Mundo Negro

“De homem branco para homem branco” o impacto do discurso do Tiago Leifert na branquitude

Foto: Reprodução/BBB21

Desde o último final de semana um assunto tomou conta das redes sociais, BBB21 e o racismo por trás da fala do cantor sertanejo Rodolffo “O seu cabelo tá parecendo o do João” disse Rodolfo comparando o cabelo de uma peruca de um personagem pré-histórico com o cabelo crespo do professor João Luiz.

João rebateu a comparação, mas na hora não conseguiu fazer mais do que dizer que não parecia, e quando teve a oportunidade conversou sobre o assunto com a sua amiga, também negra e do cabelo crespo Camilla de Lucas. Em uma cena de acolhimento e identificação, Camilla e João se abraçaram e sentiram juntos a dor do racismo, mais uma vez.

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Na última segunda-feira, no “Jogo da Discórdia” João deu uma “flechada” no cantor sertanejo e explicou o porquê a comparação o ofendeu

“É um momento de muita coragem poder estar falando disso aqui agora, mas o Rodolffo chegou a fazer uma piada comparando a peruca do monstro da pré história com o meu cabelo. Então isso pra mim, tocou num ponto muito específico, o jogo pode ser sim, de coisas que a gente vive aqui dentro, mas também tem que ser um jogo de respeito”

Em sua defesa, Rodolffo manteve a comparação entre a peruca da fantasia e o cabelo crespo do João

“Se todo mundo observou como era a peruca do monstro, acredito eu, que é um pouco semelhante! E isso não tem nada a ver”

O assunto tomou proporções inimagináveis aqui fora, pessoas negras famosas e anônimas apontaram o racismo na fala de Rodoffo e o porquê de comparações como essas machucarem tanto, enquanto outras pessoas disseram que tudo não passava de vitimismo da parte de João.

O assunto foi tão repercutido que quebrando um dos protocolos do programa o apresentador Tiago Leifert decidiu ter uma conversa com Rodolffo sobre o ocorrido na noite de eliminação:

“Eu vi sua defesa, bastião. E quando eu era mais novo, no colégio, também brincavam com meu cabelo. Aliás, o pouco que me resta não é liso. As pessoas brincavam que era cabelo de lixa, mas isso nunca fez a menor diferença para mim. Um cabelo black power não é um penteado. É mais do que um penteado. É um símbolo de luta, resistência, foi o que os pretos americanos usaram como símbolo antirracista, eles vestiam o black power para mostrar que eles se amavam. Há pouquíssimos anos atrás uma pessoa negra tinha que levantar de um ônibus para um homem branco sentar. Historicamente, o cabelo do João foi associado a uma coisa errada, suja, feia. Não existia cosmético para a pele da Camilla até pouquíssimo tempo atrás. E é por isso que quando a gente faz um comentário sobre o cabelo do João não é sobre um penteado. Você está falando de um símbolo, da ancestralidade do João, tem muito aí” disse o apresentador e jornalista

“Eu não vejo maldade no que você fez e ao mesmo tempo legitimo a dor do João. Porque tem milhares de meninos e meninas pretos e pretas que sentem a dor que o João sentiu. E a dor que o João sentiu não discerne entre um comentário ingênuo e um comentário maldoso […] O sem querer e o de propósito doem do mesmo jeito.” Continuou Tiago.

O discurso do Tiago foi muito bem recebido nas redes sociais, pessoas dizendo que tinham finalmente entendido toda a questão e o quanto o apresentador foi necessário e sensato em suas palavras

Mas o que nos assusta é que tudo isso e muito mais já havia sido dito pela Camilla De Lucas na noite anterior, e enquanto ela tentava explicar a problemática para Rodolffo, o sertanejo seguiu ‘sem entender’ e a interrompia com frequência.

Num nítido exemplo do quanto a branquitude se escuta, Tiago começou a conversa com Rodolffo dizendo que era um papo “De homem branco para homem branco” e o cantor não tentou se defender enquanto Tiago falava e se mostrou atento durante todo o discurso. 

Essa cena é muito comum aqui fora, quando pessoas pretas apontam racismo e tentam explicar porquê houve racismo, são vistos como vitimistas e “mimizentos” agora quando pessoas brancas pontuam as mesmas coisas, elas são ouvidas. E mais uma vez o protagonismo vai para… 

Temos bons exemplos disso nas versões anteriores do próprio programa, em 2019 com um grande número de participantes negros, que abordavam assuntos raciais e sociais uma racista foi a campeã, e em 2020 mulheres brancas que pontuaram as mesmas questões foram apelidadas de “Fadas sensatas”. Nós sabemos quem brancos acolhem e quem eles escutam, aos seus semelhantes.

Após o discurso do Tiago o assunto voltou a ficar em alta nas redes, e com isso, os ataques também aumentara! Enquanto João e Camilla se tornaram os “chatos, mimizentos” Tiago Leifert foi enaltecido como necessário:

Comentários na página do João:

Foto: Reprodução/Instagram

Comentários na página da Camilla de Lucas:

Foto: Reprodução/Instagram

Enquanto os comentários sobre o discurso do Tiago foram em sua maioria positivos! O apresentador, em defesa do Rodolffo repetiu diversas vezes que não foi a intenção do cantor e que ele não sabia, e em uma indireta aos militantes negros disse que a solução não é “Tacar fogo no Rodolffo” fazendo referência a frase “Fogo nos racistas!” que ganhou força no último ano.

As tentativas de defender quem ofende são maiores que a tentativa de entender e acolher aquele que foi ofendido, e isso é o que o racismo faz, no final das contas, João se tornou o vilão da história, pois constrangeu o racista que só foi racista por “falta de informação”

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