Texto: Bruno Calixto
Há muito mais em comum entre os chefs cariocas Vanessa Rocha e Danilo Parah do que o CEP onde eles cozinham: a ensolarada Ipanema, na zona Sul do Rio. Tem a ver com arte, inteligência, ancestralidade e compromisso com a essência do Brasil.
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Vanessa Rocha é dona de um sorriso generoso, um talento irretocável para elaborar pratos com receitas brasileiras e da cozinha do Maria e o Boi, que completou dez anos. É dela o menu 100% Brasil da casa em Ipanema, habilidade que herdou dos dois avôs: um cozinheiro de mão cheia de comida de terreiro e o outro pescador. Trajetória similar a do chef – de sorriso igualmente largo e talento ímpar -, Danilo Parah, chef do Rudä, também de Ipanema, a revelação do ano pelo Jornal O Globo e pela revista Veja Rio.
Mas não é apenas o CEP cobiçado que une estes dois cozinheiros de mão cheia. Vanessa e Danilo são suburbanos, crias da zona Oeste carioca, que carregam em suas elaborações ancestralidade e afrofuturismo, contribuindo com o legado da culinária preta e trilhando um novo horizonte na gastronomia brasileira.
Vanessa é nascida e criada em Pedra de Guaratiba. O avô por parte de mãe era descendente de indígena e pescador, “de uma cultura Caiçara de pesca, de fogo a lenha, de ter galinha e galo no quintal, a gente pegava ali os ovos.”
Por parte de pai veio a herança afro-brasileira, ele era pai de santo famoso, de Campo Grande, “de onde vem a minha ancestralidade, que reúne sabores riquíssimos, a maioria incorporada à culinária brasileira. Assunto que a chef domina.
O Maria foi Bib Gourmand do Guia Michelin em 2020 e pertence ao grupo Pabu, dos chefs Erik Nako, Luiz (Petit) Santos e Cristiano Lanna, além do restaurateur André Korenblum. Vanessa estreou por ali um menu que vai de cordeiro com barbecue de caju ou com aipim, cebola, couve frita, azeitonas, alho assado e muito azeite. Ainda seguindo viagem Brasil afora, a chef cruza o Cerrado para servir releitura do macarrão de comitiva sul-matogrossense (R$ 65), com rabada, linguiça toscana defumada e pimenta de cheiro para trazer aquela acidez que o paladar merece. Outra novidade – essa vem dando o que falar – é o Pirarucu de Santarém (R$ 76), escoltado por vinagrete de feijão manteiguinha que vem do Pará.
Nos bastidores, Vanessa é chamda de “Mamuska”, apelido carinhoso que remete àquela bonequinha de origem russa que abriga uma boneca menor, outra, e outra, e outra… Por trás do brinquedo tem um significado muito bonito. As grandes cuidam das pequenas, como em uma família. Uma vocação para poucos que ousam em, por meio do seu trabalho, tornar a vida das pessoas mais feliz.
Gastronomia social e familiar no DNA
Danilo Parah vem de Campo Grande, onde via a mãe e a avó cozinharem “divivinamente bem”. Deu no que deu. Ex-aluno da ONG Gastromotiva, rodou o mundo e cozinhas estreladas e hoje é um dos chefs mais festejados, expoente da nova cozinha brasileira contemporânea. Entenda por isso reunir, mesclar e fuçar o que há de melhor na culinária genuinamente nacional. Não à toa, lidera uma das empreitadas do Grupo Trëma, que mantém ainda o Mäska (também sob a liderança dele), Ízär, e Mimolette. “Tudo foi criado com o intuito de extrair do produto o máximo de sabor que ele pode entregar”, diz o chef.
Ele já atuou ao lado de Claude Troisgros e Mauro Colagreco, no Sul da França, e onde herdou a técnica francesa. Mas apenas isso, de resto, tudo em seu trabalho é brasileiro. Faz chouriço e atum curados na brasa, polvo com jambu, cogumelos grelhados com purê de abóbora e – para delírio de todos – sobrecoxa de frango prensada e laqueado com barbecue de goiaba, concassé de quiabo, purê de batata cremoso e roti de limão. Traduzindo, o bom e velho frango com quiabo.
“O bom tá na simplicidade”, diz. “Cuidar de cada detalhe para que o todo fique em harmonia. Escolher o produto, pensar no ingrediente, escolher louça, tudo que compõem esse universo de montar o menu é uma pequena fração do todo. são muitas mãos, são várias pessoas pensando em cada detalhe… é muita deliberação, muita conversa sobre os pratos e muitos testes antes de chegar no resultado final. o coletivo é o que importa.” O segredo do chef? “Tá na pimentinha!”
Em suma, Vanessa e Danilo estão a serviço da experiência afetiva. Impossível não perceber os sinais. Ambos trazem a memória, suas origens. Coisas da mãe, dos avós, dos negros…
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