Elza Soares nasceu na favela carioca de Moça Bonita, região conhecida atualmente como Vila Vintém, em 23 de junho de 1930, ano em que Getúlio Vargas deu o golpe e permaneceu como presidente do Brasil por 15 anos, incluindo o período da ditadura conhecido como Estado Novo (que de novo não tinha nada). Vinda de uma família extensa (teve dez irmãos) e pobre. Foi lavadeira, como sua mãe e empregada numa fábrica de sabão. Aos 12 anos foi obrigada, pelo pai operário, a se casar com um homem muito mais velho. Aos 13 teve o primeiro filho, aos 15 perdeu um filho vítima da fome e aos 21 ficou viúva. Foi a fome que levou Elza Soares para a música.

Sua participação histórica, em 1953, no programa no programa ‘Calouros em desfile’, apresentado por Ary Barroso na rádio Tupi, inaugurou sua carreira musical. Elza foi até a rádio porque precisava de dinheiro para comprar remédio e comida para seu filho, vestida com a roupa de sua mãe larga (cheia de alfinetes) num corpo magro com menos de 35 quilos. Assim que ela subiu no palco, a plateia toda riu. Ary Barroso ao entrevistá-la, perguntou, ironicamente: “De que planeta você veio?” e ela respondeu: “Do planeta fome”, quase chorando de raiva, como ela relembrou no programa de televisão Roda Viva, em 2002. Da vergonha a ganhadora do concurso de calouros da rádio Tupi. Seis anos depois deste episódio sua carreira despontou, porém ao longo dos anos teve altos e baixos.

Notícias Relacionadas


Elza era alvo de muitas críticas quando o assunto era sua vida pessoal. O casamento com o jogador de futebol Garrincha durou quinze anos, foi marcado por polêmicas e violência física.. Foi acusada, dentre outras coisas, de ser uma destruidora de lares, pois o namoro deles teve início quando o mesmo ainda era casado.

Elza Soares e Garrincha (Foto: Reprodução)

O sofrimento, as perdas e a luta são explícitos na vida e também na obra de Elza, mas reduzi-la a eles é no mínimo equivocado. Ela deixou um legado à música brasileira, com uma voz excepcional que não se limitou a somente um gênero musical, mas transitou e marcou diversos gêneros, principalmente, o samba (em suas diferentes vertente, como o samba rock), o jazz, o hip hop e até o funk misturando-os. A pesquisadora e cantora Marilda Santanna, no livro As bambas do samba, narra a excepcionalidade presente na atuação de Elza, destacando “o artesanato vocal da intérprete”, ou seja, voz e significações. Marilda Santanna destaca que a intérprete utilizava a sua voz de forma bem livre, “ para convocar a imagem concreta do objeto referenciado – como quando prolonga a consoante final”.

Em 2015, Elza ainda estava se reinventando e lançava o CD A mulher do fim do mundo com coragem que denuncia a violência contra a mulher e o racismo, silenciamentos das mulheres negras e tantas lutas políticas. Os versos da música O que se cala, expostos a seguir, refletem a potência da música no combate ao racismo e machismo: Minha voz/ Uso pra dizer o que se cala/ O meu país/ É meu lugar de fala.

Elza faleceu há um ano, em janeiro de 2021, aos 91 anos, deixando um legado de militância na arte negra brasileira. Ela representa a ancestralidade e sempre será uma referência para todas nós, mulheres negras, que usamos todos os dias nosso corpo e voz em busca de um país mais justo.

Notícias Recentes

Participe de nosso grupo no Telegram

Receba notícias quentinhas do site pelo nosso Telegram, clique no
botão abaixo para acessar as novidades.

Comments