Minhas filhas mudaram de escola. Tivemos que comprar novos uniformes. Por ser um colégio tradicional, quis garantir que encontraríamos todas as peças, das três crianças,  então antecipei a compra dos uniformes para novembro. Quando as aulas começaram em fevereiro, elas reclamaram que as calças estavam desconfortáveis. Consegui trocar. Ainda não ficaram satisfeitas. Na segunda troca, a vendedora, a mesma que vendeu e realizou as trocas, disse que talvez fosse o caso delas compraram um outro modelo, que ela só não me ofereceu de primeira, por ser 20 reais mais caro. Ou seja, ao ver uma mãe negra com três filhas de escola particular, ela assumiu que não teríamos dinheiro para comprar o uniforme com melhor tecido e acabamento, e nos vendeu o mais barato sem nem me oferecer as opções. Se fosse o caso de optar pelo mais barato, o que eu provavelmente faria antes de saber da má qualidade, deveria ser uma decisão minha e não dela. E foi um grande transtorno.

O racismo à brasileira tem dessas. É sutil, subliminar, mas quase onipresente em espaços públicos.

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Os recentes casos de racismo envolvendo homens negros em restaurantes, Burguer King no Brasil e Startbucks nos EUA, repercutiram fatos que não aconteceram pela primeira vez e nem a última, e que exemplifica a forma como funcionários de estabelecimentos comerciais ainda associam a comunidade negra ao crime e extrema pobreza ou a alguém não merecedor de estar em certos espaços, por tanto, sujeitos a comportamentos racistas e preconceituosos de que quem deveria os servir.

O CEO da Startbucks Kevin Johnson, ao invés de mandar assessoria de imprensa emitir o boletim padrão que varias empresas publicam quando são acusadas de racismo, onde alegam ser a favor da diversidade e contra discriminação ( mas jamais reconhecem que precisam mudar),  assumiu a responsabilidade pelo ato da loja em Filadélfia, onde dois jovens empresários foram presos, após um funcionário da loja chamar a policia alegando que estavam no local sem consumir. “Eu conserto, é responsabilidade minha”, repetiu Johnson em diversas entrevistas que deu.

Resolvi perguntar aos nosso leitores sobre situações de constrangimento que eles sofreram em estabelecimentos comerciais  Seguem alguns casos (os nomes das vítimas não serão divulgados):

 Negra, grávida e perseguida na loja

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“Fomos fazer compras eu, minha irmã grávida de 33 semanas e o pai da minha filha. Quando entramos no corredor dos produtos de toucador ‘ por acaso’ encontramos o segurança mexendo no celular no mesmo corredor. Cada corredor que a gente ia ‘por acaso’ de novo encontrávamos com ele.

Esse ” por acaso” aconteceu inacreditáveis cinco vezes, até que a minha irmã parou o carrinho e falou diretamente pra ele que o valor do cartão que ela estava carregando era no mínimo duas vezes o salário dele. Então encontrei uma funcionaria no corredor e falei que tinha a moral de largar o carrinho no meio do mercado, reclamar na central e colocar no Reclame Aqui.

Ah, a resposta que recebi:
“Foi um terrível mal entendido… A senhora me desculpe isso não vai acontecer mais…”

Pra finalizar, passamos no caixa e quem tava no cantinho com o rabicó entre as pernas, e cara de capitão do mato? O lixo orgânico que alguém denominou segurança. 
Foi no mercado no mercado Extra Cursino Zona Sul de São Paulo.”. 

Ninguém me atendeu

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“Meu pai me deu uma bolada para comprar roupas, sapatos, bijuterias, bolsa, o pacote completo. Entrei numa loja, estava vazia e ninguém me atendeu. Dei uma olhada e saí. Fui em outras lojas e comprei tudo que podia e não podia, passei em frente a loja onde fui ignorada, cheia de sacolas e ficaram todas espantadas. Eu não compro em loja racista.”

Brancos não me querem lá 

“Fui a um supermercado de luxo em um shopping da minha cidade, Recife, e lá dentro fomos perseguidos por um segurança. Ele estava em todos os corredores em que nós estávamos, foi um constrangimento ímpar. Acabamos indo embora e desde então tive receio em visitar esse shopping. Ainda não consigo me sentir confortável em locais elitistas e frequentados por pessoas brancas, eles não me querem lá.”

 Todos me olharam como se eu fosse ladra

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“Em uma loja de roupas de Porto Alegre. Estava com uma amiga branca, olhamos algumas peças, experimentei algumas, gostei e decidi levar. A compra deu um valor de trezentos reais. Quando a moça do caixa passou meu cartão a transação não completou. Pedi para passar novamente, o mesmo problema. Calmamente perguntei ‘você está passando no débito? ‘, resposta ‘desculpa, achei que era no crédito ‘. Até aí tudo bem. Saímos da loja com as sacolas, começou um sinal sonoro, não demos bola. Poucos metros depois tem um segurança atrás de nós, ‘moça, poderia retornar a loja, acho que deu algum problema com suas compras ‘. Ele foi direto em mim. Uma vergonha tomou conta do meu ser, todos que estavam por perto me olhavam como se eu fosse uma ladra. A moça não tirou o lacre de segurança. A gerente da loja, que é negra, conseguiu me tranquilizar, e disse que o caso não ficaria assim. A moça foi despedida, não foi o primeiro caso de racismo em que ela esteve envolvida. Aliás a gerente me disse que inclusive ela não aceitava suas ordens e questionava sua forma de trabalhar.”

Assim como no caso da Starbucks, filmar ações racistas praticadas por funcionários ou qualquer tipo de flagrante de abuso, tem sido um procedimento muito usado para dar o flagrante.

A cor da pele não pode ser motivo para arruinar a experiência de sair para comer ou fazer compras. Se sentiu ofendida ou ofendido, reclame. Às vezes é necessário um escândalo para mudar o padrão de atendimento, mas mesmo de forma mais discreta, como uma baixa nota da página da empresa no Facebook, por exemplo, já pode render bons resultados.

 

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