“Quem aqui de vocês quando doente, conseguiu ficar mais de três dias de cama, sem ter que se recuperar antes do tempo previsto, para retomar seus compromissos ?”. Essa foi a provocação inicial feita durante o primeiro encontro do Iyá Maternância grupo de mulheres que discute maternidade negras aqui em São Paulo, em outubro do ano passado.
E é isso. Se mulher negra tem que ser forte, mães negras não podem ser dar “ao luxo” de adoecer. A imagem da escrava negra sempre disponível e pronta para servir, ainda existe, mesmo em lares afro-centrados. São as feridas da escravidão ainda abertas e cutucadas diariamente, e que se traduzem em muito dor, baixa autoestima e a sensação de que não merecemos ser amadas.
Notícias Relacionadas
Filmes, séries e reality show com protagonismo negro para maratonar no feriado prolongado
Grammy Latino 2024: homens negros brasileiros brilham na premiação
Quem já participou de encontros de mulheres negras, sabe o quanto é tocante, o quanto choramos deixando evidente uma dor coletiva, mas silenciada dentro dos nossos lares. Temos medo de nos mostrarmos vulneráveis, visto que temos que ser a solução e nunca o problema ou ainda, pela falta de ter quem se importe.
“Minha mãe morreu aos 53 anos, de tanto trabalhar. A imagem que tenho dela é de sofrimento, ela apanhava do meu pai e trabalhava todos os dias da semana, até que seu coração não aguentou”, disse uma das participantes daquele encontro. Eu, infelizmente, não acho que esse seja um caso isolado. A maior parte das famílias negras, são sustentadas por mães exaustas.
Projetos sobre maternidade negra são urgentes porque a sensação de solidão e abandono persiste até entre mães jovens. Não nascemos mães. Parir e educar crianças negras é outro papel que tivemos que assumir sozinhas.
Minha dúvida é, porque o homem negro é tão ausente nessas questões? Em outros depoimentos ficou evidente que o pai, negro ou branco, delega a mãe, mais esse fardo, como se só ele tivesse o direito de usar a carta da Glória Pires e não opinar, passando para nós, mais uma vez a função de administrar e gerenciar conflitos gerados em situações de racismo.
Quem exige das lojas a boneca negra, quem vai à escola para pedir mais diversidade nos livros paradidáticos ou denunciar o coleguinha racista, quem muda sua estética para ser referência para os seus filhos é a mãe negra.
As recompensas por essa doação incansável é essa nova geração de crianças negras empoderadas.
Mães negras, como todas as outras, têm dúvidas, medos, se cansam, sentem dor, tem muitas dúvidas e não têm resposta para tudo, no entanto o racismo é imperdoável, mesmo com as que ainda carregam seus filhos no ventre. Até a dose de anestesia no parto pelo SUS é menor quando a mãe tem pele escura.
Enquanto isso não é um problema para o Estado, nem para os pais, iniciativas como coletivos de mães negras são o que irá garantir que nossas meninas negras, sejam mais felizes e amparadas no futuro quando se tornarem mães.
Notícias Recentes
Lançamento de “Aspino e o boi” leva memórias quilombolas à literatura infantil
Novembro Negro | Seis podcasts e videocasts apresentados por mulheres negras para acompanhar