O Observatório da Branquitude (Odb) lançou no último dia 24, o boletim “Quem são os anticotas no Brasil?”, um especial para os 10 anos da Lei de Cotas completos nesta segunda-feira (29). Este primeiro material de uma série que será produzida pelo Observatório é um mapeamento que reúne discursos, argumentos e perfis de importantes atores brasileiros que se declararam publicamente avessos à política de cotas em 2012.
Com estudo focado em três eixos principais – poder legislativo, intelectuais e imprensa – o boletim é uma importante ferramenta de consulta, um medidor do comportamento da branquitude em relação às cotas durante a década e, por isso, serve de bússola à sociedade civil organizada, colocando no radar preocupações à vista e linhas de articulação que possam contribuir com o fortalecimento da pauta e da política de cotas em geral.
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Junto do movimento dos intelectuais, em sua maioria brancos, a grande mídia como o jornal O Globo e a Folha de São Paulo, primeiro e segundo maiores no país respectivamente, revela o repúdio às cotas, a insuficiência de espaço nos veículos para a manifestação de vozes favoráveis, como também a redução do conceito de ações afirmativas ao componente raça.
A Folha publicou seu primeiro editorial a respeito de políticas afirmativas raciais em 1996. O texto reivindicava serem essas políticas uma espécie de “discriminação às avessas (…) na contramão da história”. O jornal teria seguido avesso a quaisquer ações afirmativas, classificadas de “benevolência demagógica”, “mérito substituído pela cor da pele”. De forma radicalmente contrária, a Folha passou a admitir políticas de cunho universalista na primeira metade dos anos 2000, com ênfase na reforma da educação pública e no investimento em cursos pré-vestibular. As reportagens e editoriais admitiram ainda políticas públicas com critérios socioeconômicos para o ingresso à universidade.
O levantamento identificou os cinco principais argumentos definidos pelo jornal para tratar as cotas: 1 – é arriscado utilizar categorias raciais, pois criam novas injustiças; 2 – o racismo e a desigualdade existem, mas não podem ser combatidos à revelia; 3 – não se pode identificar quem é negro no Brasil, uma vez que se trata de uma nação de mestiços; 4 – políticas públicas educacionais com base em critérios socioeconômicos abarcam negros, a maioria dentre os pobres; 5 – cotas raciais provocam segregação racial, já que ferem princípios republicanos e, por conseguinte, aumentam o racismo.
No caso do jornal O Globo de 2001 a 2009, foram examinados cerca de 940 textos entre cartas de leitores, artigos, editoriais, reportagens, notas, colunas. Segundo o levantamento, a leitura de O Globo concentrou, inicialmente, o foco nas experiências pioneiras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade de Brasília (UNB). Tomadas como modelo, o jornal desconsiderou diferentes ações afirmativas implementadas em demais unidades do ensino superior à época.
Diferente da maiores das universidades que aceitam o critério de autodeclaração na seleção de estudantes cotistas, a UNB entrou em uma polêmica pela instauração da comissão de verificação racial por meio de análise de fotografias dos candidatos – foram mais de 80% no total de matérias no jornal em 2011. A universidade foi objeto de vários textos publicados em O Globo e as comissões de verificação depreciadas, denominadas “tribunais raciais”.
A pesquisa pontuou os três principais argumentos contrários às ações afirmativas raciais mais recorrentes em O Globo no recorte temporal em destaque, nesta ordem: investir no ensino básico como alternativa; cotas raciais desconsideram o valor do mérito individual; e desigualdade socioeconômica entre classes é mais expressiva do que a desigualdade socioeconômica entre grupos raciais.
Para Thales Vieira, coordenador executivo do Observatório, “nossa intenção com a produção desses materiais é mais do que só afirmar a já conhecida resistência da branquitude em ceder a políticas afirmativas de reparação histórica e social. A missão do Observatório é lançar luz sobre essa problemática, questionando o paradigma da branquitude, que ainda é pouco explorado, e trazer para o debate público contribuições que possam sedimentar novos caminhos”.
O boletim está disponível neste link, no site da iniciativa.
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