Crianças e jovens negros, entre 10 e 29 anos, do sexo masculino, são os que mais sofrem com saúde mental no Brasil. Segundo os dados do Ministério da Saúde, esse grupo tem 50% mais chance de tirar a vida do que entre brancos da mesma idade. Mas por que isso ocorre?
Para além de discutir a depressão e ansiedade, algumas das doenças relacionadas a saúde mental, o psicanalista Lucas Mendes disse ao Mundo Negro sobre como o banzo aponta para uma tristeza antiga da população negra.
Notícias Relacionadas
Carga mental: 55% das mães assumem sozinhas as decisões do lar mesmo com parceiros
Desenvolvimento de doenças autoimunes estão relacionadas ao auto-silenciamento de mulheres negras
“100 % dá pra dizer que as pessoas pretas de hoje, especialmente as do Brasil, que é o que eu estudo, psicanálise e relações raciais no Brasil, tem um banzo introjetado. A cultura se atualizou e continua explorando a gente da mesma forma, porque o capitalismo é essencialmente racista. Não sou eu que estou dizendo isso. O Silvio Almeida [no livro] ‘Racismo Estrutural’, e inúmeros outros autores que se debruçaram sobre isso, que o capitalismo só existe se ele tiver alguém para ser explorado, e neste caso, no Brasil, o preto, a preta. É um sistema de escravização, muito mais sofisticado, subjetivo e elaborado, mas continua sendo um sistema de escravização”, explica.
Lucas também detalha como os negros na diáspora ainda são impactados negativamente pelo racismo e escravidão. “Ele deturpa a identidade, tira a herança do eu, então o racismo faz isso. Existe uma segunda etapa que é o ideal preto, que também não é identidade por si só, porque também entra numa ideia de união do negro, que é horrível, que é como ‘somos todos de África, então somos todos iguais’. Não, porque lá não são todos iguais, porque são ‘N’ povos, culturas, diversidades coletivas e individuais. Esse borramento dessas individualidades, faz com que a pessoa perca a identidade. Uma vez que você perde o eu, você fica desesperançoso de si em relação ao mundo. Tem um sistema de exploração objetivo, trabalho e subjetivo do negro, que faz com que perca energia e que tenha sentimentos de culpa, pois a cultura responsabiliza o preto por tudo o que acontece, mesmo sem ter polícia à prova disso”.
E completa: “essa combinação toda, completamente, sim, está introjetada na nossa cabeça e o banzo é um sentimento comum. O banzo tira a energia vital que poderia fazer com que o negro se insurgisse contra aquele sistema escravocrata. E uma das fontes de energia que o banzo priva é a raiva, porque ela fica voltada para dentro, é tudo contra mim: ‘eu sou o problema’, ‘eu não gosto de mim’, ‘eu me odeio’, ‘eu estou causando mal’, ‘eu estou fazendo errado’. Então essa raiva toda que poderia ser fonte de energia para solução individual ou coletiva, para sair daquele problema, ele fica privado, porque a raiva está voltada para dentro”.
O psicanalista também pontua como o banzo também se manifesta quando uma pessoa preta alcança o sucesso. “Ele não estava antes, porque, na verdade, existem locais onde a identidade deste preto ou preta é preservado, mas no sistema mais amplo, capitalista, esse lugar é periférico, ele é periferizado. Quando aquela pessoa sai daquilo, se instala o banzo, e aí, opa, ‘que porra é essa?’. Pois é, é essa herança que ficou lá dentro, esse banzo ainda existe dentro da gente e, quando a gente eventualmente vai ocupar a totalidade, eu não estou nem falando só de sucesso financeiro, mas em formas de prosperar, o banzo que estava quieto, porque ele não estava entrando em confronto com a identidade parcial, ele se estabelece, porque, quando você pega tudo, ele está lá. Essa ideia psicanalítica do banzo. Frantz Fanon falou muito sobre isso”, finaliza.
Leia a entrevista completa aqui!
Notícias Recentes
‘O Auto da Compadecida 2’: Um presente de Natal para os fãs, com a essência do clássico nos cinemas
Leci Brandão celebra 80 anos e cinco décadas de samba em programa especial da TV Brasil