Texto: Débora Simões

No segundo domingo de 2023, uma semana após a posse do presidente eleito democraticamente, milhares de bolsonaristas invadiram e depredaram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e a sede do Supremo Tribunal Federal. O ato começou com mobilização e caminhada e resultou na destruição de documentos, obras de artes e edifícios. Munidos do privilégio branco, eles fizeram o que quiseram e como quiseram e por que não foram impedidos? A resposta é este mesmo privilégio branco. Além do contingente reduzido de policiais, a maioria dos que ali estavam foram flagrados em ações complacentes com os terroristas. Sim. Você leu certo, terrorista. Posso justificar o uso do termo. De acordo com a ONU, terrorismo é definido como “ato com motivação política ou religiosa, que emprega força ou violência física ou psicológica, para infundir terror, intimidando ou coagindo as instituições nacionais, a população ou um segmento da sociedade”. O bolsonarismo agiu, neste domingo, de forma organizada e violenta contra a sociedade brasileira que elegeu um presidente da república. 

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Não é possível compreender os atos de terrorismo que ocorreram em Brasília sem voltarmos, ao menos, ao processo de impeachment da época (2016) presidente Dilma Rousseff, mais especificamente para entender o bolsonarismo e sua presença nas instituições políticas e nas ruas. Na votação que levou a retirada da Dilma do poder, multiplicaram-se discursos que valorizam a pátria, Deus e a família em nome de uma certa ordem e um certo progresso. Um deputado entre tantos outros disse o seguinte: “Nesse dia de glória para o povo brasileiro, tem um nome que entrará para história nessa data, pela forma como conduziu os trabalhos nessa casa. Parabéns, presidente Eduardo Cunha! Perderam em 1964. Perderam agora em 2016. Pela família e pela inocência das crianças em sala de aula que o PT nunca teve. Contra o comunismo! Pela nossa liberdade! Contra o Foro de São Paulo! Pela memória do Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff! Pelo Exército de Caxias! Pelas nossas Forças Armadas! Por um Brasil acima de tudo e por Deus acima de todos, o meu voto é sim!”. Diversas agências de direitos humanos, nacionais e internacionais, repudiaram, principalmente pela exaltação à memória de um coronel que torturou e matou durante a Ditadura Civil-Militar no Brasil. Por esse discurso de ódio o deputado não foi punido e por nenhum outro que o mesmo continuou proferindo, tanta na campanha eleitoral e após ser eleito presidente do Brasil. Não só ele não foi punido, como ganhou da população brasileira o cargo de chefe do executivo. 

Bolsonaristas invadindo o Palácio do Planalto, em Brasília. Foto: AFP.

Os crimes contra a sociedade e ao patrimônio que ocorreram em Brasília são resultados da ascensão de um movimento centrado na aniquilação da oposição e manutenção da ordem, uma ordem específica: branca, masculina e rica. Para alcançar e manter essa tal ordem, a utilização da violência é o caminho que eles percorrem. As violações cometidas foram observadas pela Polícia Militar do Distrito Federal, parte dos agentes públicos em serviço conversaram, posaram para fotos, beberam água de coco enquanto criminosos destruíam, em nome da ordem, prédios públicos.  

Mas qual é a função da polícia? Segundo a Constituição Federal de 1988, é dever da Polícia Militar a manutenção da ordem pública, a preservação da vida dos cidadãos e do patrimônio. Falharam. Se para uns o crime e visto e não é feito para outros a pena é a morte, mesmo quando não há crime, ou o crime é nascer negro no Brasil?

No Rio de Janeiro, na última quinta-feira, dia 5 de janeiro de 2023. a  Polícia Militar matou  o catador de materiais recicláveis Dierson Gomes da Silva que estava no quintal da sua casa com um pedaço de madeira. O crime cometido por representantes do Estado aconteceu na Zona Oeste carioca, na Cidade de Deus, porque eles confundiram um pedaço de madeira com um fuzil. Poderia citar inúmeros casos semelhantes, de”confusões” cujo o resultado foi o assassinato de um sujeito negro. Desse modo o Estado controla o corpo do sujeito, seja para manter a vida de uns e promover a morte de outros. Aqui, o conceito necropolítica divulgado pelo filósofo camaronês Achille Mbembe nos ajuda a pensar os modos de regulação da sociedade capitalista neoliberal. Para Mbembe as instituições produzem a morte do sujeito negro. Para uns em Brasília o direito de destruição dos bens nacionais, para outros a extinção da vida apenas por portar um objeto de madeira. 

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