Por Ivair Augusto Alves dos Santos
Escrever sobre amor é uma tarefa difícil. Mexe com o nosso subconsciente, com nossas histórias de vida, com as paixões na adolescência, juventude, maturidade e na terceira idade.
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A memória do amor que nós não esquecemos está no primeiro olhar correspondido, o primeiro beijo, o segurar na mão, o primeiro abraço, e o primeiro ato de amor. E na terceira idade?
Há dias, fiquei impactado pela representação na novela das 6 horas, “Amor Perfeito”, em que dois idosos negros fazem amor. Popó, representado pelo ator Mestre Ivamar e a professora Celeste, interpretada pela atriz Cyda Moreno. Um ato libertário, revolucionário e de profunda felicidade na dramaturgia da televisão brasileira.
No dia seguinte, procurei se o fato havia sido registrado pela mídia, infelizmente não. Não perceberam que aquele gesto de amor tantas vezes repetido nas novelas brasileiras, continha algo novo, deslumbrante e de muita beleza. O amor entre duas pessoas negras da terceira idade.
Um casal apaixonado que aprende a viver e não se imagina um instante sequer um sem o outro, ou sem pensar um no outro, e amar cada vez mais à medida que recrudesce a velhice. Não há tempo a perder.
Descobrem aos poucos as manias de cada um, seus transtornos de humor, as fissuras de sua memória e uma volta feliz à infância, onde trocam as lembranças juvenis.
Poder se ver na tela de uma televisão, enxergar que o amor existe em todas as idades, que não foi esquecido, renova as nossas esperanças e o desejo de viver amando.
A cena de duas pessoas negras belíssimas na terceira idade se amando, trocando carícias na cama é um fato esperado por muitas décadas. A gente só imaginava isso nos filmes americanos, mas ver na TV nos leva para um campo novo, do possível. As professoras negras, as mulheres negras com padrões de beleza brasileiros, ao se verem na maior rede de TV do país é algo explosivo.
Parece que estou exagerando, mas passamos gerações inteiras, nos últimos setenta anos da televisão brasileira, sem assistir uma cena sequer de amor entre negros. Cenas que mostrassem afeto, delicadeza e que não fossem estereotipadas na violência. Quanta história reprimida e censurada de amor! Isso deve ter impactado negativamente na vida de milhões de pessoas.
As mulheres negras, ao se referirem à telenovela destacam: as fantásticas cenas de amor, a forma carinhosa, o afeto, a delicadeza e o jeito respeitoso com que a atriz Cyda Moreno as representou.
Uma emoção de alegria, de orgulho de ser negro, de poder ser retratado com cenas de amor. A vida nos reserva belos momentos e poder fazer isso em uma rede de TV é sublime, revolucionário e subversivo.
#*Ivair Augusto Alves dos Santos
Mestre em Ciências Políticas pela Unicamp
Doutor em Sociologia pela UnB
Ex-diretor do Departamento de Direitos Humanos da Secretaria de Direitos da Presidência da República.
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