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Nos últimos dias tivemos notícias de duas gestações que fizeram nossos olhos brilharem. A atriz e cantora Jéssica Ellen e o ator Dan Ferreira anunciaram a gravidez do primeiro filho ou filha do casal. Dias antes, sorrimos com a gravidez de gêmeos da dentista Elis Regina Valentim e seu esposo, o jornalista Marcos Luca Valentim. Longe de romantizar as relações maternas e paternas, mas celebrar a vida e o amor negro faz parte na nossa militância.
Nos últimos anos falamos principalmente sobre as relações afrocentradas e a importância do amor negro. Mas para que a gente pudesse celebrar nas ruas e nas redes sociais nossos amores negros ocorreu uma luta política e o combate de ideologias sociais.
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No Brasil pós-abolição da escravatura os casamentos interétnicos foram incentivados a fim de diminuir o número de negros na população nacional. A ideia de democracia racial teve muito sucesso, ela foi difundida no Brasil no início do século XX e contou com a participação de intelectuais como Gilberto Freyre. De forma muito geral, essa vertente teórica e ideológica afirmava que no Brasil as diferentes raças convivem harmoniosamente num paraíso sem discriminação racial. E as relações sexuais entre brancos e negras era um exemplo dessa suposta democracia racial. Certamente, você já está com certa raiva de Freyre, vamos então para outra ideia: a política de branqueamento. Com ações sistemáticas nosso país desenvolveu uma campanha massiva de entrada de europeus no final do século XIX e início do século XX com o objetivo de criar, a longo prazo, uma nação branca. Falharam.
Voltando mais um pouco no tempo e chegamos na colonização e na retirada violenta de africanos de seu continente de origem para trabalharem à força nas Américas. As famílias eram desfeitas, no Brasil houve a tentativa de construção de novos laços, porém sempre a partir da negociação e do conflito com seus respectivos senhores. Ainda sobre a violência colonial, os escravizados presenciavam a tortura de seus irmãos e não podiam os acolher, pois era possível que o castigo se estendesse a eles próprios. Cuidar das feridas dos iguais era um risco, que muitos resolveram correr.
A colonização e a colonialidade imprimiram em nossas mentes que o corpo negro é mais apto ao trabalho, é mais resistente e forte. Ele é também um corpo destoante do padrão de beleza, que é branco. Foram muitas as mentiras difundidas massivamente sobre a gente. Essa difusão teve consequência nas nossas relações afetivas. Você deve estar se perguntando, mas esse texto não era sobre amor? Também. Tive que falar de dor para falar de afeto.
A valorização da beleza negra foi e é pauta de luta do Movimento Negro. O bloco afro Ilê Aiyê teve importante participação na busca por essa valorização ao promover pela primeira vez em 1979 o concurso Noite da Beleza Negra, exclusivo para mulheres negras. Já em 1991, a frase “Reaja à violência racial. Beije sua preta em praça pública” que abre o poema “Bandeira”, escrito por Lande Onawale, foi publicado no jornal do Movimento Negro Unificado (MNU). Além do texto, uma fotografia de um casal negro se beijando compunha aquele número. A edição ficou famosa e ainda hoje a utilizamos como um lema em defesa ao amor negro. O poema vai virar documentário. A cineasta Camila de Moraes está trabalhando numa obra audiovisual sobre as relações afetivas de famílias negras. Já queremos assistir nos cinemas de todo país.
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Para não dizer que não falei de flores. Voltamos para os afetos. Amar é um ato revolucionário, quando se é negro essa ação é duplamente revolucionária. Como a arte também revoluciona termino esse texto com um trecho da música Dengo de Thiago Elninõ: “Famílias pretas são sementes de comunidades vivas/ Por isso que eu dou minha vida/Pra nunca deixar morrer/ Essa coisa bonita que entre nós se fortifica/ Preta, hoje tu tá linda, então deixa o tempo correr”. Na música, no cinema, nas revistas, nas ruas, nas praças, nas redes sociais vamos enaltecer os amores negros.
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