Cabo Verde quer um lugar no pódio da inovação digital em África

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Cabo Verde quer um lugar no pódio da inovação digital em África
Imagem: Reprodução/Batuman

O continente africano, apesar dos efeitos da pandemia de covid-19, está em plena expansão econômica. O Banco de Desenvolvimento Africano (BAD) previu que, em 2021, o continente vai progressivamente desenlaçar-se da recessão de 2020 – a pior dos últimos 50 anos – com uma previsão de crescimento do PIB de cerca de 3,4%.

Este cenário favorável ao desenvolvimento tem como principal catalisador a efervescência do sistema tecnológico que se vive atualmente no continente, com Cabo Verde a assumir-se como um agente expedito na transformação digital da sua economia. Em 2019, à margem do lançamento oficial do projeto Cabo Verde Digital (CVD), o agora re-leito primeiro-ministro Ulisses Correia e Silva indicou que “a economia digital é uma grande aposta do Governo cabo-verdiano”, sublinhando que o país tem “talentos e um sistema que se está a preparar, que vai do sistema educativo ao ecossistema de financiamento, passando pelo apoio ao empreendedorismo e a estabilidade”.

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Um dos principais projetos, a Bolsa Cabo Verde Digital, tem como grande objetivo apoiar anualmente 100 jovens e 50 startups, com um montante mensal de 30 mil escudos (cerca de 270 euros) durante seis meses, com serviços de mentoria e incubação.

A aposta principal está centrada no aumento da literacia digital, com foco nas pessoas e nas suas capacidades e potencialidades individuais de desenvolvimento de projetos que ajudem Cabo Verde a tornar-se no próximo hub tecnológico africano, através de cursos de codificação a bolsas para o desenvolvimento de projetos de base tecnológicas e criação de empresas.

A Smart Solutions é uma das empresas que já pôde beneficiar desse impulso. A startup, que pretende resolver problemas do quatidiano dos cabo-verdianos através da inovação, foi uma das vencedoras do programa Re!venta <Turismo>, que quer dinamizar o setor do turismo no país. Fundada por Igor Fonseca e Eriksson Monteiro, dois jovens residentes na diáspora “que nunca perderam as raízes” que os ligam ao arquipélago, a empresa está a “desenhar soluções disruptivas, adaptadas à realidade e às necessidades de Cabo Verde. Soluções que visam aumentar a produtividade e a sustentabilidade das cidades cabo-verdianas.”

Em exclusivo para o Re!venta, a dupla criou e desenvolveu a plataforma guiatur.cv, uma ponte entre operadores turísticos e guias de turismo certificados e devidamente credenciados por entidades selecionadas pelo Ministério de Turismo e Transporte. Na prática, a plataforma pretende acelerar a digitalização desse segmento de mercado, proporcionando aos seus utilizadores “guias certificados, formação contínua dos guias de turismo, pagamento digital, normalização dos preços praticados, classificação dos serviços prestados pelos Guias de Turismo, entre outros serviços”, explicaram-nos.

“O programa, os mentores e os prêmios foram fundamentais para começar e continuar com o desenvolvimento do produto. Conseguimos ter uma ideia mais clara sobre como resolver os problemas do setor e monetizar o produto. Tivemos acesso direto a mentores que têm dezenas de anos de experiência no setor, mentores na área de desenvolvimento de software, tivemos prêmios importantíssimos como os recursos cloud da IBM, acesso à plataforma do NOSi e ainda 800 contos (cerca de 7.200 euros) para auxiliar no investimento do desenvolvimento do produto”, explicou-nos a dupla de empreendedores.

Atualmente à frente do projeto NhaTáxi, um aplicativo que quer resolver as dificuldades de mobilidade e segurança no país, Igor e Eriksson acreditam num futuro promissor para o ecossistema tecnológico cabo-verdiano.

“Estamos muito entusiasmados com o ecossistema que se está a criar. Vemos jovens com soluções interessantes e inovadoras e vemos uma aposta grande neste ecossistema. Nos últimos anos a aposta no digital tem vindo a ganhar grande importância em Cabo Verde e projeta-se que no futuro venha a ter um enorme impacto no PIB nacional. Como alguns dos maiores exemplos da aposta no ecossistema digital de Cabo Verde podemos identificar a criação dos data centers em Santiago e em São Vicente, a criação do Parque Tecnológico e a aposta na Bolsa Cabo Verde Digital. Tivemos a oportunidade de participar na Bolsa Cabo Verde Digital que permite, além do auxílio financeiro, capacitar as startups com mentoria qualificada no momento que mais precisam. Para nós, uma jovem startup tecnológica, fazer parte do ecossistema ajudou-nos imenso na fase inicial da empresa e neste momento conseguimos ver o quão importante foi beneficiar da bolsa e de toda a rede criada à volta.” 

A NhaTáxi está atualmente em fase de testes no terreno, com cerca de 20 táxis. “Normalizamos a tabela de preço praticada no mercado, inserimos o pagamento electronico e estamos a trabalhar num botão de pânico a bordo, que gera um alerta em tempo real para a Polícia Nacional”. O que torna a app atrativa é o fato de criar uma espécie de rede de segurança para o utilizador. “Em Cabo Verde, os táxis circulam mais nas ruas principais, obrigando as pessoas a deslocarem-se até estas ruas para conseguirem um. São nestes pequenos trajetos que correm o risco de serem assaltadas. A ideia por trás de NhaTaxi é garantir a segurança destas pessoas, desde o momento em que solicitam o táxi até chegarem ao seu destino”.

Este ambiente tecnológico em plena ebulição atinge todos os setores profissionais, com o contínuo florescer de novos serviços e aplicativos. É o caso, por exemplo, de Josimar Bazílio, de 28 anos e originário da ilha de São Vicente, que criou a All Seven, uma ferramenta que quer revolucionar e aprimorar o contacto entre artistas e o mercado. Apesar de crescer com a ideia de desenvolver anti-vírus para combater “os maus da fita” do sistema informático, Bazílio acabou por aliar a sua formação em Engenharia Informática ao gosto pelo mundo da música.

A tecnologia, uma arma para alavancar o sector das artes

Ao participar na Bolsa Cabo Verde Digital, o empreendedor ganhou uma participação num programa de pré-incubação e financiamento, para levar a cabo o seu projeto. A All Seven “é uma comunidade artística e tem como objetivo permitir ao artista expor o seu produto, obter financiamento para alavancar os seus projetos, e ainda dispor o seu serviço através de um serviço de agenciamento”, tudo num ambiente colaborativo entre artistas. Ainda numa fase embrionária de desenvolvimento, com o estabelecimento de contacto com os vários atores culturais, a aplicação teve como ponto de partida a necessidade de os artistas passarem de produzir apenas por amor à arte para passarem a ter uma fonte de rendimento dessa arte.

A participação no programa permitiu a Josimar Bazílio criar um sistema de organização para despontar o seu negócio. “Para mim, a chave da Bolsa Cabo Verde Digital na All Seven é organizar. Eu não era organizado e se não formos organizados não vamos para a frente. Nós temos o conhecimento mas não conseguimos aplicar essa metodologia corretamente e foi com essas instruções, de como organizar as ideias e de como trabalhar de forma empresarial, que eu comecei a correr. Acima da quantia que tínhamos mensalmente e do suporte, o maior presente que recebemos da CVD foi isso”, explica-nos o jovem.

Agora, com uma planificação, metas e prazos para cumprir, a All Seven vai começar já a partir de maio o contato com os artistas, com base numa rede de profissionais de programação, marketing, multimédia e comunicação, que engloba as redes sociais.

Não é apenas o empreendedorismo que está debaixo dos holofotes da CVD. Com o crescimento da digitalização de serviços nos vários setores do mercado económico, está atrelado o aumento do interesse por parte dos jovens nos diferentes segmentos profissionais das tecnologias. É o que acontece com Fábio Alves, 18 anos, natural da Boavista. Com o 12.º ano concluído e vários projetos informáticos que não concluiu, o entusiasta pela cultura pop, descobriu no programa de código Kode for All/ Kode Verde – que conta com a parceria da Academia de Código -, a oportunidade para desenvolver as suas habilidades de programação, com o propósito de finalmente materializar as suas ideias de projeto.

Com direito a acomodação – 40% dos participantes residiam fora da cidade da Praia -, o Kode Verde ofereceu aos seus participantes um curso intensivo, das 9 às 18 horas, de segunda a sexta-feira, durante 14 semanas, que aliou teoria e prática, naquilo a que Fábio chama de bootcamp. “Com toda a bagagem que ganhámos, podemos agora trabalhar remotamente para qualquer empresa em qualquer ponto do mundo.”

Com o objetivo de se tornar um desenvolvedor profissional, Fábio Alves acredita que este tipo de programas estão a abrir portas para a juventude, de forma a que esta possa ter um papel ativo nesta transformação digital e económica que o país está a viver. Como nos disseram Igor Fonseca e Eriksson Monteiro, da Smart Solutions: “Estes programas “têm impulsionado os jovens a ter ideias inovadoras e disruptivas, desenhando soluções para o nosso mercado e resolvendo os problemas e desafios do dia-a-dia dos Cabo-verdianos. São programas que despoletam e desafiam o digital a resolver os desafios reais de Cabo Verde e que, além do apoio financeiro, fornecem uma mentoria muito próxima do promotor do projecto, com foco no sucesso do mesmo.”  

Para jovens, menos jovens, homens ou mulheres, o sector tecnológico em Cabo Verde goza de boa saúde e recomenda-se, na garantia que o governo está a olhar para um futuro próspero e a criar soluções para capacitar os seus cidadãos neste setor. A meta será exportar os serviços nacionais para outras geografias, que, para os fundadores da Smart Solutions, é a aposta certa. “Isso sim nos transformaria num verdadeiro hub. Isto é a imagem do povo que somos. A falta de recursos naturais sempre nos obrigou a apostar na educação e no conhecimento. Gostaria de ver-nos no Top 5 de África, nesta área, nos próximos cinco anos. Sabemos que é uma meta ambiciosa, mas com um percurso muito excitante. Por isso, de certeza que valerá a pena”, disseram à BANTUMEN.

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