A sistemática repressão policial, dado o seu caráter racista − segundo a polícia, todo crioulo é marginal até que se prove o contrário − tem por objetivo próximo a imposição de uma submissão psicológica através do medo. − Lélia Gonzalez
Texto: Ricardo Correa
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Os brancos sempre procuram se esquivar das acusações que mencionam os seus privilégios. Eles mudam de conversa, resmungam, confrontam e até alteram a fisionomia mesmo em silêncio. Isso acontece tanto com aqueles que se assumem aliados (os posicionados politicamente à esquerda) e os defensores das práticas racistas (os posicionados politicamente à direita). Apesar de que os comportamentos racistas independem do campo ideológico, portanto a crítica cabe para ambos os grupos. Os brancos não querem reconhecer o fato de que as suas vidas são permeadas de privilégios em cima do sofrimento do povo negro. Eu até imagino o choque que sentem ao ouvir que tudo conquistado é resultado de privilégio racial. O orgulho construído em função do mérito é golpeado, pois acreditam que os próprios esforços foram responsáveis pelas conquistas pessoais (diplomas, bens materiais, bons empregos). Eu também compreendo que essa crença é reforçada pela educação, afinal, desde a infância somos estimulados a acreditar na meritocracia. Por exemplo, os pais presenteiam os filhos por se comportarem adequadamente, tirarem notas boas na escola, etc. Os professores na sala de aula estimulam o comportamento operante dos alunos: entregue o trabalho, ganhe ponto positivo; não entregue o trabalho, ganhe um ponto negativo. Nessa lógica que contamina, as crianças crescem achando que na sociedade somente prospera quem se esforça.
Por outro lado, os negros, em sua maioria, são ensinados no ambiente familiar um pouquinho diferente. Muitos pais e parentes dizem que devemos duplicar os esforços com relação aos brancos, assim seremos “alguém na vida”. No entanto, mesmo seguindo literalmente essa orientação o resultado quase sempre é desfavorável.
Seguimos com a vida estagnada na mesma condição social que iniciamos a jornada de esforços, somos tomados por frustração, adoecimento (físico e mental), entre outras situações lamentáveis. Na dinâmica do capitalismo a lógica que sustenta as desigualdades raciais opera em concordância: estagnação/declínio econômico de uma massa de negros e ascensão econômica dos brancos. Isso é um fato inconteste.
Com essas questões entranhadas na cultura brasileira, os “aliados” confrontam os nossos apontamentos, e, inconformados, apelam para a questão de classe. Argumentam que “negros e pobres brancos na favela são todos iguais”, e por essa razão não podem ser tachados de privilegiados. Como se a cor da pele não fosse o fundamento que coloca os brancos em vantagem. Nem tudo é material, ora essa! Não precisamos de nenhuma explicação complexa para contestar o fator classe como parâmetro de igualdade entre negros e brancos numa sociedade racista. O simbólico − representado pela raça −, sempre se sobressai quando a igualdade é aparente. Se não fosse assim, a epígrafe deste texto estaria equivocada, e os negros não seriam a maioria dos mortos em ações policiais.
Tenho a impressão de que os “aliados brancos” pensam em combater o racismo somente na superfície, ignorando completamente a abolição dos privilégios para não afetar suas vidas. Isso não é antirracismo. Portanto, se eu estiver correto não podemos acreditar em uma aliança com potencial de mudança coletiva e revolucionária. O combate ao racismo passa pelo compromisso dos brancos no repúdio aos próprios privilégios, que, enquanto existirem, poderão ser utilizados no processo de luta. E ninguém precisa dizer que existem pessoas brancas empenhadas na justiça racial. Eu acredito. Entretanto, continuo me apegando às palavras do revolucionário sul-africano Steve Biko “Claro que existem alguns brancos bons tanto quanto existem alguns negros ruins. No entanto, o que nos interessa aqui são as atitudes de grupo e a política de grupo. Uma exceção não faz uma mentira ou a regra − ela apenas a fundamenta.”
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