No epicentro do South by Southwest (SXSW), o maior festival de inovação, tecnologia e criatividade do mundo, duas vozes femininas, negras e brasileiras marcaram presença trazendo um olhar apurado sobre essa experiência.
Em 2019, Ciça Pereira e Tainá Ramos, carinhosamente conhecidas como as Zeferinas, deram vida a um sonho audacioso em um modesto escritório improvisado no porão de Dona Rita, mãe de Ciça: transformar positivamente o mercado cultural. Desde então, essa dupla visionária tem liderado uma produtora cultural e um hub de inovação, impulsionando projetos que transcendem fronteiras artísticas e promovem um impacto social significativo. Seu histórico inclui colaborações com artistas renomados nacional e internacionalmente, como Erykah Badu e Masego. Elas também são Managers da cantora Bia Ferreira e da startup de soluções em equidade racial, a AFROTRAMPOS.
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Em parceria com o programa Creative SP, a Zeferina Produções foi uma das cinco selecionadas para representar a delegação brasileira em Austin, Texas.
Entre palestras inspiradoras, exposições de tecnologia de ponta e shows inovadores, o SXSW se destacou como um farol de criatividade e progresso. No entanto, por trás da fachada brilhante do evento, persistem questões de representatividade que precisam ser abordadas de frente. Para elas, “o considerado criativo brasileiro é branco, homem, classe média, apropriador e antiquado.”
“Dos diversos brasileiros presentes no festival, a maioria ainda enxerga a internacionalização como um caminho de emancipação e validação como se a cultura brasileira dependesse de uma aprovação externa para existir. As narrativas culturais apresentadas por eles, permeiam visões de inovação do passado, como se estivéssemos nos anos 2.000 em uma novela de Manoel Carlos falando muito sobre tecnologia e esquecendo da parte humana, onde a periferia e a pluralidade de pessoas ainda é vista como token e espaços necessitados de solidariedade, quando na verdade é delas que nasce a criatividade e a essência da nossa cultura”, dizem Ciça e Tainá. Elas destacam algumas iniciativas genuinamente brasileiras como a Casa SP, SPcine e Ade Sampa, que levaram personas plurais que realmente entregaram um diálogo equânime sobre seus trabalhos. Entre os artistas e produtores brasileiros apresentados pelo governo destacam-se Vulgo Fk, JotaPe, Bia Ferreira e Marcelo D2.
“Embora saibamos que muitas são as questões de classe, raça e gênero que o mercado cultural brasileiro precisa ajustar para que outras Zeferinas ocupem este espaço. O mais preocupante não é apenas o acesso aos financiamentos e estruturas para apresentarmos o Brasil lá fora, é a falta de noção de realidade e de oportunidades de negócios que perdemos quando não trocamos com outros países de igual para igual apresentando a nossa pluralidade”, explica Ciça Pereira, que exemplifica: “O funk é o maior fenômeno musical brasileiro sendo exportado hoje, assim como as outras diversas linguagens estéticas e artísticas que fizeram os ‘gringos elouquecerem’ como o bum do #brasileasthetic. Temos também as ‘viralizações’ do ritmo nas plataformas como TikTok e de remixes aprovados por artistas como Rihanna, Kanye West e outros feitos por produtores musicais brasileiros.”
E Tainá Ramos finaliza: “Chegou o momento de reconhecermos que a verdadeira criatividade e inovação emergem das periferias e dos movimentos culturais do norte e nordeste. São essas comunidades que exibem uma efervescência cultural única, capaz de atrair até mesmo ícones internacionais como Beyoncé para Salvador. Não podemos mais tolerar o financiamento de projetos oportunistas que exploram narrativas plurais apenas para enriquecer uma elite branca, negligenciando o empoderamento dos verdadeiros líderes e empresas que protagonizam suas próprias histórias.”
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