Parece óbvio o que eu vou dizer aqui, mas depois de observar alguns acontecimentos vem ficando cada vez mais clara a não obviedade do assunto… É importante reafirmar o que é o antirracismo e por que essa luta não é para ser algo confortável para pessoas brancas.

Antes de mais nada, é importante entender que se declarar antirracista e efetivamente ser antirracista são coisas distintas. Em uma sociedade onde dizer que é algo não necessariamente indica comprometimento e ações, as pessoas sentem-se cada vez mais confortáveis para se apegarem a adjetivos por interesses individuais.

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Ser antirracista vai muito além de não ser racista ou, como alguns brancos costumam falar, vai muito além de ser uma pessoa “boa”. Isso faz parte da sua obrigação moral enquanto pessoa comprometida a conviver em sociedade.

Não discriminar pessoas ou grupos pela cor de sua pele ou classe social fazem parte do conjuntinho de regras básicas de convivência em sociedade e, apesar de vivermos em uma sociedade onde o básico ainda não é respeitado, isso se mantém.

Ser antirracista envolve muito mais do que o básico e muitas pessoas brancas acabam por confundir isso. Quando confrontadas com essa realidade, o incômodo surge e é quando precisamos reafirmar que ser antirracista não é confortável.

Não é confortável ser contra o sistema. Em uma sociedade racista a estrutura e as condições de existência se baseiam no racismo e fica cada vez mais claro que uma estrutura como a capitalista tem como base a hierarquização de grupos com base em classe e, inevitavelmente, em raça.

Não é confortável se entender como parte do problema e se compreender como tal não tem a ver, necessariamente, com você ou com a sua imagem e sim com o comprometimento antirracista.

Afinal, você é antirracista por compreender o quão nocivo é existir um sistema de hierarquização social baseado em classe e raça ou por desejar algum tipo de elevação espiritual por abraçar causas sociais?

Compreender o seu lugar na luta antirracista não tem a ver, necessariamente, com a sua evolução pessoal e sim o comprometimento com a luta. É extremamente importante se entender como parte de um grupo e parar de se considerar evoluído moralmente por se interessar e lutar por direitos para outros grupos. Não é sobre você.

Ouvir isso costuma gerar incômodo e esse incômodo geralmente é a barreira que os fazem desistir.

Aparentemente pessoas brancas esperam conforto, aprovação e reconhecimento por fazerem parte da luta antirracista, como se fazer parte dela exigisse uma recompensa.

Por esse motivo, quando o tapa na cara acontece, quando entregamos a crítica mais pesada ao referido grupo o atinge, apelam para sentimentalismo barato. Como qualquer racista, nos empurram para a caixinha do radicalismo, mas não no bom sentido da palavra e sim no sentido da irracionalidade desumanizadora.

Ser antirracista está longe de servir como um título para brancos se sentirem confortáveis. Esse comportamento é, inclusive, um dos primeiros indícios de que você não é.

Ser antirracista não tem a ver com seu ego, sua imagem ou a sua constante preocupação em não parecer uma pessoa ruim. Ser antirracista vai muito além de você se preocupar com como as pessoas enxergam você.

Eu entendo quão difícil é para pessoas brancas não serem parabenizadas por fazerem o mínimo, afinal as coisas foram assim durante toda a vida de vocês, e ao invés de “meus parabéns” vocês irão encontrar críticas a comportamentos sociais que vocês possuem e todas as contradições serão apontadas.

Esperar que pessoas negras “peguem leve” contigo em uma discussão sobre a luta antirracista é, de certa forma, um dos motivos pelo qual vocês costumam mais atrapalhar do que ajudar.

Eu vejo muita importância no alinhamento entre negros e brancos na prática antirracista, mas é contraproducente ter que parar toda nossa movimentação para ter que explicar o porquê de seu chilique com o desconforto ser uma enorme pedra no caminho de pessoas que precisam discutir sobre condições mínimas para sobreviver, violência, genocídio e apagamento social.

Notem, o antirracismo virtual tem se tornado cada vez mais sobre brancos serem integrados do que sobre como avançar nas demandas que a luta antirracista exige. Temos falado mais sobre atitudes de brancos do que sobre o genocídio da população preta e periférica.

Tudo o que temos feito, infelizmente, precisa girar em torno da empatia branca seletiva que, mesmo ao se declarar antirracista, não parece ter interesse no mínimo e nos faz ter que lutar pelo protagonismo da nossa própria luta por existência e resistência. Esses anseios egoístas por evolução moral e imagem social nos atrapalham e fazem com que textos como esse sejam necessários…

Antirracismo não é para ser confortável e lidar com isso, caro amigo branco, irá nos ajudar a avançar de forma mais saudável nessa discussão. Ao invés de esperar conforto na luta antirracista espere ter que enfrentar o sistema, reconhecer privilégios, confrontar os comportamentos sociais nocivos que seu grupo promove e treinar um olhar cauteloso a uma condição de sociedade que faz com que você seja privilegiado a ponto de se incomodar com uma crítica mesmo sabendo que é parte central do problema.

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