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“Apartheid à brasileira” não é acidente, é projeto!

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Thiago André (Foto; Divulgação)

Texto: Thiago André

No ano 2000, o geógrafo e pensador Milton Santos (1926-2001) escreveu o seu emblemático ensaio “Ser negro no Brasil de hoje”, onde ele questiona a ideia de uma democracia racial no Brasil e denuncia as hipocrisias que ainda sustentam nosso racismo de cada dia. Mais de vinte anos depois, releio o seu texto e percebo que pouca coisa mudou. Ser negro no Brasil continua sendo uma tarefa difícil.

Aqui, pretos e pardos são maioria, representando 55% da população, mas vivem menos e em piores condições. Ocupam os subempregos e os trabalhos análogos a escravidão, são a maioria dos analfabetos e formam a maioria nas prisões. Enquanto brancos têm as melhores oportunidades de educação e renda, pessoas negras figuram como as principais vítimas da violência, da fome e das epidemias.

Boa parte da sociedade brasileira aprendeu a agir com naturalidade diante da desigualdade racial. Alguns, inclusive, escolhem deliberadamente negar essa realidade, insistindo na falsa ideia de uma “harmonia racial”. A esse jogo indecente de negacionismo e indiferença, Milton Santos deu o nome de “apartheid à brasileira”.

Para muitos a ideia de existir um “apartheid à brasileira” soa como exagero retórico. Afinal, ao que se sabe, aqui nunca teve mecanismos legais de segregação racial. Mas não é bem assim.

No último ano, me debrucei sobre este tema e fui buscar, em nosso passado, as raízes legais da nossa desigualdade racial. Descobri que, diferente do caso sul-africano e norte-americano, o Estado brasileiro desenvolveu mecanismos dissimulados de segregação.

Nos primeiros meses após a Abolição, já se discutia a possibilidade de criar um ordenamento jurídico para controlar e disciplinar os libertos. Um código que pudesse dar um verniz de legalidade às doutrinas pseudocientíficas e racistas que orientavam o pensamento das elites nacionais.

Por isso, após a Abolição, a população negra não recebeu um projeto de inclusão; recebeu um Código Penal que criminalizava pessoas sem emprego formal ou sem residência fixa. E quem, dois anos depois da Abolição, compunha essa massa de descamisados e sem moradia regular? Os negros recém-libertos. Sem mencionar a palavra “raça”, nosso primeiro Código Penal criminalizou a vulnerabilidade social dos negros.

Esse é só um exemplo de como o “apartheid à brasileira” se desenvolveu nas entrelinhas das leis. Ao longo do tempo, muitas outras leis parecidas com essa representaram um entrave para o desenvolvimento da população negra. No último ano, me dediquei a pesquisar e escrever sobre essas leis e as pessoas que foram afetadas por elas.

Este trabalho completo foi lançado como uma áudio série documental chamada Apartheid Tropical. Este é o resultado de uma investigação cuidadosa que contou com a colaboração de historiadores, sociólogos e ativistas, trazendo à tona vozes que muitas vezes não são ouvidas. É a consolidação de uma investigação que dá pistas de que não chegamos neste estado de coisas por acaso. Nossa desigualdade fez parte de um projeto de país. 

Como escreveu Milton Santos, ainda é urgente reagir contra o “apartheid à brasileira”.

Thiago André é acadêmico de História, criador do podcast História Preta e autor e narrador da áudio série Apartheid Tropical pela Audible.

Império Serrano é celebrado em show gratuito no IMS Paulista com Dona Leda e clássicos do samba

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Glória ao Samba e Dona Leda. Foto: Juliana Vitulskis.

Neste domingo, 1, às 15h, o Instituto Moreira Salles (IMS) Paulista será palco de um espetáculo gratuito em homenagem aos 77 anos do Grêmio Recreativo Escola de Samba Império Serrano, uma das agremiações mais icônicas do carnaval brasileiro. O evento, que integra as comemorações pelo Dia Nacional do Samba, celebrado em 2 de dezembro, é promovido pelo coletivo cultural Glória ao Samba.

O show contará com a participação especial de Ledahí Nascimento, a Dona Leda, 91, figura histórica do samba carioca e uma das guardiãs da memória do Império Serrano. Filha de Tia Eulália, uma das fundadoras da escola, Dona Leda é reconhecida por seu papel na recuperação de sambas inéditos que serão apresentados no espetáculo. O repertório inclui clássicos como “Voltei à Serra Querida” (Mano Décio), “Me Abandonaste” (Mestre Fuleiro e Dona Ivone Lara) e “A Lei do Morro” (Silas de Oliveira e Mestre Fuleiro), entre outras composições que marcaram a trajetória da escola.

Fundado em 1947 por dissidentes da extinta Escola de Samba Prazer da Serrinha, o Império Serrano se consolidou como um dos pilares da cultura popular brasileira. Entre seus fundadores e integrantes históricos estão nomes como Mano Décio da Viola, Silas de Oliveira, Dona Ivone Lara e Aniceto Menezes.

Além do show, o evento no IMS Paulista marcará o relançamento de Império Serrano – Primeiro Decênio (1947/1956) e o lançamento inédito de sua continuação, Império Serrano – Do Timbó à Carmen Miranda (1957-1972), ambos escritos pelo folclorista Francisco de Vasconcellos. As obras, consideradas referências na bibliografia do samba, traçam um panorama detalhado dos primeiros 25 anos da escola. Publicado originalmente em 1991 com uma tiragem limitada, o primeiro volume é hoje uma raridade. A nova edição, junto ao segundo volume inédito, foi idealizada e custeada pelo Glória ao Samba, que se dedica à preservação da memória do samba tradicional.

Serviço

1º de dezembro (domingo), às 15h
Térreo | IMS Paulista
150 lugares em pé + 30 lugares sentados (público preferencial)
Entrada gratuita. Classificação livre.
Evento com interpretação em Libras (Língua Brasileira de Sinais)

IMS Paulista
Avenida Paulista, 2424. São Paulo

Primeiro afro-americano a criar um vinho no Brasil fortalece laços entre Brasil e diáspora africana

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Michael Scott Carter, economista norte-americano, lança no Brasil os primeiros vinhos idealizados por um homem negro no país. Carter acompanha todo o processo de produção dos rótulos ILẸ́ AMỌ̀, ILẸ́ AMÒGO e ILẸ́ AMỌRA, que buscam estabelecer uma conexão entre o terroir brasileiro e a diáspora africana.

Inspirado pela diversidade geográfica e cultural do Brasil, Carter explora o potencial das regiões vinícolas brasileiras, desde a Serra Gaúcha até o Vale do São Francisco. “Em nosso compromisso com a diversidade, aprofundamos os laços culturais entre o Brasil e a diáspora africana, estabelecendo novas expressões para nossos cortes”, afirma Carter. Ele destaca que os vinhos não são apenas produtos, mas também uma forma de abrir portas para futuras gerações na indústria do vinho.

Os vinhos Michael Scott Carter combinam influências do Velho e do Novo Mundo, refletindo as adversidades e triunfos da jornada do enólogo. O nome “ILẸ́”, que significa “casa” em iorubá, faz uma referência ao solo brasileiro que acolheu o projeto. Cada rótulo tem características específicas:

  • ILẸ́ AMỌ̀ (Branco): Vinho com notas de pera, limão e flores brancas, destacando a pureza dos elementos brasileiros.
  • ILẸ́ AMÒGO (Rosé): Vinho rosé com notas de frutas vermelhas, representando vivacidade e elegância.
  • ILẸ́ AMỌRA (Tinto): Vinho tinto que reflete acolhimento e paixão, com notas vibrantes e intensas.

A marca também apresenta um Tinto Reserva, com estrutura robusta e complexidade notável. Segundo Vanessa Fonseca, embaixadora da marca no Brasil, “a Michael Scott Carter é um símbolo de que, ao unir nossas histórias e culturas, criamos algo duradouro e genuinamente brasileiro”.

A vinícola, localizada no Rio Grande do Sul, adota práticas sustentáveis, como o uso de garrafas recicláveis e rolhas naturais, destacando seu compromisso com a preservação ambiental e a inclusão cultural.

Mais informações:
@michaelscottcarterwinery | www.michaelscottcarter.com

(In)Justiça Climática para quem?

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Foto: Isis Medeiros / Greenpeace

Texto: Juliane Sousa

A pauta do clima, além de urgente, é atravessada por profundas interseccionalidades que refletem as desigualdades de gênero, raça e renda no Brasil. Basta ver como as mulheres negras, historicamente marginalizadas, enfrentam de forma desproporcional os impactos das recentes crises climáticas que assolam o país.

Nas periferias, nos quilombos, nas populações ribeirinhas, em qualquer lugar é possível sentir as consequências ora das enchentes ora da seca. As famílias de comunidades pobres, predominantemente negras, se veem obrigadas a deixar suas casas e suas vidas de uma hora para outra. O racismo ambiental se impõe sobre as mulheres que, sem acesso a recursos, convivem com a incerteza do amanhã em áreas suscetíveis a desastres naturais.

É fato: as políticas ambientais no Brasil ignoram as necessidades específicas das mulheres negras e periféricas. E pior, as ações climáticas voltadas para a mitigação de danos raramente consideram essas mulheres como protagonistas das mudanças que, na prática, influenciam diretamente suas vidas. Ao contrário, muitas políticas são formuladas de maneira descontextualizada e restrita, sem a devida representatividade na hora da decisão.

Muitas dependem de atividades econômicas como a agricultura familiar e o artesanato, quase sempre afetadas pela degradação ambiental. A atual seca na região Norte, por exemplo, leva à perda de colheitas, gerando uma maior vulnerabilidade às mulheres e suas famílias. Longe de ser um acaso do destino, este cenário é uma extensão da injustiça social no Brasil.

As estruturas racistas e violação de direitos básicos que marcam a sociedade brasileira amplificam os impactos climáticos sobre essas mulheres, que deveriam estar presentes não em situações de perigo, mas sim nos espaços de tomada de decisão para conter os impactos climáticos. Suas vozes e necessidades precisam ser representadas. É papel das empresas, governos e sociedade civil atuarem juntos para garantir a promoção da equidade de gênero e raça também na formulação de políticas ambientais

Iniciativas como o Coletivo Pretas B, do Sistema B Brasil, são exemplos de que é possível promover um ambiente de decisões mais inclusivo e representativo, que valorize essas mulheres e amplifique suas vozes e opiniões na busca por um país mais justo e sustentável. Empresas B certificadas, com suas práticas de responsabilidade social, são capazes de direcionar investimentos para comunidades economicamente vulneráveis, promovendo adaptações climáticas e capacitação dessas populações, especialmente as mulheres, para resistirem às crises ambientais.

A justiça climática é, antes de tudo, uma questão de direitos humanos. Sem equidade, sem inclusão, sem a voz e a experiência das mulheres negras, não há como pensar em soluções para essa questão no Brasil.

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Juliane Sousa é jornalista quilombola e gerente de Comunicação e Marketing do Sistema B Brasil*

Câmara aprova a inclusão da escritora Carolina Maria de Jesus no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria

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Foto: Divulgação/IMS/Folhapress

Uma heroína negra! A Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira (27), o projeto de lei que inscreve o nome da escritora Carolina Maria de Jesus (1914-1977) no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. A proposta segue para análise do Senado.

Com autoria da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), o PL 773/2024 recebeu parecer favorável da deputada Daiana Santos (PCdoB-RS), relatora na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ).

Considerada uma das mais relevantes escritoras do Brasil, Carolina Maria de Jesus viveu grande parte de sua vida na favela do Canindé, no centro de São Paulo. Sustentando seus três filhos como catadora de papéis, ela alcançou notoriedade em 1960 com o lançamento de seu primeiro ‘Quarto de Despejo: Diário de uma favelada’. A obra vendeu 10 mil cópias em uma semana, foi traduzida para 13 idiomas e distribuída em mais de 40 países.

A deputada Daiana Santos destacou que o legado de Carolina ultrapassa o campo literário, contribuindo para a formação de uma consciência crítica sobre a realidade brasileira e para a valorização da diversidade cultural. “Carolina Maria de Jesus é referência de mulher negra, da luta e da resistência do nosso povo”, afirmou a relatora.

Em meio a críticas da oposição, Erika Hilton defendeu o legado de Carolina Maria de Jesus. “Se isso não é um exemplo à Nação, o que será?”, questionou. “Sem nada, sem recurso, sem escolaridade, sem ninguém acreditar, ela foi lá e produziu ciência literária.”

O Livro dos Heróis e Heroínas fica guardado no Panteão da Pátria e da Liberdade, em Brasília.

Ludmilla retorna ao Rio com a turnê Numanice para dois shows no Riocentro

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Foto: @ludmillanumanice

A cantora Ludmilla desembarca no Rio de Janeiro nos dias 7 e 8 de dezembro com a aclamada turnê Numanice. Com ingressos para o primeiro show esgotados em poucas horas, a artista anunciou uma apresentação extra no domingo (8), reafirmando o sucesso de seu projeto de pagode. Os portões do Riocentro, na Barra da Tijuca, abrem às 14h para receber fãs e celebrar uma das maiores labels musicais do Brasil. Os últimos ingressos estão disponíveis pelo Sympla.

Natural de Duque de Caxias, Ludmilla carrega uma relação especial com o palco carioca. “O Numanice tem sido uma das maiores realizações da minha carreira, e trazer esse show para o Rio, que é a minha casa, é muito especial. É uma celebração do lugar de onde vim e de tudo que conquistei ao longo dos anos. Quero dividir essa energia com o público e fazer dois dias inesquecíveis, com muito pagode e boas vibrações”, declarou.

Além do repertório repleto de sucessos, o evento se destaca por trazer participações especiais de grandes nomes da música e experiências exclusivas para o público. A turnê Numanice já passou por diversas cidades, lotando arenas e acumulando números impressionantes: são mais de 3,5 bilhões de streams nas plataformas digitais e um Grammy Latino na categoria Melhor Álbum de Samba/Pagode, conquistado em 2022.

Ludmilla também se consolidou como uma das principais artistas brasileiras no cenário global. Com mais de 7 bilhões de plays e sendo a 6ª mulher preta mais ouvida no mundo no Spotify, ela ocupa um lugar de destaque ao lado de nomes como Beyoncé, Rihanna e Nicki Minaj. Em abril, fez história como a primeira mulher preta latino-americana a se apresentar no palco principal do Coachella, sendo introduzida pela própria Beyoncé.

Após o Rio de Janeiro, a turnê segue para Curitiba (15/12), Maracaípe (28/12), Guarapari (11/01) e outras cidades. Detalhes e atualizações podem ser conferidos no Instagram da cantora.

Serviço: Numanice no Rio de Janeiro

Local: Riocentro – Av. Salvador Allende, 6555, Barra Olímpica, Rio de Janeiro – RJ

Datas: 07 e 08 de dezembro de 2024

Abertura dos portões: 14h

Classificação etária: Front Stage – 16 anos / Open Bar – 18 anos

Ingressos disponíveis em: Sympla

As cotas raciais ainda não possibilitaram estabelecer a população negra em um sistema de equidade social

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Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil/Arquivo

Texto: Jarbas Vargas Nascimento

Os resultados dos últimos censos têm revelado que a população preta e parda continua sua trajetória histórica, no Brasil, em situação de subalternidade e de desigualdades étnico-raciais em relação aos brancos. Não temos dúvida de que o racismo estrutural, institucional e sistêmico imposto à população preta e parda resulta da pressão do privilégio da elite branca e do acúmulo de prejuízos, confirmado pelos indicadores de empregabilidade, representatividade, identidade, habitação, ausência de acessibilidade a recursos educativos de qualidade e de consumo de bens, questões que se interrelacionam e correspondem não apenas a experiências individuais, mas também coletivas da população preta e parda e de sua interação na sociedade onde vive. 

Embora os dados do Censo Demográfico de 2022 revelem aumento de estudantes pretos e pardos nas Universidades públicas, a visibilidade ainda é baixa, por motivos complexos e relacionados, em comparação ao número desses sujeitos no universo populacional brasileiro divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Isso comprova que as cotas raciais como ações afirmativas ainda não possibilitaram inserir a população preta e parda na universidade pública e estabelecer definitivamente um sistema de equidade social, que desfaça, por conseguinte, as desigualdades interraciais estruturais, construídas ideologicamente pela elite dominante com o intuito de apagar da população preta e parda sua identidade étnica e social. 

De nosso ponto de vista, desigualdade socioeconômica, pouca representatividade preta e parda nas universidades públicas, pressões sociais e familiares, desigualdade na educação básica e a concepção de universidade, vigente na contemporaneidade, constituem os quatro eixos, que nos ajudam a compreender o porquê da baixa adesão ao sistema de cotas raciais na Educação Superior, como política de inclusão formativa dessa população excluída historicamente. É importante considerar a desigualdade socioeconômica, pois muitos estudantes pretos e pardos vêm de famílias pobres, fato que, desde a infância, os impede o acesso a uma educação básica de qualidade. Na verdade, isso afeta seu bom desempenho no Vestibular ou Enem, principais portas de entrada para as universidades públicas em nosso país. 

Um segundo ponto frequentemente levantado é a ausência de representatividade preta e parda na universidade, além da falta de uma rede de apoio que possa criar um ambiente de empatia e acolhimento desses estudantes, que se sentem isolados e desmotivados, redundando no aumento da taxa de evasão escolar. Somam-se a isso as pressões sociais e familiares, que forçam estudantes pretos e pardos a enfrentarem pressões adicionais, para socorrer financeiramente seus familiares, obrigando-os a priorizarem o trabalho assalariado ao estudo. Ademais, a qualidade desigual da educação básica é, geralmente, um grande obstáculo, pois estudantes pretos e pardos são os mais afetados por escolas públicas de baixa qualidade e alta vulnerabilidade, que comprometem sua preparação para a Educação Superior.

Uma última e não menos importante reflexão recai sobre a concepção de universidade vigente no Brasil. Nossas universidades secundarizaram o processo formativo. O que se realça é a reprodução de conhecimentos, sem questionamento, sem inventividade, sem inovação, questões que não estimulam os estudantes pretos e pardos a permanecerem na universidade, a pertencerem a ela, em razão de a sociedade brasileira considerá-los excluídos, sujeitos que se colocam à margem, à deriva da sociedade. 

Há necessidade de uma mudança generalizada na concepção de universidade, pois a negação da identidade preta e parda aprofunda-se com o acirramento das contradições do modo de produção capitalista, que fundamenta nossa sociedade e nossas universidades. A presença de pretos e pardos nas universidades públicas torna-se fundamental no enfretamento do racismo, que afeta o bem-estar emocional e psicológico e a construção de um ambiente cultural e acadêmico mais rico e plural, nos quais a população preta e parda, unida aos brancos vivenciem conhecimentos e unam-se em prol de sucesso acadêmico.

Xirê de Rua: Um Ritual de Resistência e Celebração da Cultura Afro-Brasileira

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Foto: Sidney Reis

O espetáculo da CIA de Dança AfroOyá, dirigido por Tainara Cerqueira, traduz em movimento a ancestralidade, a luta e a espiritualidade da negritude brasileira.

Texto: Rodrigo França

O espetáculo Xirê de Rua, da CIA de Dança AfroOyá, é um marco na cena cultural contemporânea, destacando-se pela maneira como celebra a ancestralidade africana enquanto reflete sobre a resistência negra e a luta pela liberdade. Sob a direção e coreografia de Tainara Cerqueira, a obra é uma experiência visual, sonora e emocional que resgata as raízes de um povo, traduzindo-as em linguagem artística vibrante e atual. Realizado em oito quadros, o espetáculo explora a força da coletividade, evocando a espiritualidade e a resiliência da negritude brasileira, especialmente nos contextos urbanos onde essas histórias de resistência continuam a pulsar.

O título do espetáculo, Xirê de Rua, remete ao termo iorubá “xirê”, que simboliza a roda de celebração e dança em homenagem aos orixás. É justamente essa circularidade — tanto nos movimentos quanto na narrativa — que dá vida à performance. Dividido em quadros como Cortejo, Ramunha dos Imigrantes e Resistir para Existir!, o espetáculo aborda temas que atravessam séculos: desde a migração forçada dos povos africanos até a adaptação às grandes metrópoles brasileiras, com destaque para a luta cotidiana por liberdade e dignidade. Tainara, ela própria uma migrante nordestina em São Paulo, utiliza sua experiência pessoal e coletiva como inspiração para construir uma narrativa política e artística que ressoa tanto nos palcos quanto na memória dos espectadores.

Xirê de Rua (Foto: Sidney Reis)

Tainara Cerqueira tem se destacado como diretora de movimento em diversas produções teatrais, como “Pequeno Manual Antirracista”, o musical “Rita Lee” e espetáculos da cantora Larissa Luz. Sua atuação enriquece as montagens com uma linguagem corporal que dialoga profundamente com as temáticas abordadas. Em 2024, Tainara integrou o coletivo Aquilombamento Ficha Preta, contribuindo como diretora de movimento em peças como “JORGE pra sempre VERÃO” e “Angu”. Seu caminhar para a direção teatral, com projetos previstos para o próximo ano, representa um avanço significativo na representatividade de mulheres negras no teatro e no cinema brasileiro, fortalecendo a diversidade e a inclusão nessas artes.

Os bailarinos e bailarinas de Xirê de Rua merecem destaque pela entrega cênica e técnica impecável. David Sena, Bruno Conceição, Rafa Leal, Lisa Gouveia, Magnata, Maiwsi Ayana, Munique Costa, Victoria Fonseca, Drama Original, Safira Sacramento e Guinho Araújo formam um grupo diverso e coeso, que enriquece o espetáculo com suas singularidades. Cada artista imprime em cena a intensidade de suas vivências e o domínio dos variados estilos de dança apresentados — do samba reggae ao maculelê, passando pela capoeira e pela dança dos orixás. O elenco não apenas dança; eles contam histórias, evocam memórias e, sobretudo, criam um espaço de encontro entre o público e a essência da cultura afro-brasileira.

A coreógrafa Tainara Cerqueira é o coração pulsante deste trabalho. Sua abordagem vai além da técnica; é um ato de resistência cultural e uma ode à ancestralidade. Formada no Centro Cultural Quilombolas de Luz, Tainara tem uma conexão profunda com a dança afro-brasileira e sua capacidade de transformar vidas. Sua formação pelos renomados mestres como Zebrinha, Nildinha Fonseca e o capoeirista Contramestre Gugu Quilombola enriquece ainda mais sua prática artística, fazendo de Xirê de Rua um espetáculo carregado de autenticidade e sofisticação. É notável como sua visão dialoga com o passado sem perder de vista o presente e, principalmente, o futuro. Tainara demonstra que a dança é mais do que movimento; é uma forma de resistir, construir e curar.

Xirê de Rua (Foto: Sidney Reis)

A contribuição musical de Xirê de Rua é outro ponto alto. A percussão, comandada por Xorão Trinda, Priscila Borges, Gui Assis e Kidsan, dialoga perfeitamente com as vozes impactantes de Jéssica Américo e Theodoro Nago, criando uma atmosfera de celebração e reverência. Esses elementos, somados à cenografia de Ogbá e aos figurinos de Maiwsi Ayana, resultam em uma obra multidimensional que é ao mesmo tempo espetáculo e ritual. A iluminação assinada por Renato Banti valoriza cada quadro com maestria, transformando o palco em um espaço de transcendência.

Priscila Borges, mestra na dança afro-brasileira e cofundadora da CIA de Dança AfroOyá, é uma força criativa indispensável para o sucesso de Xirê de Rua. Sua atuação como assistente de coreografia e diretora de produção reflete sua profunda conexão com a ancestralidade africana e sua habilidade excepcional de transformar movimentos em narrativas poderosas. Com uma trajetória marcada por rigor técnico e sensibilidade artística, Priscila traz ao espetáculo uma energia vibrante e um olhar refinado, que ampliam a complexidade e a beleza da obra. Sua parceria com Tainara Cerqueira é a união perfeita de talentos complementares, resultando em um trabalho que é, ao mesmo tempo, uma celebração das raízes afro-brasileiras e uma afirmação de sua relevância contemporânea.

Xirê de Rua é mais do que uma peça de dança; é um manifesto. Com sua proposta de unir arte e política, o espetáculo reafirma a relevância das tradições afro-brasileiras em um mundo onde a luta pela igualdade ainda é urgente. A CIA AfroOyá, sob a liderança de Tainara Cerqueira, consolida-se como uma das mais importantes companhias de dança do país, abrindo caminho para novas narrativas e representações. Assistir a Xirê de Rua não é apenas apreciar um espetáculo excepcional; é também compreender que a arte pode ser um poderoso instrumento de transformação e resistência.

Xirê de Rua (Foto: Sidney Reis)

Assisti ao espetáculo no Sesc Santana e foi uma experiência inesquecível. Recomendo que todos fiquem atentos, pois a CIA de Dança AfroOyá está sempre surpreendendo com novos trabalhos, e Xirê de Rua é uma joia em seu vasto repertório. Aproveito para enaltecer o Sesc São Paulo, que cumpre um papel fundamental ao valorizar e abraçar a dança brasileira em sua diversidade. Que em 2025 possamos ver a CIA AfroOyá em temporadas por todo o país, conquistando ainda mais palcos e, quem sabe, levando sua arte poderosa para o cenário internacional.

“Muito bom para eu lembrar de onde eu vim”, diz Belo sobre gravar a série que conta sua trajetória

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Foto: Ique Esteves

‘Belo, Perto Demais da Luz’, a nova série documental Original Globoplay, em parceria com o AfroReggae Audiovisual, estreou nesta quinta-feira (28). A produção conta a trajetória do cantor e relembra momentos emblemáticos na vida de Marcelo Pires, seu nome de registro.

“Se eu falar que foi fácil reviver algumas situações, estaria mentindo. Mas foi muito bom para eu lembrar de onde eu vim, resgatar algumas memórias e poder mostrar para o público o Marcelo”, analisa o artista sobre as gravações.

Na entrevista para a Globo, Belo também conta se algum momento dessa experiência mais lhe impactou ou emocionou. “Todos foram especiais, me tocaram em lugares únicos e íntimos”, descreve.

Ele também falou sobre como ele lida com a exposição pública de seu relacionamento com a Gracyanne Barbosa e a forma que ele foi abordado no documentário. “Ser uma figura pública tem dessas coisas, tive altos e baixos nos meus relacionamentos, mas vivi todos eles intensamente. E, cada pessoa que passou na minha vida, tem uma importância”

Com produção de José Junior, direção artística de Jorge Espírito Santo e roteiro e direção de Gustavo Gomes, a série reúne imagens de arquivo da carreira do músico e do Soweto, depoimentos de participações especiais e hits consagrados entre gerações.

Leia a entrevista abaixo:

Belo, como você avalia a iniciativa da produção de um documentário sobre a sua trajetória?

Eu fico feliz demais. Por tudo o que construí até aqui, por trazer na minha bagagem de vida tantas histórias, que mesmo não sendo todas positivas, serviram para eu me tornar o cara que sou hoje.

Como foi para você participar das gravações de ‘Belo, Perto Demais da Luz’?

Se eu falar que foi fácil reviver algumas situações, estaria mentindo. Mas foi muito bom para eu lembrar de onde eu vim, resgatar algumas memórias e poder mostrar para o público o Marcelo.

Durante as gravações do documentário, qual foi o momento mais emocionante ou marcante?

Todos foram especiais, me tocaram em lugares únicos e íntimos.

Como você lida com a exposição pública do seu relacionamento e como ele foi abordado no documentário?

Ser uma figura pública tem dessas coisas, tive altos e baixos nos meus relacionamentos, mas vivi todos eles intensamente. E, cada pessoa que passou na minha vida, tem uma importância.

O que você gostaria que as pessoas soubessem sobre o verdadeiro Belo?

Que eu sou de carne e osso, erro e acerto como todos na vida e sou feliz por quem sou e por onde cheguei. Ainda falta muito para conquistar, mas eu agradeço todos os dias a Deus por me permitir viver cada momento.

Como você descreve o Belo? E o Marcelo Pires?

Depois de tanto tempo sendo o Belo, hoje somos um só. rs

Além do documentário, que estreia hoje no Globoplay, recentemente, o público pode ver outra faceta sua na plataforma. Atuando na terceira temporada de ‘Arcanjo Renegado’, já disponível completa no streaming da Globo. Conte um pouco como foi a sua preparação e experiência de interpretar o inspetor Silvio.

Foi diferente e muito enriquecedora. Eu sou apaixonado pela arte em todas as suas formas, e poder interpretar o Silvio, ter tido essa confiança da equipe e dos atores envolvidos, foi incrível.

Império Kush: Após sucesso no Barra Shopping, “tia das quentinhas” inaugura restaurante no centro do Rio de Janeiro

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De quentinhas vendidas na rua para um restaurante em shopping e, agora, um espaço próprio no centro do Rio de Janeiro. Há mais de 25 anos, Dona Ednair Paixão dedica sua vida à cozinha e à gastronomia. Desde a inauguração do Kush, a comida afro-brasileira tem sido o destaque do cardápio. Inspirada por sua tia, uma grande incentivadora, Dona Ednair superou diversos desafios para estabelecer seu restaurante em locais de alto custo. “Se soubessem que era aquela camelô da porta do BarraShopping querendo alugar uma loja lá dentro, vocês acham que iam deixar?” – reflete, sobre a transformação de quem começou vendendo quentinhas para proprietária de um restaurante em um dos maiores shoppings do Rio.

Agora, ela e sua família dão mais um passo importante com a inauguração do segundo restaurante, um espaço próprio no centro da cidade. “A loja do BarraShopping foi fundamental para que empreendêssemos de forma mais comercial e padronizada, enquanto caminhávamos em direção ao futuro ancestral que buscamos. Lá, tivemos nossa primeira experiência com apresentações de pratos, atendimento profissional e um novo formato de gestão”, explica Karol Paixão fundadora e administradora do Império Kush.

O novo espaço no centro promete ser um celeiro de criatividade, unindo gastronomia e arte. Com uma programação cultural diversificada, celebra a rica história e tradição africana. “Aprendemos no BarraShopping a nos posicionar de forma mais saudável no mercado, interagindo comercialmente com outras empresas. Agora, no centro, seguimos com essa visão, como no caso da Tendência Black, que expõe suas roupas no terceiro andar e foi responsável pelos uniformes da nossa equipe”, ressalta Karol.

O Império Kush tem como missão gerar impacto social positivo, valorizando a cultura africana e a gastronomia local. “Em breve, lançaremos um programa de intercâmbio entre chefs africanos e brasileiros, oferecendo aos nossos clientes uma experiência ainda mais rica em sabores e técnicas culinárias”, adianta a fundadora.

Um cardápio especial no centro

O cardápio do novo espaço é uma experiência totalmente diferente da unidade do shopping. O restaurante maior, com uma cozinha mais equipada, possibilita uma oferta mais diversificada. A equipe de chefs é liderada por Rafael Coutinho, treinado por Dona Ednair, com ampla expertise na gastronomia africana. Raul Joaquim traz os sabores autênticos de Angola, enquanto Fábio Dasa, especialista em alta gastronomia, adiciona sofisticação aos pratos.

No menu, uma verdadeira jornada gastronômica pela culinária afro-brasileira. Entre as opções, estão o saboroso caril de camarão, o tradicional acarajé, o cremoso vatapá e o reconfortante baião de dois. Há ainda versões kids e veganas, garantindo opções para todos os paladares.

Serviço:
IMPÉRIO KUSH | Culinária Afro-brasileira
Instagram: @kushculinariaafrobrasileira

  • Unidade BarraShopping
  • Unidade Centro (nova):
    Rua Gonçalves Dias, 39, Rio de Janeiro, RJ.
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