Psicóloga orienta sobre medidas que ajudam nos cuidados com a saúde mental, em especial de pessoas negras
Quantas vezes você priorizou sua saúde mental? Muitas pessoas, em especial àquelas que estão mais acostumadas a cuidar, possuem dificuldades de se colocar no centro dos cuidados, principalmente quando esses são relativos à saúde mental. A rotina atribulada pode fazer com que deixemos de lado o assunto, chegando a momentos extremos para dar a devida atenção a ele.
Notícias Relacionadas
Dia do Psicólogo: Conheça perfis de profissionais que ajudam a entender a importância de cuidar da saúde mental
Amanda Souza fala sobre ter parado de usar sutiãs: “O meu corpo é livre”
Mas com tantas campanhas importantes sobre o tema, em especial o Setembro Amarelo, podemos jogar luz às informações que ajudam não só a apagar incêndios, mas que possam colaborar para que tenhamos mais saúde mental dentro da nossa rotina.
Em conversa com Marleide Soares, psicoterapeuta, supervisora clínica e institucional, com enfoque antirracista, falamos sobre como é fundamental que pessoas negras olhem para suas questões emocionais e que consigam cuidar da saúde mental.
Quais medidas podemos adotar na nossa rotina que ajudam a manter a mente saudável? Isso é possível?
Eu poderia listar aquilo que é básico para uma vida adequada: alimentação, cuidados com a saúde global, lazer ou consumo de cultura e arte. Mas, isso não é o suficiente para evitar o adoecimento emocional e mental.
Para isso, também se faz necessário sempre atentar-se aos próprios sentimentos e as emoções cotidianas, pois são elas que afetam positiva ou negativamente a nossa saúde mental. Entender como determinada pessoa ou situação interfere no bem estar emocional e a forma como se absorve isso é o que determina o equilíbrio e previne uma sobrecarga emocional. Isso é possível? É sim. Olhe e respeite o que sente, dialogue e encaminhe no objetivo de que aconteçam as mudanças daquilo que desequilibra, ainda que a mudança não seja de imediato como gostaria.
Pensando na maioria da população, que acorda cedo e tem pouco tempo ou dinheiro, como cuidar da saúde mental mesmo com limitações?
O cuidado com a saúde mental começa com a identificação dos fatores que desencadeiam o desequilíbrio emocional e que tiram a pessoa do seu eixo de bem-estar, para que possa seguir no dia a dia sem grandes impactos no seu estado psicológico. A identificação pode ser feita no momento da locomoção para os compromissos diários ou na hora banho, por exemplo, se o fator for o tempo escasso. Se não possuir recursos financeiros para cuidar da saúde mental e, considerando que saúde é um direito de todas as pessoas, e que o Estado tem por dever a promoção do acesso, busque as Unidades de Saúde e já tenha consigo a compreensão de que cuidar da saúde mental é igual a cuidar de outras áreas de sua saúde, para tanto, recorra a esse direito. Mas, se nos referimos à prevenção de doenças mentais, procure espaços públicos de convivência social que promovam lazer, arte, cultura e sobretudo o importante sentimento de ser pertencente a um grupo e que sua vida faz mais sentido junto as outras pessoas.
Sabemos que o racismo afeta a saúde mental. Mas existe uma forma de estarmos psicologicamente preparados para lidar com possíveis situações racistas? Como é possível trabalhar essa questão do ponto de vista da psicologia?
Sim, já está amplamente divulgado para a sociedade o quanto o racismo adoece as pessoas atingidas por esta violência, seja de maneira direta ou indireta como nos casos das pessoas inseridas em relações interraciais e que tenham consciência e letramento racial. Há ainda uma grande parcela da população que nega a existência do racismo e das consequências deste, porém ainda assim existem prejuízos nas relações sociais que desembocam em consequências psicológicas ruins.
Dizer-se preparado psicologicamente para o enfrentamento de agressões e situações do racismo é uma resposta bastante relativa que depende do nível e do ineditismo da agressão. Sendo algo acima do esperado ou previsto e que não se tenha estrutura emocional para suportar, estamos diante de um fator traumático, me oriento pela teoria psicanalítica de Masud Khan e faço um paralelo de que as pequenas agressões do cotidiano, são como microtraumas cumulativos. Sendo assim, podemos nos preparar para as situações previstas no contexto do racismo estrutural, e esse preparo vem da autoconsciência racial, com um letramento racial sempre em construção e sobretudo com o autoconhecimento, fator este do qual a psicoterapia pode auxiliar muito. Com relação aos casos inesperados, não há controle, porém toda base já construída fornece um subsídio psicológico e principalmente político para lidar com a situação. Ressalto que consciência política e letramento racial não são adquiridos apenas e exclusivamente nos espaços acadêmicos. Não me refiro à letra que vem só por meio dos livros, e sim à que vem principalmente por meio de discussões em qualquer lugar em que duas ou mais pessoas estejam reunidas para falar sobre racismo, seja na escola das nossas crianças, no trabalho de nossas filhas, filhos e filhes jovens, no nosso trabalho ou na comunidade em que vivemos!
A psicologia é uma aliada fundamental para cuidar dos efeitos altamente nocivos do racismo na vida das pessoas, uma vez que afeta primeiramente a subjetividade e o sentimento existencial, que imprime na pessoa atingida o sentimento do não-ser existencial, do não se sentir pessoa como são todas as outras. Por ser a psicologia uma ciência que tem como premissa básica o entendimento da mente e comportamento humano e a relação destes com o ambiente externo no âmbito físico e emocional, é um dever profissional atentar-se às consequências do racismo e trabalhar considerando este importante fator. No Código de Ética do profissional de psicologia, consta como princípio básico que “O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Mais uma vez é reforçado o quanto todas/os/es profissionais da psicologia precisam trabalhar estas questões, tendo como principal ferramenta o conhecimento sobre o racismo na vida das pessoas e, ao prestar serviço a uma pessoa, sendo ela de um grupo racial ou étnico vulnerável ao racismo, atente-se ao quanto ela é afetada, ainda que nem mesmo essa pessoa tenha consciência disto.
A terapia pode ser adotada como um cuidado preventivo para o desenvolvimento de doenças que afetam a saúde mental, como a depressão?
Sim, a psicoterapia é um excelente recurso preventivo a qualquer doença mental incluindo a depressão, que uma vez diagnosticada deve ser tratada com medicamentos e tendo a psicoterapia como forte aliada. É na psicoterapia que as pessoas têm a preciosa oportunidade de ter a consciência dos fatores, lugares e pessoas que afetam sua saúde mental, e também de se perceberem como sujeito de sua própria história, assim como a forma como deve lidar nas relações sociais e intrapessoais (relação consigo mesma).
Notícias Recentes
‘O Auto da Compadecida 2’: Um presente de Natal para os fãs, com a essência do clássico nos cinemas
Leci Brandão celebra 80 anos e cinco décadas de samba em programa especial da TV Brasil