
Texto: Rodrigo França
Nas ruas de São Gonçalo, nasceu um menino que seria feito de ritmo e resistência. Criado entre o morro do Salgueiro e a Piedade, forjado no amor de uma mãe que soube ser rocha e de um pai que fez do tambor seu verbo, Mestre Markinhos (@mstmarkinhos) cresceu aprendendo que a vida se faz na cadência. Mas, no compasso de sua história, não bastava apenas tocar: era preciso afirmar-se, ser e existir com todo o brilho e força de quem carrega um legado e constrói outro.
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Desde pequeno, sua sina era o samba. Quando pegou o chocalho, instrumento que muitos viam com desdém, já enfrentava os primeiros olhares tortos. “Filho de mestre tem que ser surdo, repique, caixa!” – diziam, sem entender que a grandeza do ritmo está na soma de cada batida, no entrelaçar dos sons que constroem a festa e a fé de um povo. Markinhos fez do chocalho seu estandarte, mas não demorou para que as críticas mudassem de tom. Já não se tratava mais do instrumento, e sim do corpo que vestia sua verdade. Cabelo solto, salto alto, trejeitos que a sociedade insiste em tentar encaixar em normas invisíveis. Mas Markinhos nunca pediu licença para ser. Ele chegou, ocupou e brilhou.
Na bateria, o destino já estava traçado. A escola mirim foi a primeira avenida, mas foi ao lado do pai, Mestre Marcão, que ele aprendeu o rigor e a paixão de comandar um coração pulsante de ritmo. Tornou-se diretor de bateria ainda jovem e, desde então, não largou mais o bastão. Quem vê o Paraíso do Tuiuti ressoar pela Sapucaí sabe que ali há um mestre que rege com alma, com corpo, com entrega. E faz isso no salto – não apenas o de doze centímetros, mas o salto histórico de um menino que ousou ser diferente num espaço que tantas vezes rejeitou o que não se encaixa.

Mas Markinhos não é só carnaval. No dia a dia, o batuque se transforma em cuidado. No posto de saúde próximo de casa, ele é agente comunitário, escutando histórias, amparando vidas, sendo ponte entre a comunidade e a dignidade. Essa dualidade é sua marca: no asfalto, no morro, na avenida ou no consultório improvisado do SUS, ele sabe que sua missão é maior do que apenas tocar. Seu sonho não é só o de ver a bateria ecoando pelo mundo – é o de garantir que sua família esteja bem, que seu espaço esteja firmado, que sua presença seja um manifesto de liberdade.
Seus pés, que já pisaram ao lado de Madonna, seguem firmes no chão da sua ancestralidade. Markinhos carrega o axé dos seus, a força de sua mãe incansável, o legado de um pai resiliente, a proteção de uma tia que lhe deu lar. Suas referências são muitas: as irmãs, as sobrinhas, os ícones da música, da política, das lutas que ampliam caminhos para outros corpos e vozes.
E se há um legado que ele quer deixar, é esse: a certeza de que ele foi inteiro, sempre. Que não há por que pedir permissão para ser o que se é. Que ninguém tem o direito de decidir que versão de si mesmo merece existir. Markinhos rege uma bateria, mas também rege sua própria história. E quem ousar desviar o olhar, cedo ou tarde, vai precisar aplaudir.
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