Nos tempos do Imperador: primeiro capítulo teve Dom Pedro II gente boa, branca salvadora e massacre de escravizados

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Nos tempos do Imperador: primeiro capítulo teve Dom Pedro II gente boa, branca salvadora e massacre de escravizados

Novelas de época deveriam vir com um alerta de gatilho. A escravidão negra no Brasil, a mais longa da história, não é ficção. Não tem como ver cenas que envolvem abusos de donos contra negros escravizados, açoites, grilhões, assassinatos e não imaginar que um ancestral nosso, não tão distante, tinham esse cenário de terror como parte do seu cotidiano.

Ontem a Globo estreou a novela “Nos tempos do Imperador”, primeira pós pandemia, protagonizada pelo fantástico Selton Mello na pele de Dom Pedro I que iniciou a novela com falas apaixonantes sobre o Brasil, demonstradas em cena pelo seu apreço ao registro de imagens dos lugares que visitou.  E sim, a novela tentará humanizar o Imperador que não aboliu os escravizados. Inclusive pela fala da autora, a gente percebe que os avanços sócio educacionais serão mais relevantes na trama do que a desumanização e abuso dos africanos sequestrados e seus descendentes.

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“Nós escolhemos destacar na novela as coisas que ele fez, como a relação dele com o ensino, com a cultura, e o patrocínio à ciência. Esse olhar para projetar um novo Brasil. Apesar de ter cometido alguns erros e de não ter conseguido levar à totalidade seu plano de abolição, Dom Pedro II tem coisas importantíssimas. E todos os personagens ficcionais nascem do resultado desse momento, de como estava a economia, das dificuldades desses novos brasileiros”, comenta a autora Thereza Falcão.

No primeiro capítulo vemos um grupo de negros escravizados identificados como Males invadindo uma fazenda para libertar seus pares. A cena mostra homens e mulheres sendo dizimados pelos capitães do mato e outros protetores da fazenda. Tem mulher negra sendo baleada na frente do filho, golpes de capoeira sendo interrompidos por facada, sendo uma cena muito violenta e difícil de assistir.

Por meio desse conflito, conhecemos Jorge / Samuel ( Michel Gomes) que se fere durante esse combate e é salvo por Pilar ( Gabriela Medvedovski ), moça branca de família abastada, que apesar de ser descendente do opressor, caiu imediatamente nas graças do escravizado fugitivo que lhe agradece a mocinha por ter salvado sua vida e a quem ele chamou de “anjo”.  Já se sabe que eles serão um casal na novela e torcemos para que haja um casal preto com a mesma relevância.  

Outra cena curiosa é Luisa Condessa de Barral ( Mariana Ximenes ) sendo recebida por muitos sorrisos dos negros na lavoura ao ir visitar um bebê recém nascido.

Reprodução Globo

Para a Historiadora Débora Simões, essa visão de herói da nação de Dom Pedro II que a novela vai tentar imprimir é um erro. “Quando aconteceu a abolição, a assinatura da Lei Áurea ele, Dom Pedro II, estava viajando.  Ele constrói sua imagem de bonzinho porque o Dom Pedro I era muito louco e suas farras eram muito conhecidas. Na historiografia Dom Pedro II ele é mostrado como mais comportado, até como bom moço. A relação dele com a abolição é sempre muito difícil, porque foi no período dele que tivemos várias leis que quase a aboliram, mas não aboliram a escravidão, enfim é controverso”.

O escritor Ale Santos lembra o flerte de Dom Pedro II com ideias eugenistas. “Ele bancou a entrada dos confederados no Brasil quando a escravidão acabou nos EUA e também era amigo do Gobineau, um dos primeiros eugenistas”, detalha Santos que mostrou em seu perfil do Twitter uma imagem onde Dom Pedro II visitava um zoológico humano.

Reprodução Twitter

A novela terá o núcleo negro relevante chamado Pequena África, residência da comunidade afro-brasileira na Região Portuária do Rio de Janeiro “Pessoas das quais hoje nós falamos tanto, como Tereza de Benguela, Luisa Mahin e outras mulheres líderes quilombola, não estão nos livros de História. A Teresa conduziu um quilombo com quase mil pessoas entre pretos, indígenas e brancos e liderou esse quilombo durante muito tempo. Onde está essa história? Por que eu não cresci ouvindo e lendo isso? Para mim, a Cândida é a oportunidade de dar voz a histórias que são minhas e que não foram contadas para mim”, comenta Dani Ornellas, que vive Cândida, a Rainha da Pequena África, comenta sobre a importância dessa representatividade.

Ainda é cedo para saber se os autores de novelas da Globo avançaram na retração dos nossos antepassados em novelas de época. Já estamos cansados de ver programas na TV que nos gerem desconforto.

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