Ao final de todo ano, já é um ritual refletir sobre tudo aquilo que foi feito durante o ano que está prestes a terminar. Pensamos nas metas estabelecidas no início do ano, e nas conquistas que obtivemos ao longo dele. Quando você é uma pessoa negra, as festas de final de ano nem sempre despertam um sentimento bom. O peso sobre conquistas materiais é mais pesado para pessoas que ainda estão na luta para obter o básico.
Por isso esta época do ano pode ser um tanto quanto depressiva, pois tendemos a nos frustrar por não termos alcançado bens materiais que validariam um ano bom. Ter um diploma, um bom emprego, um carro, casa própria, um relacionamento estável. Tudo isso é colocado como medida de sucesso. Para pessoas negras, as metas são iguais, mas as oportunidades não. Por isso nossos caminhos são mais longos e os processos mais demorados.
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Além do mais, o que pode parecer “pequenas conquistas” para outras pessoas, para nós não é. Chegar a um fim de ano com saúde, ter a família por perto, estar mais emocionalmente estável no Brasil não é pouca coisa. Em um país que nos extermina diariamente, que leva muitos dos nossos ao suicídio, que nos nega emprego, todas as nossas “pequenas conquistas” devem ser comemoradas. Uma vez uma moça negra me disse que estava feliz, porque tinha comprado seu primeiro computador, isso em 2022. Obviamente, queremos ter casa, uma boa renda, carro, viver e não sobreviver.
Mas nosso caminho até estas coisas é estreito e cheio de espinhos justamente por vivermos em uma sociedade estruturalmente racista. Diferente das pessoas brancas, não conseguimos transformar a autoestima em uma vantagem para acessar bens materiais. Por isso, demoramos mais para adquirir uma confiança que nos possibilita dar passos maiores rumo ao que desejamos. É como dizem: sempre que chegamos à reta final, eles mudam a largada.
Aqui não quero dizer que devemos nos contentar com esta realidade, nem que ela é imutável. Mas sim de que a mudança é gradual, o caminho é longo e quando a gente chega temos a possibilidade de estender a mão para quem ainda não chegou. Podemos ajudar nossa família, amigos. Mas para isso a gente precisa estar bem para percorrer este caminho que, muitas vezes, é cansativo e desanimador. Neste fim de ano, não pense no que você poderia ter feito, ou no que deixou de fazer.
Pense no que você fez, naquela atitude que parece pequena, mas que vai ajudar a tornar o chão do caminho que você pisa mais sólido. Que neste final de ano, a gente não se cobre tanto por coisas que, muitas vezes e infelizmente, demoram mais para acontecer pra gente. Que possamos focar no que fizemos, e mesmo que pareça pouco diante de tamanha exigência que é colocada sobre nós, sabemos o valor e a satisfação dessas pequenas grandes conquistas.
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