Falcão e o Soldado Invernal está no ar. A história tem como objetivo narrar as consequências e o legado do Capitão América, Steve Rogers, após ter entregue o escudo para Sam Wilson, o Falcão, ao final de Vingadores: Ultimato.
É de se esperar que a história tenha um grande teor político em sua execução, afinal estamos falando do Capitão América, mas além disso existe uma expectativa com relação a um teor racial presente na narrativa. Isso porque Sam Wilson é um homem negro, mas não apenas isso. Nick Spencer, em 2015 trouxe muito do debate racial para a HQ do personagem em que ele assume o manto de Capitão América.
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Em Capitão América: Sam Wilson, o herói precisa enfrentar não apenas a Hidra e outros vilões, mas campanhas difamatórias contra sua imagem, por ser um homem negro. O racismo transcendeu o quadrinho e uma parcela grande do público também passou a criticar o fato de um homem negro ter assumido o manto de Capitão América.
Considerando todos esses fatores era de se esperar que a discussão racial também fosse presente na nova série do Disney+ e isso realmente vem acontecendo, de forma surpreendentemente explícita.
ATENÇÃO, A PARTIR DESSE MOMENTO TEREMOS SPOILERS, LEIA POR SUA CONTA E RISCO
O primeiro episódio da série trouxe de forma muito sutil algumas questões raciais. Muito sutis mesmo.
Sam Wilson indo visitar sua irmã e família em DeLacroix Island, que fica ao Sul os Estados Unidos me fez pensar sobre a escolha dessa região que é marcada por discussões raciais.
O estado de Luisiana, assim como boa parte do Sul Norte Americano, é marcado por debates e tensões raciais até os dias de hoje.
A forma como a irmã de Sam, Sarah, fala sobre como ele sempre foi muito exigente consigo mesmo, revelando uma faceta da cobrança social sobre corpos negros que propiciam a Síndrome do Impostor que parece afetar Sam Wilson e o fazer devolver o escudo do Capitão ao governo e visita ao banco onde, mesmo sendo um dos heróis responsáveis por salvar todo o universo, o empréstimo para salvar as economias da família, é negado. São elementos que abordam sutilmente questões raciais.
Nesse momento da história tive receio de que a série tivesse medo de aprofundar essas discussões e fizesse isso apenas de forma superficial, mas no segundo episódio me surpreendi com um panorama racial muito melhor apresentado.
Toda a sequência envolvendo a visita de Bucky e Sam ao supersoldado Isaiah Bradley é muito mais importante do que muitos imaginam.
Primeiro gostaria de destacar a potência do diálogo entre Sam e o jovem negro que o reconheceu nas ruas.
- Meu Deus, é o Falcão Negro.
- Só Falcão
- Meu pai disse que é Falcão Negro
- Por quê ? Por que eu sou o Falcão e sou Negro?
- Sim…
- Você é um garoto ou o Garoto Negro?
Nesse momento, além da óbvia crítica ao fato de personagens negros sempre precisarem ter isso em destaque, eu gostaria que vocês lembrassem que o rapaz negro o reconheceu de imediato.
Em seguida nos é apresentado dois grandes nomes do universo Marvel, Eli Bradley, que passa a ser conhecido como Patriota nos quadrinhos e líder dos Jovens Vingadores, e seu avô Isaiah Bradley.
Isaiah Bradley foi criado nos quadrinhos para uma minissérie que foi inspirada em um caso real, um experimento médico que envolveu 600 homens negros sem o consentimento deles para teste do tratamento de sífilis. Mais de 300 homens negros infectados com a doença foram selecionados para monitoramento. O objetivo do Estudo Tuskegee, nome do centro de saúde onde foi realizado, era observar a evolução da doença, livre de tratamento. Ou seja, não foi dito aos participantes do estudo de Tuskegee que eles tinham sífilis, nem dos efeitos desta patologia. O diagnóstico dado era de sangue ruim. Esta denominação era a mesma utilizada pelos Eugenistas norte-americanos, no final da década de 1920, para justificar a esterilização de pessoas portadoras de deficiências, inclusive.
De 1932 a 1972 o Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos da América realizou essa pesquisa e devido a doença muitos dos participantes tiveram danos cerebrais.
Inspirado por essa história o roteirista Robert Morales criou em 2003 a minissérie ‘Capitão América — Verdade: Vermelho, Branco e Negro’.
Nela Isaiah foi um dos 300 homens selecionados como cobaia para testes na tentativa de replicar o soro do Super Soldado do Capitão América e foi o único sobrevivente.
Com isso o governo americano passou a utilizar Isaiah em missões durante a guerra. Em uma de suas missões Isaiah rouba o escudo e o uniforme do Capitão América para concluir sua missão e mesmo sendo um herói ele acaba sendo pego pelo governo americano e preso.
Ele se torna uma lenda na comunidade negra. Heróis negros como Luke Cage, Pantera Negra e Tempestade o reverenciam além de nomes históricos como Malcolm X, Nelson Mandela e Angela Davis.
Percebem a potência da introdução desse personagem no universo Marvel?
Aqui vai um fato extremamente curioso em paralelo a vida real. No mesmo dia em que esse herói, com esse Background, foi introduzido no universo Marvel, tivemos a polêmica envolvendo a fala de Xuxa Meneghel sobre ser favorável ao uso de presidiários como cobaia pela indústria farmacêutica para produção de medicamentos.
E é importante lembrar que 2 a cada 3 pessoas presas, são negros no Brasil. O que reflete diretamente na discussão sobre a fala eugenista de Xuxa ter também impacto racial.
Isaiah Bradley, seu background e a introdução de sua história no universo Marvel, acaba por ser algo extremamente atual.
Continuamos nessa cena, onde Bucky e Sam são expulsos da casa de Bradley e discutem a existência de um Super Soldado negro escondido pelo governo americano, o que impacta diretamente Sam.
Baltimore é considerada uma das cidades mais perigosas dos Estados Unidos e também do mundo, naturalmente em um bairro negro haveria um maior monitoramento policial e aí vemos a sequência em que o policial não só não reconhece Sam Wilson, como também trata ele de forma completamente diferente da forma que trata Bucky, um homem branco.
Capitão América e o Soldado Invernal, nesse segundo episódio, deixa claro que a questão racial será muito presente nessa série e nos anima para o futuro do universo Marvel.
Será que teremos finalmente o Capitão América Sam Wilson? Um homem negro assumindo o manto do maior herói americano?
Qual será a importância de Isaiah Bradley no universo Marvel? Eli Bradley irá se tornar o Patriota e líder dos Jovens Vingadores como nos quadrinhos?
Muitas perguntas para serem respondidas e esperamos que as respostas sejam boas.
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