*Por Shenia Karlsson
Em comemoração ao dia 12 de junho parece-me relevante trazer à luz de nossas discussões um assunto bem evitado nas rodas da vida: o relacionamento interracial. Certamente evitar falar não resolve as dificuldades que esta relação impõe aos que apostam viver esse tipo de amor.
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Cada vez mais falamos sobre o amor preto como cura e que vale a pena ser vivido – vide nosso histórico de desencontros e interdições. Entretanto, também tem os que defendem a tese de que “o amor não tem cor”, “o amor acontece”, sendo o amor um fenômeno incontrolável, independente de raça, cultura, posição socioeconômica e afins. FALÁCIAS!
O amor é socialmente construído assim como o racismo, influenciando diretamente em nossas escolhas amorosas, seja por identificação, seja por alienação. De fato, num país em que o embranquecimento ainda é um ideal de nação, a miscigenação, dentre tantas violências praticadas contra nossos corpos, é um resquício das marcas profundas que o racismo produziu.
Em sociedades estruturadas pelo racismo, o ideal de sujeito “branco” é a norma, produzindo inclusive assimetrias nas relações interraciais. Os processos de identificação dos negros são contaminados por este ideal e frequentemente não vimos pessoas como nós, negros, sujeitos merecedores de nosso afeto, amor e cuidado.
Embora a relação interracial tenha adquirido um suposto caráter de normalidade, está longe de ser uma perfeição. De qualquer forma, notamos uma insistência em romantizar tal relação sem ao menos discutir honestamente as inconsistências e os enormes desafios que casais interraciais enfrentam.
Algumas pesquisas americanas relacionam o aumento de sintomas depressivos na relação interracial (Wong;Penner,2018). Segundo os pesquisadores, o fator raça desencadeia uma série de situações estressantes, afetando assim o bem estar psicológico do casal. A incompatibilidades racial e cultural aumentam os conflitos e consequentemente o risco de sofrimento psíquico devido a discriminação e racismo (Wong;Penner,2018). Outra pesquisa revelou a relação do aumento de estresse e sintomas de depressão em membros de relações interraciais devido a discriminação e a marginalização social que os casais enfrentam e uma das consequências é o isolamento (Dush;Pittman,2018).
Pessoas negras em relações interraciais muitas vezes procuram apoio emocional fora de sua relação amorosa (família, amigos e psicólogos) e têm suas experiências oriundas do racismo e da discriminação geralmente deslegitimadas. O silenciamento passa a ser uma constante, visto que falar de raça passa a ser um tema conflituoso, de tensão. Pessoas brancas tendem a se sentirem extremamente atacadas quando o assunto é racial, gerando assim um afastamento emocional.
O que fazer para manter a saúde psicológica do casal interracial? Deixo algumas dicas. O tema raça não deve ser um tabu e é necessário admitir as diferenças raciais com positividade e nunca com antagonismos. Demanda esforço de ambas as partes, principalmente pelo membro branco do casal sendo este um agente fundamental nos enfrentamentos diários, levando em conta que o membro negro requer mais proteção. Entender que as violências sociais e a forma como o racismo se estrutura atravessa as relações amorosas, por isso, atenção dobrada. O membro negro não deve nunca negociar sua existência e sua negritude em detrimento do conforto do membro branco, se houver conflitos, estes devem ser enfrentados com coragem.
As relações inter-raciais são diversas, não possui um padrão único, ainda que sejam complexas, cheias de desafios e está longe de ser uma perfeição, muito pelo contrário, requer mais responsabilidade, engajamento, demanda diálogo contínuo, especialmente quando o tema é raça.
Shenia Karlsson – Psicóloga clínica, Co-Fundadora do Papo Preta: Saúde e Bem-estar da Mulher Negra.
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