencer deve ser analisado com mais empatia, pois a singularidade é o primeiro passo para uma educação verdadeiramente inclusiva e transformadora.
Inclusão não é favor, é direito
Apesar de ser um direito garantido, as políticas públicas de inclusão ainda são falhas. Falta estrutura, acompanhamento e continuidade para que sejam, de fato, funcionais. É a instituição escolar que traduz o que as políticas públicas determinam em lei — e, muitas vezes, é também onde se revelam as lacunas entre a norma e a realidade.
“A inclusão não se limita a oferecer uma vaga e colocar o aluno na sala de aula; trata-se de garantir condições reais de ensino e aprendizagem, respeitando o ritmo e as necessidades de cada indivíduo. Só assim teremos uma inclusão verdadeira e transformadora”, diz a especialista.
Nas salas de aula, a diversidade se manifesta de múltiplas formas: estudantes com deficiência — física, sensorial, intelectual ou com Transtorno do Espectro Autista (TEA) — demandam práticas pedagógicas diferenciadas, professores preparados e recursos de acessibilidade que garantam uma aprendizagem efetiva e equitativa.
“Em fevereiro deste ano, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) realizou uma audiência pública sobre a inclusão de pessoas com deficiência na educação. Nessa ocasião, muitos desses aspectos foram discutidos com o objetivo de tornar os direitos dessa população mais plenos e viáveis. Estamos no caminho, mas a trajetória ainda é longa — e olhar com atenção para o processo já representa um grande passo”, ressalta a professora.
Educação inclusiva é possível e urgente
Políticas como a Lei Brasileira de Inclusão (Lei n.º 13.146/2015) e a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008) representam avanços importantes, mas sua efetividade depende diretamente da formação e valorização dos professores, do investimento e da infraestrutura acessível que dialogue com as necessidades dos alunos e com as demandas efetivas da escola.
“A inclusão só se torna efetiva quando há uma parceria real entre escola, família e profissionais especializados. O planejamento conjunto e o acompanhamento multidisciplinar são fundamentais para o desenvolvimento dos alunos”, pontua Atayde.
A formação continuada é frequentemente apontada como imprescindível para que o professor responda, de forma qualificada, às necessidades emergentes que correspondem ao guarda-chuva da diversidade. Porém, segundo dados do Censo Escolar da Educação Básica 2023, divulgado pelo Inep, apenas 41,3% dos professores participaram de alguma ação formativa voltada à inclusão.
“Na minha atuação como fisioterapeuta, observo o quanto o estímulo motor, cognitivo e sensorial pode potencializar o aprendizado — desde que haja integração entre saúde e educação”, destaca a doutora.
Em um país em que a inclusão ainda é um desafio cotidiano, investir na formação docente é o caminho mais sólido para transformar a matrícula em pertencimento. A escola deve ser um espaço onde todas as crianças — com ou sem deficiência, de diferentes origens, culturas e realidades — sejam reconhecidas, respeitadas e valorizadas em suas singularidades rumo ao aprendizado.
Promover uma educação verdadeiramente inclusiva e humanizada significa garantir que cada estudante encontre condições reais para aprender, conviver e se desenvolver plenamente.
Anielle Franco e Marina Laís Duarte (Foto: Reprodução/Instagram)
Com a possível saída antecipada de Anielle Francodo Ministério da Igualdade Racial (MIR) para disputar as eleições de 2026, o nome da baiana Marina Laís Duarte começa a ganhar força entre lideranças do movimento negro e organizações da sociedade civil como uma das principais apostas para comandar a pasta.
Vice-presidenta do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR) e presidenta da UnegroBahia, Marina tem uma trajetória marcada pela militância de base, pela defesa da participação popular e pela articulação de políticas públicas voltadas à igualdade racial.
Reconhecida pela capacidade de diálogo entre governo e sociedade civil, ela foi uma das principais articuladoras da 5ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CONAPIR), que consolidou a convergência entre entidades do movimento negro e os estados nas etapas preparatórias.
Com trânsito respeitado no Parlamento e no governo federal, Marina é considerada uma referência na luta pela reparação histórica, transversalidade das políticas de igualdade racial e combate ao racismo institucional. Sua atuação tem contribuído para ampliar o controle social e o alcance das políticas públicas voltadas à população negra, aos povos tradicionais e à juventude periférica.
Entre os movimentos e entidades que manifestam apoio ao nome de Marina estão o Coletivo de Entidades Negras, Convergência Negra, Movimento Negro Unificado (MNU), Enegrecer, Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN), Rede Amazônia Negra, Centro de Estudos e Defesa dos Negros do Pará (Cedenpa), Malungu, Agentes de Pastoral Negros do Brasil (APNs), União de Negras e Negros pela Igualdade (Unegro), Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana e o Alma Preta Jornalismo.
A influenciadora Aline Bardy Dutra, conhecida como Esquerdogata, perdeu milhares de seguidores após ser detida no último sábado (27) em Ribeirão Preto (SP) por desacato, resistência e injúria racial contra policiais militares. A prisão ocorreu durante uma abordagem policial a um suspeito na Rua Florêncio de Abreu, quando Aline filmava os agentes sem autorização e questionava a atuação deles. Antes do episódio, ela tinha 873 mil seguidores; desde então, perdeu seguidores, ficando com 821 mil, o que levou à decisão de fechar os comentários das postagens mais recentes.
Os vídeos que viralizaram mostram Aline direcionando palavras racistas a um dos policiais: “Um preto fudendo outro preto, você é sem consciência de classe e prende outros da sua cor”. Ela também chamou os agentes de “fascistinhas” e “nazistinhas”, em críticas que desdenham do poder econômico e da origem deles.
Em outro momento, a influenciadora afirmou, em tom de provocação: “Vocês acham que vocês têm cacife para me mandar para algum lugar? Olha para mim e olha para vocês. Minha sandália vale o carro de vocês. Faz até a nona série, presta para a Polícia Federal, ganha R$ 2,5 mil de salário e tem a síndrome do pequeno poder. Já foi para Londres, power, Tower Bridge? Nunca, né, você não tem dinheiro para isso”.
Segundo o boletim de ocorrência, Aline foi algemada pelos policiais após xingamentos e resistência. O celular da influenciadora foi apreendido, e a Polícia Civil solicitou a quebra de sigilo do aparelho à Justiça para apuração das falas consideradas racistas. Durante a audiência de custódia, ela obteve liberdade provisória, com recolhimento domiciliar noturno das 20h às 6h e comprovação periódica de adesão a tratamento psicológico.
A defesa de Aline afirmou que ela estava sob efeito de álcool e medicamentos controlados, e que não se recorda do episódio. O advogado Roberto Bertholdo destacou que a prisão fez com que Aline “entendesse que precisa se tratar do alcoolismo” e ressaltou que o surto foi resultado da combinação de álcool, remédios controlados e medo da atuação policial. Em nota, a equipe jurídica declarou que ela ficou “devastada” ao ver os vídeos e que seu comportamento não representa a trajetória de luta por igualdade e respeito construída ao longo dos anos, além de confirmar que Aline pretende se desculpar pessoalmente com os policiais envolvidos.
A Polícia Civil abriu investigação sobre as ofensas raciais e a conduta da influenciadora, que segue respondendo em liberdade provisória, com medidas cautelares definidas pela Justiça.
Aaron Pierre estampa a capa da Men’s Healthe, em entrevista à revista, falou sobre seu personagem John Stewart em Lanterns: “Para mim, o personagem simplesmente irradia força e coragem.” Sobre os heróis do Corpo dos Lanternas Verdes, ele acrescenta: “Eles são celebrados como heróis, mas o que mais amo é que abraçam suas falhas de um jeito bonito, isso os torna reais.”
O ator britânico, nascido e criado em West Croydon, Londres, construiu sua carreira a partir de desafios pessoais e disciplina. Ainda adolescente, trabalhou como concierge em um salão de beleza, aprendendo desde cedo a importância de se esforçar e valorizar seus sentimentos, influência das mulheres de sua família: “Elas me ensinaram a força de sentir o que você sentia, sentir visivelmente e assumir isso o suficiente para falar sobre isso.”
Pierre descobriu a atuação pouco depois e investiu na formação profissional, estudando em Toronto e na Academia de Música e Arte Dramática de Londres. Construiu experiência no teatro e na televisão britânica, destacando-se em produções como Otelo no Shakespeare’s Globe, papel que chamou a atenção do diretor Barry Jenkins, responsável pela série The Underground Railroad.
Em sua trajetória, o ator enfrentou dificuldades financeiras e desafios emocionais, refletindo: “Aprender que você não precisa carregar tudo nas costas, aprendi isso mais tarde do que a maioria. Que, na verdade, o que é fundamentalmente humano é que compartilhamos o fardo.”
Desde então, Pierre participou de filmes e séries de grande visibilidade, incluindo Brother, Rebel Ridge, Old de M. Night Shyamalan e a peça King Hedley II. Ele também foi escalado para projetos como Blade, do MCU, e a prequela de O Rei Leão, interpretando Mufasa.
Em Lanterns, Pierre interpreta John Stewart, refletindo sobre a responsabilidade de representar um personagem icônico: “Essa fome de ser a melhor versão de si mesmo, que também te responsabiliza quando você não é.”
Além do trabalho na atuação, Pierre valoriza a vida pessoal e a paternidade, mantendo seu filho protegido do olhar público. O ator também investe em treinamentos físicos intensivos, incluindo boxe e jiu-jitsu, que considera essenciais para seu desempenho profissional e equilíbrio pessoal.
A trajetória de Aaron Pierre evidencia talento, resiliência e compromisso. Ele se consolida como um ator capaz de unir grandes papéis de ação a personagens com profundidade e humanidade, expandindo seu impacto na indústria e na representação de heróis negros.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, deve deixar o governo Lula até dezembro para se dedicar à campanha eleitoral de 2026. A informação, divulgada inicialmente pela coluna de Paulo Cappelli do Metrópoles e confirmada por fontes ouvidas pelo Mundo Negro, indica que a ministra pretende disputar uma vaga de deputada federal pelo Rio de Janeiro.
Segundo aliados próximos, a decisão de antecipar a saída tem relação direta com a necessidade de construir sua base política no estado, uma vez que Anielle nunca foi testada nas urnas. Apesar do apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que considera essencial garantir representatividade no Rio, o cenário é visto como adverso.
A movimentação também ocorre em meio a críticas à gestão do Ministério da Igualdade Racial (MIR). A percepção interna é de que “O MIR não está agregando votos, não está conseguindo entregar produtos reconhecidos para a população negra brasileira. Não há um só símbolo, lembrança de ação do governo que se ligue a atuação do MIR”, aponta a fonte.
A recente Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, organizada pelo MIR, reforçou o clima de insatisfação. O evento recebeu críticas por problemas de organização, falhas logísticas e falta de acolhimento aos participantes, o que deixou “uma impressão muito ruim” entre representantes de movimentos sociais e ativistas negros.
Outro ponto sensível são as acusações de assédio contra o ex-Ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida. “A história não está resolvida. Paira uma sombra de dúvidas e problemas. Um debate que ninguém do governo quer ressuscitar ou fazer no ano das eleições”, afirma.
Anielle Franco está à frente do ministério desde janeiro de 2023 e ainda não há definição sobre quem deve assumir o cargo após sua saída.
O Mundo Negro entrou em contato com a assessoria de imprensa do Ministério da Igualdade Racial, mas não teve retorno até o fechamento da reportagem.
A artista afro-americana Nailah Elon viralizou recentemente ao reconstruir imagens históricas racistas em suas redes sociais, provocando ampla repercussão e debates. Muitos se perguntaram: por que a melancia aparece com tanta frequência nessas representações?
Em resposta ao Mundo Negro, Nailah explica: “Nos Estados Unidos, as melancias se tornaram um símbolo racista depois do fim da escravidão. Pessoas negras libertas passaram a cultivar e vender melancias como um sinal de independência e sucesso. Mas os brancos do sul, irritados com o progresso delas, começaram a usar essa imagem para zombar e desumanizá-las, transformando o que era um símbolo de liberdade em um símbolo de racismo.”
O que era originalmente símbolo de liberdade e autonomia foi transformado em estereótipo através de caricaturas, propagandas e cartões postais, reforçando a ideia de que negros tinham uma relação “excessiva” com a fruta. Este processo de desumanização cultural perdura até os dias de hoje e é um exemplo claro de como símbolos positivos podem ser deturpados por preconceito.
Mas a melancia não é o único alimento carregado de conotações racistas. O frango frito, tradicional do sul americano, também se tornou um estereótipo racial. Filmes como O Nascimento de uma Nação (1915) e estabelecimentos como o restaurante “Coon Chicken Inn” reforçaram imagens caricatas da população negra, consolidando o preconceito em torno do alimento.
Ainda assim, tanto a melancia quanto o frango frito têm histórias de resistência. Pessoas negras transformaram esses alimentos em formas de sustento e identidade cultural, e hoje o frango frito é parte da culinária afro-americana tradicional, conhecida como soul food.
A obra de Nailah Elon mostra que é possível ressignificar símbolos de opressão. Ao reconstruir imagens racistas, ela oferece reflexão sobre racismo, memória histórica e identidade, demonstrando como a arte pode ser uma ferramenta de resistência, educação e empoderamento cultural.
O Condé Nast Traveller Readers’ Choice Awards 2025 elegeu o Quênia como o país mais amigável do planeta, com uma impressionante pontuação de 98,46/100. Não é difícil entender o porquê: é o povo queniano, com seus sorrisos largos, hospitalidade genuína e aquela energia contagiante de acolhimento, que transforma qualquer visita em uma experiência inesquecível. A lista também destaca outras joias do continente africano, Maurício (7º lugar, 96.67) e Seychelles (8º lugar, 96.36). A presença destes países desfaz o estereótipo de uma África monocromática e nos apresenta um continente diverso, acolhedor e pronto para receber o mundo.
Porém, o Quênia é muito mais que um país simpático; é um lugar onde história, cultura e inovação caminham juntas, desafiando estereótipos e apontando para um futuro brilhante.
1. Um retrato geográfico do berço da humanidade
Localizado na África Oriental, o Quênia faz fronteira com Tanzânia, Uganda, Sudão do Sul, Etiópia e Somália, tendo o Oceano Índico a leste. Sua capital, Nairóbi, é um centro pulsante de modernidade e diversidade, onde arranha-céus coexistem com o icônico Parque Nacional de Nairóbi, um raro santuário urbano da vida selvagem. O país abriga o Monte Quênia, segunda montanha mais alta do continente, e o emblemático Grande Vale do Rift, reconhecido como o berço da humanidade, símbolo da ancestralidade e da ciência unidas à beleza natural.
Grande Vale do Rift (Foto: Reprodução/Akagera National Park)
2. Cultura, ancestralidade e sabor
O Quênia é uma tapeçaria cultural formada por mais de 60 grupos étnicos, incluindo os kikuyu, luhya, luo, kalenjin, kamba e maasai. As línguas oficiais são o inglês e o swahili, mas dezenas de outras línguas locais mantêm viva a tradição oral e o modo comunitário. Na mesa, sabores únicos expressam essa diversidade: o ugali — uma massa simples e nutritiva de farinha de milho — é símbolo de união familiar; o nyama choma, carne assada lentamente, celebra a convivência em torno da brasa; e o sukuma wiki, refogado de couve, acompanha quase todas as refeições, tornando o ato de comer uma verdadeira comunhão social.
Nyama choma (Foto: BBQ Recipe)
3. Praias que parecem sonho
O litoral queniano é um tesouro pouco conhecido, com praias exuberantes como Diani, Watamu e Malindi. Diani Beach, frequentemente listada entre as mais belas do mundo, une areia branca, águas turquesa e recifes de coral em um cenário de sofisticação e tranquilidade. Definitivamente, suas praias são onde o mergulho, kitesurfe, pôr do sol e até mesmo o futebol criam um refúgio paradisíaco para moradores e visitantes.
Diani Beach (Foto: Mike Jones/Canva)
4. Um epicentro africano de inovação
Apelidado de Silicon Savannah, Nairóbi é o coração tecnológico da África Oriental, um polo vibrante de startups e centros de inovação que desenvolvem soluções para desafios locais e globais. O M-Pesa, um sistema de pagamento móvel lançado em 2007, se tornou uma revolução global ao promover inclusão financeira para milhões sem acesso a bancos tradicionais, exemplificando como a inovação é ferramenta de autonomia e transformação social no Quênia. Projetos de energia solar, agricultura sustentável e tecnologia digital demonstram que a criatividade queniana é movida pelo espírito comunitário e pela busca por um futuro melhor.
Com cerca de 75% da população abaixo dos 35 anos, o Quênia está na vanguarda de uma revolução social e tecnológica. Essa juventude energeticamente transformadora impulsiona o desenvolvimento sustentável, via investimentos em educação digital, agricultura regenerativa e energias renováveis. O espírito de harambee, que significa “vamos puxar juntos”, reflete a solidariedade que move o país e alimenta a inovação que nasce do senso de comunidade.
Foto: Reprodução/Further Africa
O Quênia é um poderoso lembrete de que a África é plural, criativa e protagonista de sua própria narrativa. É onde o encontro humano, marcado por hospitalidade e sorrisos, se mescla à evolução tecnológica que cria o amanhã.
No Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra, celebrado em 27 de outubro, especialistas e organizações reforçam a urgência de ampliar o acesso da população negra a um cuidado integral, humanizado e representativo. Apesar de representarem mais de 56% da população brasileira, pessoas negras enfrentam maior risco de adoecimento, mortalidade materna, doenças crônicas e desigualdade no acesso a serviços de saúde.
A data foi criada para fortalecer políticas públicas e movimentos sociais em defesa da equidade racial. Um dos principais instrumentos para esse objetivo é a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), criada em 2009, que orienta a promoção da equidade racial no SUS e reconhece o racismo como determinante social de saúde.
Dentro desse cenário de desafios estruturais, a clínica Baobá Saúde, fundada pela psicóloga Laíse Brito, se apresenta como um refúgio terapêutico que une ciência, acolhimento e identidade. A iniciativa surgiu em janeiro de 2025 com o objetivo de oferecer atenção integral à população negra, incluindo cuidados psicológicos e terapêuticos que consideram os impactos do racismo nas dimensões física, emocional e espiritual.
Segundo Laíse Brito, “cuidar da saúde da população negra é reconhecer histórias, corpos e subjetividades. É combater o racismo institucional, preparar equipes para um atendimento antidiscriminatório e garantir representatividade nos espaços de decisão. É compreender que a dor da população negra é real, que sua escuta é urgente e que seu tratamento deve respeitar suas especificidades biológicas, sociais e simbólicas”.
O espaço se consolidou como um exemplo de como iniciativas de saúde integral podem acolher e promover o bem-estar emocional e físico, integrando ciência e atenção às especificidades culturais e históricas da população negra. Para Laíse,“o racismo adoece, e se queremos falar de prevenção e de promoção de saúde, precisamos olhar para o impacto do racismo nas dimensões física, emocional e espiritual das pessoas negras. É isso que a Baobá se propõe a transformar”.
O 27 de outubro é um chamado à reflexão e à ação para gestores, profissionais e sociedade. Garantir saúde de forma equitativa exige atenção às diferenças raciais, étnicas e culturais, enfrentamento do racismo estrutural e compreensão de que cuidado integral vai além da ausência de doença, envolvendo qualidade de vida, pertencimento e reconhecimento das histórias da população negra.