Por João Torquato, Analista de Comunicação do Instituto Brasil-Israel, Ativista do Movimento Negro e Apresentador do Podcast “E eu com isso”.
Quando a gente fala em povo judeu ou sobre Israel, na maioria das vezes vem um estereótipo em nossa mente: um homem branco, religioso, que defende a militarização de sociedade e é de direita.
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Esse pensamento não surgiu à toa.Nos últimos anos, setores mais radicais da sociedade brasileira promoveram um sequestro de símbolos judaicos e da bandeira de Israel. Grupos criminosos que perseguem e destroem terreiros de religiões de matriz africana e, ao mesmo tempo, utilizam a estrela de Davi como símbolo ainda que não tenham qualquer relação de fato com o judaísmo.
O ex-presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, se dizia um amigo de Israel e fez uma fala escancaradamente racista dentro de um clube judaico no Rio Janeiro. E com certeza você já deve ter visto perfis de direita em alguma rede social com a bandeira de Israel no nome. Será que Israel e o povo judeu são tudo isso que a extrema direita revindica? Será que Israel é um país branco?
O povo judeu é um povo plural, com judeus de origem indiana, polonesa, chinesa, russa, etíope e de outros lugares do mundo. Os judeus Sefardim, que são aqueles provenientes do norte da África, península Ibérica e Oriente Médio (Mizrachim) , correspondem a 55% da população de Israel.E cerca de 2,2% da população Israelense é negra retinta, ou seja, ser judeu não tem nada a ver com ser branco.
Segundo o professor Michel Gherman, que ministra na UFRJ e pesquisa a utilização de símbolos judaicos por setores da extrema direita, “esses setores criaram uma Israel imaginária, para eles, Israel é uma vista como um elemento mais branco possível, onde apenas a Israel bíblica existe, eles têm um desprezo pelo Estado de Israel moderno e toda sua pluralidade”. Para a extrema direita pouco importa se Bolsonaro não tinha negros na equipe ministerial, enquanto Israel tinha uma ministra de imigração negra nascida na Etiópia durante o governo de Yair Lapid e Naftali Bennet. Eles só reivindicam elementos imaginários que dialogam com as pautas de seu interesse, criando uma Israel que não existe.
Dentro da sociedade israelense, a maioria dos judeus negros são de origem etíope, que mesmo em menor proporção, se encontram inseridos na sociedade em cargos de alto escalão, ocupando espaços de protagonismo na televisão.Mas, assim como no Brasil, eles são vítimas do racismo estrutural.
No continente africano, outros países além da etiópia têm judeus, como é o caso dos judeus Igbos na Nigéria, dos Abayudaya na Uganda ou dos Lemba na Tanzânia e Zimbabué. No Brasil, de acordo com o censo do IBGE (2010), temos quase 1.700 judeus negros, e é bem provavel que hoje esse número seja maior. Em Israel, o país chegou a ter nos anos 1970, um movimento dos panteras negras, ou HaPanterim HaShkhorim, em hebraico. O movimento era inspirado nos panteras negras dos Estados Unidos, os panteras negras israelesenses foi criado por judeus do norte da África e do Oriente Médio para lutar contra a discriminação racial no país.
Falar sobre os judeus negros vai além de combater essa narrativa imaginária da extrema direita: é divulgar a pluralidade das formas que a negritude pode ser manifestada. Para mim, como negro e judeu, o judaísmo também é uma forma de manifestar minha negritude, quando lembro do Sigd, um feriado observado pelos judeus da etiópia, ou quando eu coloco a minha kipá (solideu) feita pelos judeus de Uganda. Ser judeu para mim também é ser negro.
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