Devemos ignorar as atitudes erradas dentro da comunidade negra?

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Devemos ignorar as atitudes erradas dentro da comunidade negra?
Foto: Freepik

Texto: Ricardo Corrêa

A vida era mais fácil quando eu sentia que podia confiar mais em uma pessoa negra do que em uma pessoa branca. Enfrentar a realidade de que isso simplesmente não é assim é uma maneira muito mais difícil de viver no mundo.

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   − bell hooks

Não importa qual o papel que a pessoa negra tenha na sociedade e o tamanho da sua influência no debate público, se teve comportamento problemático não podemos isentá-la de críticas. Essa deve ser a premissa para que consigamos evoluir como uma comunidade em permanente busca de coesão e radicalidade na luta por direitos interditados pelo racismo. Que se abra uma ampla discussão entre o povo negro em todos os lugares. Alguns ativistas e militantes dirão “mas as redes sociais não são o espaço certo para as críticas internas”. E eu respondo: qual é o lugar mais adequado já que somos uma enorme massa espalhada geograficamente? Ou devemos deixar “meia dúzia” de negros discutindo em algum clubinho aquilo que afeta a todos nós? Mesmo com todos os obstáculos existentes, as redes sociais são um espaço abundante de diferentes compreensões e possibilitam que possamos refletir e difundir as pautas em outros lugares. A partir das redes sociais, o debate pode ir parar no transporte público, no trabalho, nas escolas e universidades, nas organizações e movimentos sociais, na roda de amigos, e estimulam a produção de textos e reportagens, etc. 

Basta de acharmos que por ser negro é preciso ponderação na crítica ou “deixa quieto”, ou que estamos nos afastando em vez de nos unirmos. Eu sou daqueles defensores de uma conversa dura, na mesma medida do problema colocado. E de nada servirá unirmos com quem não é compromissado e age de maneira que ajuda os brancos na manutenção dos privilégios. Como lutaremos seriamente contra o racismo se ignoramos comportamentos condenáveis? Principalmente quando se trata  de negros considerados influenciadores e representantes dos movimentos negros. Não podemos ser seletivos nas críticas. Isso contamina outros irmãos e irmãs que estão no processo de amadurecimento da própria consciência racial; precisamos de bons exemplos para que eles percebam a “necessidade de juntar forças com seus irmãos em torno da causa de sua atuação – a negritude de sua pele – e de agir como um grupo, a fim de se libertarem das correntes que os prendem em uma servidão perpétua” como escreveu o revolucionário sul-africano Steve Biko. Lembre-se que o racismo se fortalece utilizando estereótipos, atribuídos a todos os negros, como se fosse da nossa natureza certas atitudes negativas. Ou seja, as atitudes individuais refletem em todos nós; combater o racismo é desconstruir esse julgamento que nos coloca em um lugar comum. 

E não é estranho ou motivo de surpresas que tenhamos tantos problemas, visto que o racismo atravessa cotidianamente a nossa sobrevivência e conforma a maneira com que vemos e agimos no mundo. Somos autênticos produtos da violência racial distribuída em distintas camadas na sociedade. Espero uma densa coalizão entre os diversos movimentos negros para enfrentarmos o inimigo comum, entretanto, nunca negligenciando aqueles que estão tumultuando e “queimando” a comunidade; do tipo, pessoas negras usando o debate do colorismo – não seriamente – só para nos fragmentar, outros defendendo amor negro e na prática agindo de maneira contraditória, negros defendendo orientações políticas que produzem miséria, fome, assassinatos e encarceramento do nosso povo, negros aliando-se aos brancos para nos atacarem, negros ocupando-se com atividades que visam lucrar e ganhar visibilidade em cima das nossas dores, entre outras situações. Diante disso, consideremos que errado é errado, não importa quem praticou a ação, como ensinou o revolucionário Malcolm X. No entanto, critiquemos de maneira construtiva sem buscar o “cancelamento”. Já bastam os julgamentos precipitados e irreflexivos que os racistas fazem todos os dias. E nunca reproduza o racismo para cima de quem vacilou, caso contrário, o criticado será você.

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