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Você sabia que somente em 2002 foi revogada a lei federal que equiparava africanos escravizados a animais?

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Texto: Hédio Silva Jr.

Adotado em 25 de junho de 1850, o Código Comercial equiparava a pessoa escravizada a semovente, a animais: “Art. 273.  Não podem, porém, dar-se em penhor comercial escravos, nem semoventes.”

Código Comercial – 1853 – Imagem: Biblioteca Brasiliana

Esse dispositivo do Código Comercial atravessou  todo o período republicano, tendo sido revogado somente em 2002, pelo novo Código Civil. Diz muito sobre o racismo no Brasil o fato de que até bem pouco tempo havia lei federal que qualificava os escravizados, e obviamente seus descendentes, como animais.

Protesto Movimento Negro Unificado em 1978 / Fonte: Memórias da DItadura

Não é só: a Constituição republicana de 1891 assegurava o direito ao voto mas excluía os analfabetos e mendigos: “Art. 70, § 2°.Não podem alistar-se eleitores para as eleições federais, ou para as dos Estados: 1° Os mendigos; 2° Os analphabetos;”

Foto: Unsplash

Tendo em conta as leis que proibiam o acesso de escravizados à escola e o plano de embranquecimento do país implantado naquele período, não é difícil imaginar quem era analfabeto e mendigo no Brasil três anos depois da abolição.

Foto: Reprodução/Jornal Unicamp

O voto do eleitor analfabeto foi assegurado somente em 1985, com a Emenda Constitucional n. 25.

Mulher analfabeta mostra o dedo após votar, em 1986 – Foto: Orlando Brito

Ao mesmo tempo em que tratava ex-escravizado como gado e o excluía do direito de votar, a legislação republicana preocupava-se em assegurar e proteger a “pureza racial” da imigração europeia: Art. 121, § 6º. “A entrada de immigrantes  no territorio nacional soffrerá as restricções necessárias á garantia da integração ethnica e capacidade physica e civil do immigrante… (Constituição de 1934).

Foto: Guilherme Gaensly (1843-1928) / Fundação Patrimônio da Energia de São Paulo / Memorial do Imigrante

A preocupação com a pureza racial, com a eugenia, passou a fazer parte inclusive do currículo escolar, conforme determinado pela Constituição de 1934: Art. 138. Incumbe á União, aos Estados e aos Municipios, nos termos das leis respectivas: b: estimular a educação eugenica;

Presidente Getúlio Vargas ao lado de Deputados em 1934

A despeito de todas essas leis (existem outras, algumas inclusive em vigor) há quem acredite que após a República o Brasil nunca teve leis racistas ou que a lei passou a tratar todos igualmente.

Foto: Reprodução/Freepik

Todos quem cara-pálida? Essa história de que nunca houve lei racista após a abolição lembra a infeliz invenção do tal racismo recreativo: certamente o racismo é bastante divertido para o racista. Para a vítima, racismo lembra dor, sofrimento e por vezes morte. Só sendo racista para associar racismo a diversão. Alguém aí aplaudiria a expressão “estupro recreativo”?

Foto: Reprodução/Freepik

Texto: Hédio Silva Jr., Advogado, Doutor em Direito, fundador do Jusracial e Coordenador do curso “Prática Jurídica em casos de Discriminação Racial e Religiosa”

Michelle Obama inspira mulheres negras a enfrentarem desafios com seu novo livro

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Foto: Reprodução/Instagram

Michelle Obama compartilha, mais uma vez, sua sabedoria e empatia com o público em seu novo livro, Superação: Um Livro de Exercícios. A obra interativa é uma continuação de Nossa luz interior: Superação em tempos incertos (2022) e oferece ferramentas práticas para lidar com os desafios da vida, desde mudanças inesperadas até momentos de perda e incertezas.

Em entrevista à revista Essence, a ex-primeira-dama dos Estados Unidos, falou sobre a motivação por trás do livro e compartilhou mensagens de esperança para mulheres negras, público que inspirou muitas de suas reflexões. “Você nunca está sozinha. Se você não está se sentindo bem, é provável que outras pessoas estejam no mesmo barco. Conectar-se com os outros faz bem, e eu prometo: isso ajuda”, declarou Michelle.

Para ela, a chave para enfrentar momentos difíceis está em começar pequeno. “Atividades concretas e finitas estabilizam nossas mentes e acalmam nossos corações. Pode ser tricotar, cozinhar ou simplesmente exercitar-se. O importante é tirar alguns minutos do dia para focar em algo seu”, explicou.

Michelle também destacou a importância de cultivar o bem-estar de forma holística, incluindo aspectos físicos, mentais e emocionais. Desde que deixou a Casa Branca, ela tem encontrado tempo para refletir sobre sua vida e priorizar momentos de qualidade com seus entes queridos. “Passar um tempo respirando e me conectando com as pessoas que amo me ajudou a ver minha história de forma mais clara”, disse.

Com Superação: Um Livro de Exercícios, Michelle espera ser uma guia para quem busca novas formas de superar os obstáculos da vida. “Quando se trata de mudança, todos podemos usar um copiloto — um amigo, um parceiro ou até um livro de exercícios. O importante é dar o primeiro passo.”

O livro ainda não tem data de lançamento agendada no Brasil.

Moda negra é sobre acessórios e roupas étnicas?

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Foto: Reprodução/Lisa Folaiywo

Há um equívoco comum em pensar que a moda negra se resume a acessórios e roupas com estampas étnicas. Embora essas estampas possuam um  valor cultural intangível  e, na diáspora, representem de forma marcante o resgate da cultura africana que foi algo de insistentes tentativas de apagamento (que ainda perduram), elas são apenas uma das muitas expressões do design negro. Criadores negros têm ampliado os horizontes e impactado as percepções da moda com ideias inovadoras, que incluem referências do movimento afrofuturista, elementos das religiões de matriz africana e inspirações do cotidiano que se entrelaçam com a vida e a história das comunidades negras em diferentes lugares do mundo. 

Se as estampas produzem o entendimento visual literal de que aquele produto tem ligação com África, ainda que exija um olhar mais apurado para entender seus diferentes significados, as releituras e novas criações de  estilistas negros são um exemplo de como a moda afro vem crescendo. A designer nigeriana, Lisa Folawiyo, da marca Jewel by Lisa, que já vestiu  Lupita N’yongo e Solange Knowles, traz em suas peças reinterpretações das estampas, utilizando tecidos africanos tradicionais com técnicas modernas de construção de vestuário.

Foto: Reprodução/Lisa Folaiywo

Ao trazer uma memória de infância, Folawiyo conta como a mãe vestia ela e os irmãos: “Ela era muito criteriosa [sobre] como todos os quatro filhos se apresentavam ao mundo em termos do que vestíamos e, inconscientemente, eu me tornei muito consciente das roupas, de como eu queria parecer. Além disso, minha mãe é de Trinidad e Tobago, e acho que isso [inspirou] meu amor por cores e estampas”, contou em uma entrevista concedida para a revista norte-americana Essence, ao lembrar de como a mãe a influenciou.

Foto: Reprodução/Instagram

No Brasil, Karla Batista, fundadora da Azulerde, marca de acessórios de moda, traz no DNA do seu negócio o design contemporâneo e já enfrentou dificuldades em ser vista como uma marca afro por suas peças não conterem representações do que se imagina que vem de África: “Acredito que ter um design mais contemporâneo é um deles. Enfrentei múltiplas dificuldades por não ser uma marca preta que utiliza elementos como búzios e estampas mais expressivas. Nesse processo de afirmação de marca, tive que fortalecer muito o branding para que todos pudessem entender a afro-contemporaneidade das minhas criações”, revelou.

Enquanto a Azulerde propõe um design afro-contemporâneo, marcas como a Santa Resistência, da estilista Mônica Sampaio, também são exemplos de como os elementos de culturas africanas tradicionais se misturam às novas referências de criação de moda e mostram que falar de África e de diáspora está além dos estereótipos. Na última edição do São Paulo Fashion Week, realizado em outubro, Sampaio apresentou sua coleção “Manifesto Ancestral”, que segundo o diretor Rodrigo França: “A coleção é um convite à reflexão sobre a moda como um espelho do passado e uma janela para o futuro, onde cada peça se torna um manifesto vivo, ecoando a força de um povo que transcende o tempo e o espaço”.

As inúmeras possibilidades de conceitos e ideias que podem ser criados tendo como referências a cultura e a técnologia de povos africanos, afrobrasileiros e outras diásporas é o que permite que criadores negros não sejam colocados em uma escala de segmentação limitada, e também é o que os estabelece como designers que estão moldando o futuro da moda negra.

Esse conteúdo é fruto de uma parceria entre Mundo Negro e Instituto C&A.

‘Identidade Preta’: Jorge Aragão e Emicida se unem em novo single pelo resgate da ancestralidade

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Foto: Felipe Vasconcellos

Dando sequência ao “Projeto Identidade”, Jorge Aragão lançou a faixa “Identidade Preta” em parceria com Emicida, nesta sexta-feira (6), nas plataformas digitais, acompanhado de um videoclipe no YouTube. A música reafirma o compromisso do sambista em ressignificar o samba, construindo pontes entre gerações e estilos ao unir forças com grandes nomes do rap nacional.

“Identidade Preta” destaca-se como um marco artístico, mesclando o lirismo incisivo de Emicida com a musicalidade inconfundível de Jorge Aragão. A canção celebra o protagonismo da arte negra ao exaltar temas como ancestralidade, memória e o orgulho racial. Com versos impactantes, como “Somos herança da memória / Temos a cor da noite / Filhos de todo açoite”, a música inspira reflexões sobre a construção da identidade e a resistência da população negra no Brasil.

“Prestigiados são aqueles que transformam a arte em luta. Fico feliz pelo que construí na música. Temos a cor da noite, somos filhos de todo açoite, mas seguimos criando novos caminhos, mais fortes e unidos”, reflete Jorge Aragão sobre o projeto, iniciado em 2023. Ele complementa: “O Projeto Identidade revisita nossas raízes, por meio de músicas que carregam histórias, enquanto dialoga com uma nova geração de artistas comprometidos com nossa causa.”

O “Projeto Identidade” já contou com colaborações de peso, como Djonga em “Respeita”, L7nnon em “Cotidiano Pixaim” e Xamã com “Sempre Eu e Você”.

A produção musical ficou a cargo de Keviin, responsável pelo Malibu Studios e vencedor do GRAMMY Latino 2024 na categoria “Melhor Interpretação Urbana em Língua Portuguesa” pela produção de “Cachimbo da Paz 2”, de Gabriel O Pensador, Xamã e Lulu Santos.

Composto por regravações e músicas inéditas, o projeto reafirma a relevância do samba no diálogo com outros gêneros musicais. Para o Malibu Studios, que já possui um histórico de parcerias com Jorge Aragão, “Identidade Preta” simboliza um encontro especial e celebra a diversidade musical brasileira.

‘Mulheres Negras em Rotas de Liberdade’: Filme leva brasileiras à uma viagem imersiva pelo continente africano

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Foto: Alile Dara Onawale

A cineasta baiana Urânia Munzanzu apresenta “Mulheres Negras em Rotas de Liberdade”, um documentário que celebra a ancestralidade, a liberdade e as lutas das mulheres negras brasileiras, em um diálogo profundo com suas raízes africanas. Com a participação de figuras como Sueli Carneiro, Conceição Evaristo, Erica Malunguinho, Luedji Luna, Mirtes Renata, Carla Akotirene e a própria diretora, a produção chega ao continente africano esta semana, embarcando em uma jornada pelas rotas históricas do tráfico de escravizados.

Foto: Alile Dara Onawale

As gravações do documentário acontecem em duas etapas: entre 25 de novembro e 19 de dezembro de 2024, e em março de 2025. Durante esse período, as protagonistas farão uma imersão em quatro países africanos — Senegal, Benin, Nigéria e Cabo Verde —, explorando histórias e perspectivas que colocam os corpos das mulheres negras como símbolos de resistência e transformação ao longo da diáspora africana.

Foto: Alile Dara Onawale

Um dos destaques da produção será o evento especial na Obafemi Awolowo University, em Ile-Ife, Nigéria, na próxima segunda-feira, 9 de dezembro. Conceição Evaristo e Sueli Carneiro se unirão a acadêmicos e representantes locais para uma palestra que abordará temas como identidade, ancestralidade e emancipação negra, fortalecendo os laços culturais e intelectuais entre Brasil e África.

Foto: Jeff Dias

Antes mesmo de seu lançamento, o documentário já se destacou em importantes festivais e laboratórios cinematográficos. No Brasil, foi finalista em eventos como o Minas Max, Nordeste Lab, FAM e CinePitching, além de vencer o laboratório DocSP. Internacionalmente, conquistou espaço no fundo de Gotemburgo, no Sunny Side of Docs 2021 e no laboratório AFROLATAM, do Miradas Doc.

Foto: Jeff Dias

Com o objetivo reconstituir as rotas históricas do tráfico transatlântico de escravizados, enquanto ressignifica as narrativas das mulheres negras no presente, o filme tem início no Brasil e parte rumo à África do Oeste, antigo Reino do Daomé, a famosa Costa do Ouro, fazendo um percurso que a Unesco instituiu nos anos 1980 como “Slave Routes” ou “Rotas dos Escravos” nos países Nigéria, Benin, Senegal e Cabo Verde. Portos onde o sistema escravagista há 300 anos atrás fez embarcar, nos Negreiros, cargas humanas que forçadamente construíram o que hoje chamamos de América. Para um corpo negro esta era uma “viagem sem volta”.

Foto: Jeff Dias

“Mulheres Negras em Rotas de Liberdade” é produzido pela Acarajé Filmes, em coprodução com Mulungu Realizações Culturais e produção associada de Cristina Naumovs e do escritor Laurentino Gomes.

‘Como Não Ser Racista’: evento lança livro com a presença de Fayda Belo, Toni Garrido e Cristiane Sobral

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Fotos: Manoella Mello e Divulgação

No Dia Internacional dos Direitos Humanos, 10 de dezembro, às 9h, em Brasília, será lançado o livro ‘Como Não Ser Racista’ na última edição do evento Papos que Transformam, promovido pelo Sindilegis, em parceria com os comitês de equidade do Senado Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU), que ao longo do ano, promoveu outros debates sobre temas como etarismo, saúde mental, capacitismo e o impacto das redes sociais.

Para participar do evento, o público deverá fazer a inscrição para acompanhar presencialmente ou online. Entre os convidados especiais do evento estão Cristiane Sobral, autora do livro, e Toni Garrido, que assina o prefácio. A programação também inclui um debate sobre expressões e vivências negras, com a participação da advogada criminalista Fayda Belo, especialista em crimes de gênero.

O encerramento do encontro contará com uma visita guiada à exposição ‘Entre Linhas e Formas: A Arte e o Design no Brasil’, conduzida pelo artista Sanagê Cardoso. Em cartaz no Centro Cultural do TCU, a mostra reúne obras de 26 artistas visuais e 18 peças de designers modernistas, celebrando a diversidade da arte e do design brasileiros.

‘Como Não Ser Racista’ é uma continuação da série ‘Como Não Ser um Babaca’. A obra propõe reflexões profundas sobre atitudes, práticas e conceitos que perpetuam a exclusão social, incentivando letramento racial e autocrítica.

Como participar
O evento será realizado presencialmente no anfiteatro do Instituto Serzedello Corrêa e contará com transmissão online. As inscrições já estão abertas!

Chef Guilherme Lara inaugura novo espaço físico do seu restaurante em SC: “As pessoas começaram me respeitar”

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Foto: Divulgação

Há quase 13 anos morando no sul do Brasil, Guilherme Lara, chef proprietário do restaurante Lara Cucina, está inaugurando o novo espaço físico em Blumenau, Santa Catarina. O projeto começou com delivery e após dois anos, abre espaço para receber os clientes a se deliciar com a comida italiana, especialidade da casa. 

“É muito difícil fazer comida italiana sendo um homem preto no sul do país. O processo é lento e sinto que hoje as pessoas começaram me acolher, respeitar e entender o meu amor por aquilo que eu faço”, diz o paulista Guilherme sobre sua experiência.

Com o restaurante, ele já tem mais sonhos a serem realizados. “O objetivo é aumentar o número de restaurantes pelo estado, receber todas as pessoas, mas principalmente pessoas pretas, para elas poderem sentar em um restaurante sofisticado, tomar seu vinho sem nenhum medo ou desconforto. Quero poder inspirar outras pessoas que vivem aqui no sul”, compartilha. 

Leia a entrevista completa abaixo:

1) Conte-me um pouco sobre você e como a gastronomia entrou na sua vida. 

A gastronomia entrou na minha vida muito cedo. Eu acho que eu sempre quis fazer gastronomia, eu sempre gostei de cozinhar. Eu sempre fazia bolos, comida com a minha mãe em casa quando eu era pequeno. 

Mas eu também vi a minha avó por parte de pai, que inclusive era a única referência de pessoa preta que eu tive na minha família. Ela era uma pessoa muito humilde. Ela fazia muita comida simples, de roça, sabe? Que era bolo de fubá, bolo de milho. Eu lembro que ela moía a farinha de mandioca no pilão, aqueles pilão de madeira alto. E aquilo, pra mim, é uma imagem muito forte. Então, eu tive, claro, a minha avó de referência, tive um pouco da referência da minha mãe. E eu sempre quis fazer isso. 

A minha mãe, quando eu me formei no ensino médio, sugeriu que eu viesse pro Sul. Ela dizia que aqui era uma região mais tranquila de se viver, né? Ela não queria que eu ficasse em São Paulo, pela questão da violência e tudo mais. Ela queria que eu tivesse uma vida um pouco mais confortável. Então, eu vim pra cá, acho que com 17 anos, muito cedo, eu me formei no ensino médio muito cedo. Comecei na faculdade e tive a oportunidade de trabalhar num baita de um restaurante como cozinheiro.

E dali foi só crescendo. Cheguei ao cargo de chefia, onde fiquei por seis anos e meio neste cargo, nesse grande restaurante, muito renomado. E depois trabalhei nos outros melhores restaurantes da cidade, onde tive a oportunidade também de ser chef. 

2) O que você faz atualmente e qual sua especialidade?

Hoje, depois de 13 anos, eu tô aqui ainda e tô abrindo meu restaurante. Que vai ser uma pegada um pouco mais intimista, mais romântica, um restaurante italiano. Eu fiz uma especialização em comida italiana, comida mediterrânea, e hoje eu tô abrindo um restaurante nesse segmento. Claramente vai ter um pouco da cultura brasileira também nesse cardápio, vai ter alguns pratos caiçaras. Mas o meu forte mesmo hoje é a gastronomia italiana.

3) Como é a vida de um chef negro no Sul? Pode citar alguma experiência marcante? 

A minha vida é muito difícil aqui, porque enquanto uma pessoa precisa fazer uma coisa pra mostrar que é boa, eu preciso fazer dez, entende? As pessoas, infelizmente, ainda hoje têm receio e ficam muito espantados quando elas chamam o chef de cozinha na mesa pra fazer um elogio e eu chego, consigo notar isso nas pessoas. O racismo é muito vivo, né? Eu moro numa cidade muito alemã, que é a cidade de Blumenau. Então, é uma cidade muito colonial. Depois de tanto tempo, eu acho que hoje as pessoas já me conhecem. O meu nome já tem um peso na cidade, mas isso foi fruto de muito trabalho. Eu já passei por diversas situações. No meu último emprego, um cliente me chamou na mesa e disse pra mim que ele ia falar como eu deveria fazer a carne que ele trouxe porque o pessoal lá de cima talvez não conhecesse essa carne. Então, aí tu já entende também que é uma coisa muito triste, né. Uma situação muito complicada, muito racista. Eu já passei por muitas situações muito cruéis. Mas meu propósito foi um só, que era de vir pra cá estudar e ter o meu restaurante. E eu consegui tudo isso. Hoje, eu posso dizer que eu já sou um vitorioso. Porque pra mim, foi muito difícil essa caminhada até aqui. Eu tive outras grandes oportunidades. Eu já cozinhei pra diversas pessoas. Eu já cozinhei pra Ana Hickmann, Ticiane Pinheiro, eu já cozinhei pra alguns artistas. Hoje também trabalho como personal chef. Tenho meu restaurante, eu fiz uma especialização no mês retrasado de bolos festivos, que era uma coisa que eu sempre quis fazer. Vou implantar isso lá no meu restaurante. Quando as pessoas me procurarem para fazer aniversário, a gente já vai sugerir também o meu bolo. Eu tô muito feliz!

4) O que você diria para pessoas negras da sua região que querem iniciar na gastronomia ?

Se respeitarem mais! Eu acho que quando você se respeita, você entende o seu limite, eu acho que você pode alcançar tudo aquilo que você deseja. Em muitos momentos eu não me respeitei. Então, hoje eu me respeito, hoje eu enxergo e eu tenho a maturidade para entender o que eu preciso e o que eu não preciso. O que é tolerável e o que não é.

Justiça rejeita acusações contra Lizzo, mas empresa da cantora continua no processo

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Foto: Reprodução/Instagram

Lizzo conquistou um avanço importante em sua batalha judicial, nesta semana, com uma estilista que a acusa de ter enfrentado assédio racial e sexual, além de um ambiente de trabalho hostil, por parte da equipe de gestão da cantora durante sua turnê em 2023. A ex-funcionária também afirma não ter recebido pagamento pelas horas extras trabalhadas.

Na segunda-feira (2), um juiz federal de Los Angeles determinou que Asha Daniels, assistente de figurino, não poderia processar Lizzo como indivíduo, apontando as empresas responsáveis pela turnê e pela folha de pagamento da cantora como suas empregadoras. No entanto, a sua empresa Big Grrrl Big Touring Inc. permanece como ré no processo em andamento.

O juiz distrital dos EUA, Fernando L. Aenlle-Rocha, rejeitou todas as sete acusações apresentadas contra Lizzo e sua empresária, Carlina Gugliotta.

O juiz também aceitou parcialmente um pedido para rejeitar várias das reivindicações, justificando que Daniels trabalhou para a empresa durante uma turnê na Europa, onde as leis trabalhistas dos Estados Unidos não têm validade.

Entenda o caso

A estilista Asha Daniels acusou Lizzo de liderar uma “cultura de trabalho insegura e sexualmente carregada”. A artista nega. Ela também acusou a gerente de guarda-roupa da artista de fazer comentários “racistas e gordofóbicos” e de ridicularizar mulheres negras na equipe.

Em resposta, um porta-voz de Lizzo classificou o caso como um “golpe publicitário absurdo”, enquanto seus advogados descreveram Daniels como uma ex-funcionária “descontente” com alegações “sem mérito e obscenas”.

As alegações de Daniels refletiram as denúncias de três ex-dançarinas da turnê da cantora, que em agosto do ano passado moveram um processo contra ela, alegando assédio sexual e humilhação por questões de peso em incidentes ocorridos entre 2021 e 2023.

Na época, Lizzo negou as acusações, afirmando que “essas histórias sensacionalistas vêm de ex-funcionários que já admitiram publicamente que foram informados de que seu comportamento em turnê foi inapropriado e pouco profissional”. A cantora e sua empresa, Big Grrrl Big Touring, pediram que o tribunal arquivasse o caso. As ex-dançarinas, no entanto, solicitaram um julgamento com júri.

Apesar das controvérsias, Lizzo — cujo nome verdadeiro é Melissa Viviane Jefferson — garantiu a seus fãs em abril deste ano que não planeja sair dos holofotes. Em uma publicação, ela inicialmente escreveu “Eu desisto”, expressando cansaço por ser alvo de críticas à sua aparência e caráter online. Mais tarde, em um vídeo, esclareceu: “Quando digo ‘eu desisto’, quero dizer que paro de dar atenção a qualquer energia negativa.”

Primeira Doutora negra do Brasil, Helena Teodoro é homenageada com e ocupação no CCBB em São Paulo

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Foto: Divulgação

Nesta sexta-feira, 6, o Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo (CCBB SP) inaugura a ocupação Trilogia Matriarcas, uma homenagem à vida e obra de Helena Theodoro, a primeira doutora negra do Brasil. A programação gratuita, que marca os 80 anos da pensadora, destaca sua atuação em defesa da cultura afro-brasileira e na luta contra o racismo. Com espetáculos teatrais, exposições, debates e oficinas, o evento apresenta um panorama do legado multifacetado de Helena.

O eixo principal da ocupação é a trilogia teatral Matriarcas, que reúne três montagens inspiradas nas vivências de Helena Theodoro e nas narrativas de mulheres negras. A peça Mãe de Santo, com dramaturgia de Renata Mizrahi e direção de Luiz Antônio Pilar, tem Vilma Melo no papel principal e aborda temas como ancestralidade e espiritualidade. Já Mãe Baiana, estrelada por Dja Martins e Luiza Loroza, tem texto, inspirado na própria experiência de Helena ao perder um filho. Por fim, Mãe Preta, com dramaturgia de Valesca Lins, retrata a superação de perdas e a reconstrução de uma mulher como pilar de sua comunidade.

Além das peças, a exposição Baobá de Memórias – uma homenagem à Léa Garcia presta tributo à atriz em seu último trabalho, na versão audiovisual de Mãe Baiana. A mostra reúne fotos, figurinos e um labirinto de turbantes, além de exibir uma instalação central em forma de baobá.

Complementando a ocupação, seis mesas de debate trarão temas como escrevivências femininas, o sagrado feminino e a diversidade, com participações de nomes como Sueli Carneiro, Elisa Lucinda e Luana Xavier.

Programação amplia vivências culturais

O público também poderá participar de palestras, oficinas e apresentações musicais. Entre os destaques estão as oficinas de sonoridades com Dani Nega (15/12) e de dança afro com Fernanda Dias (22/12), além da palestra de Helena Theodoro sobre as filosofias africanas (7/12).

Confira a programação completa no site do CCBB SP (CLIQUE AQUI)

A branquitude desmorona se nos unirmos

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Protesto contra a violência policial em agosto de 2023. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Os episódios recentes de violência policial contra pessoas negras são de embrulhar o estômago. Aliás, estudos da Rede de Observatórios da Segurança indicaram que, em 2023, quase 90% dos mortos pela polícia eram pessoas negras. Eu não sou ingênuo ao ponto de acreditar que essa violência estampada nos noticiários nunca me alcançará. Nenhuma pessoa negra tem segurança garantida, e encontrar maneiras de acabar com essa condição é a necessidade imediata.

Acho interessante a reflexão de Antônio Pompêo (1953-2016), ator e militante do movimento negro: “O racismo é uma serpente de muitas cabeças. Damos um golpe no seu corpo e ela se multiplica.” Logo, a eliminação do processo de genocídio exige ampla cadeia de ações envolvendo todos os aparelhos que organizam a sociedade. E claro, a maioria das instituições deve ser recriada sem qualquer rastro ideológico da sua atual estrutura de funcionamento. Contudo, a unidade negra é basilar para cobrar as mudanças.

Na semana passada, li nas redes sociais discursos que impõem obstáculos na construção dessa unidade. Infelizmente, há pessoas utilizando desse expediente. Elas desconsideram as lutas do Movimento Negro, representado por organizações e instituições, intelectuais, políticos, militantes e ativistas, artistas e pessoas comuns.

Chamo a atenção para um dos resultados da pesquisa Datafolha, divulgado recentemente: 60% das pessoas que se autodeclaram pardas não se consideram negras. Esse dado acendeu um alerta. Sabemos que para as pessoas se assumirem pardas foi um longo processo de debate e fomento de políticas públicas; e, conforme o Estatuto da Igualdade Racial, a população negra é o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas e pardas. No caso desta última, segundo o IBGE (2022) “a pessoa que se declarar parda ou que se identifique com mistura de duas ou mais opções de cor ou raça, incluindo branca, preta, parda e indígena.”

O racismo até convenceu alguns pardos de que eles eram brancos, mas a ausência de privilégios atestava que não passava de uma mentira. Portanto, se permitirmos discursos que nos separam, a supremacia branca seguirá fortalecida e praticando o extermínio da população negra.

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