A Anielle Franco, 37, diretora executiva do Instituto Marielle Franco, em parceria com a organização Mulheres Negras Decidem, lançou o “Estamos Prontas” para potencializar 27 mulheres negras, pré-candidatas da eleição 2022 e em entrevista ao MUNDO NEGRO, ela falou sobre o projeto e o clima político que ainda assusta as lideranças negras.
“A gente tem fortalecido essas ativistas com trocas, palestras, falas, oficinas de segurança digital, coisas bem pontuais, pra que a gente possa vir a ter êxito nelas, como pessoa, não só mirando candidaturas, mas é óbvio que a gente espera muito que possamos, no final do ano, ter um número de candidatas negras eleitas maior do que a gente já teve em qualquer outro ano, no país”, explica Anielle que tem como objetivo transformar as mulheres negras em protagonistas de suas próprias histórias para que elas tenham êxito em serem eleitas. “A ideia desse fortalecimento é que a gente possa ter “Sementes de Marielle“, que é o que a gente sempre fala, sobre legado, sobre ressignificação da dor”, diz a irmã da Marielle.
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Em relatório publicado após as eleições municipais de 2020, o Instituto Marielle Franco apresentou 8 tipos de violências políticas sofridos por mais de 140 candidatas negras nas eleições. Já em 2021, foi apresentado um dossiê com relatos de 11 parlamentares negras defensoras de direitos humanos, de diferentes gerações e partidos, sobre as violências políticas sofridas por elas após eleitas e como garantir seus direitos políticos.
Foi com base nesses resultados, que o instituto criou o movimento Não Seremos Interrompidas para aplicação da Lei da Violência Política. A eleição 2022 será a primeira com a lei em vigor, para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, mas segundo o instituto divulgou há dois meses, nenhum partido está aplicando para proteção das pré-candidatas negras.
“A violência política nunca acaba, mesmo que haja de forma silenciosa, a gente poderia falar inúmeros exemplos que já aconteceram só esse ano, então não tem sido um clima mais ameno, pelo contrário, as mulheres negras seguem com medo, se sentindo ameaçadas, sendo perseguidas. Infelizmente o racismo está em todos os lugares, inclusive dentro das Câmaras, no Brasil inteiro. A violência política é algo que a gente vai ter que combater. Vale lembrar que em 2018, a gente elegeu um presidente baseado quase que inteiramente em fake news. E a gente sabe que em 2022, provavelmente, não vai ser diferente em relação a isso”, diz Anielle.
Para Anielle, só a aprovação da lei não tem sido o suficiente. “A lei da violência política é uma vitória, mas a gente precisa realmente colocar em prática. A gente ainda tem aí um papel na sociedade de dar visibilidade cada vez mais a situações de vulnerabilidade, de violência política dessas mulheres que tem enfrentado quase cotidianamente”.
A exemplo disso, ela resgata algumas mulheres negras políticas vítimas de violência. “A Benedita da Silva, a Talíria Petrone. Tem muita coisa que a gente precisa levar adiante, entendendo que a lei é um passo importante que foi dado, mas a gente precisa ter atitudes concretas, do próprio Estado, seja pela ONU, seja pelos órgãos, que hoje defendem as defensoras desses direitos humanos na categoria de deputadas ou vereadoras, mas precisa estar de olho aberto pra que seja cumprida. Não basta aprovar, para que essas mulheres possam permanecer viva”, afirma.
A “Agenda Marielle Franco“, feita em um conjunto de pautas e práticas antirracistas, antiLGBTfóbicas, feministas e populares, assinada por mais de 80 parlamentares eleitas em todas as regiões do país, tem sido um dos motivos de orgulho da irmã. “Ter feito a agenda em 2020 e ver todos os desafios que as mulheres estão enfrentando pra implementar nas casas legislativas, mas que ainda assim, tendo êxito, foi muito gratificante”.
O projeto tem acentuado um dos grandes sonhos políticos de Anielle. “Ter esse documento com todo o trabalho da Mari, tudo que ela fez em um ano e pouco de mandata, me deu a maior certeza de que a gente vai ainda ter casas lotadas de mulheres negras. E ainda quero ver isso acontecer: eleger uma mulher negra presidente do Brasil. Não sei como a gente vai conseguir, nem quando, mas tenho esperança de que isso aconteça, e se tiver que ser a partir da agenda, do fortalecimento do instituto, de mulheres lideranças, será. Vamos fazer o nosso melhor”.
Anielle se emociona ao pensar em tudo o que aconteceu desde o assassinato de Marielle, há quatro anos, e a luta pela justiça e pelo fim da violência política. “Eu jamais na minha vida imaginaria que iria perder a minha irmã, colocar esse instituto de pé, ter um papel fundamental na vida dessas mulheres e agora também enquanto liderança negra, acompanhar o trabalho de todas elas de perto”.
E complementa: “Acompanhar o trabalho de manter esse legado através delas, parcerias, projetos, trabalhos incríveis, tem sido desafiador, mas também acalentador porque o legado da Mari é plural, é um legado que não está somente na política institucional, a gente vai ver e sentir por muitos e muitos anos ainda. Por mais que me doa essa saudade, por mais que doa estar a frente do instituto, a gente sabe da importância de estar junto com essas mulheres diversas espalhadas pelo Brasil e pelo mundo afora, gritando que o legado da Marielle vive!”.
“O efeito das mulheres negras que tem levado esse legado de Marielle tem sido visivelmente positivo e com novidades para este mês de Julho das Pretas. “Com ‘A Voz da Marielle‘, vai ser um acervo onde você vai passar o telefone por cima da imagem e poder abrir um discurso da Mari, bem no âmbito virtual. E no dia 27 de julho, a gente vai lançar a estátua Marielle Franco, no Buraco do Lume (RJ). Tanto a estátua, quanto A Voz, a gente vai ter um anúncio em breve nas redes”, finaliza.
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