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O Coletivo Mulheres Pretas do Chocolate surgiu em 2021 como uma estratégia de unir mulheres pretas que trabalham com chocolates na Bahia, Rio de Janeiro e Pará. Suas criadoras Pat Nicolau (da Nicolau Chocolates) e Mailan Santos (do Chocolate da Mata) se perceberam como únicas mulheres negras num grupo de aproximadamente 200 mulheres que trabalharam com chocolates no Brasil e deram o pontapé inicial nessa proposta focada no Slow Food.
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O Slow Food é uma perspectiva na gastronomia que valoriza a sustentabilidade e a cadeia produtiva. Em resumo, não basta apenas ser uma comida gostosa e bonita – os ingredientes utilizados devem ser produzidos respeitando todos os envolvidos na cadeia produtiva (as pessoas e o meio ambiente). Se você quiser compreender um pouco mais sobre essa perspectiva, te convido a ler o meu livro ‘Gastronomia, Cerveja Artesanal e Slow Food: ideias de negócios sustentáveis’, publicado em 2020 pela Editora CRV.
Nessa pegada do Slow Food, 23 associadas do Coletivo Mulheres Pretas do Chocolate produzem artesanalmente seus produtos e os disponibilizam para a venda. São chocolates agroecológicos, que respeitam as pessoas e o meio ambiente. A técnica de fermentação de amêndoas do cacau foi gentilmente liberada para uso do coletivo por Albertus Eskes – um dos maiores geneticistas de cacau do mundo. Essa técnica do pesquisador tem como principal característica a retirada o amargor do cacau, trazendo sabores frutados com notas aromáticas diferenciadas.
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E com esse olhar sustentável e agroecológico na produção de chocolates era de se esperar que todas a associadas estivessem vendendo muitos chocolates e sem capacidade operacional para aceitar novos pedidos. Mas não é isso que acontece especificamente com Pat Nicolau no Rio de Janeiro. O buraco é bem mais embaixo e a criadora do coletivo, desabafa sobre as dificuldades de ser uma mulher preta empreendendo na Gastronomia:
“Eu faço chocolate há anos e tenho muitas dificuldades em ser reconhecida pelo que faço. Precisei ser notícia no Instagram de um jornalista de gastronomia para que colegas quisessem entender o que eu proponho. Eu sempre expliquei com carinho, mas eles nunca quiseram compreender. Precisou de um jornalista reconhecido escrever sobre a experiência que criei – 12 Desejos do Cacau – para que as pessoas dissessem que agora compreendiam minha proposta.”
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No interior do Rio de Janeiro (Macaé), Pat tentou empreender oferecendo a amigos de universidade, empresários e pessoas influentes na gastronomia seus chocolates produzidos à luz da perspectiva do Slow Food. Investiu mais de R$ 2.000,00 em degustações e pré-teste de eventos. Leitor(a), sabem quantos contratos ela fechou? Nenhum. E ela sabe o porquê disso: uma mulher preta vendendo chocolate de altíssima qualidade não deveria estar nesse mercado. Sim, a gastronomia é eurocêntrica e ela sentiu na pele esse contexto no interior do estado e na capital. Segundo a empreendedora, tem gente preta influente que diz que é linda a ideia, mas não ajuda a abrir uma porta sequer.
E uma das situações concretizou o entendimento da criadora do Coletivo Mulheres Pretas do Chocolate sobre a incoerência de ação de alguns consumidores sobre o que eles falam e como eles agem tem relação com uma experiência vivida num shopping: a mesma amiga que disse procurar chocolates agroecológicos há anos e elogiou Pat pela iniciativa, foi a mesma que saiu de uma loja de chocolates finos com mercadorias.
O discurso é lindo, né gente!? Mas na prática essas mulheres precisam não apenas serem vistas, mas consideradas como produtoras e vendedoras de chocolates de altíssima qualidade. A minha parte eu já fiz – que foi contar essa história. Agora conto com vocês de fazer esses sonhos de 23 mulheres pretas acontecerem!
Axé.
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