Uma nova pesquisa deixa um alerta sobre a saúde mental dos jovens no mundo. O Brasil lidera ranking de jovens com que sofrem com questões relativas a autoestima, seja em relação a sua aparência, seja sobre a auto-percepção sobre a sua inteligência. Os brasileiros entre 16 e 24 anos lideram as queixas em relação a autoestima, isolamento social e conflitos familiares de acordo com os dados divulgados em agosto pelo Panorama da Saúde Mental, criada pelo Instituto Cactus, em parceria com a AtlasIntel.

Em um país que ainda carece de referências para adolescentes e jovens adultos negros, não seria exagero afirmar que há uma grande probabilidade de que este seja um dos grupos mais afetados com questões relativas à saúde mental. Por isso se faz necessário um recorte racial para entender o que um dos pontos que mais o afetam: a baixa autoestima. Vanessa Rodrigues, psicanalista antirracista, afirmou em entrevista ao Mundo Negro, no especial sobre Setembro Amarelo, que “os adolescentes são mais suscetíveis a esse sintoma e a depressão”.

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“O desenvolvimento do lóbulo pré-frontal está em pleno vapor. Essa parte do cérebro é responsável pela regulação das atividades afetivas. Junta-se a isso a descarga de hormônios experimentados pelo corpo pela primeira vez causando novas sensações e desejos. Isso pensando do ponto de vista neurobiológico. Sem contar as mudanças físicas nos corpo, que acontecem muitas vezes de maneira abrupta, sem tempo para a adaptação da mente para a mudança do infantil para a puberdade. Tudo acontece rápido e a sensação de que tudo é urgente aumenta. Muitas coisas pra viver, com a sensação de que não se está preparado. De que seu corpo é insuficiente”, explica.

Vanessa Rodrigues (Arquivo pessoal)

Além de todas essas mudanças, Vanessa destaca como as cobranças de comportamentos fomentada pela escola, pelos pais, colegas e redes sociais também afetam a saúde mental. No caso das redes, “impõe padrões de comportamento e estética, que na maioria das vezes é alienado da realidade e da materialidade do cotidiano do adolescente. É difícil para um sujeito que está passando por isso tudo, se manter calmo e confiante. Mesmo com uma boa base familiar e rede de apoio, os adolescentes tendem a se sentir bombardeados pelas novas ‘exigências’ da vida adulta. É preciso acolher este processo. E quando não há acolhimento, estes sintomas podem se intensificar”.

Segundo Vanessa, a família deve preparar a criança para a fase da adolescência e alerta para os sinais de quando algo está bem. “Muitos pais não entendem o distanciamento que os adolescentes tomam deles e interpretam, muitas vezes, a necessidade que eles têm de ficar sozinhos ou introspectivos como sintomas”. E completa: “Pode haver mudança de apetite, dificuldades ou problemas para dormir, sensação de medo e perigo, pensamentos obsessivos, taquicardia, suor excessivo, pensamentos negativos sobre si mesmo, redução da concentração, perfeccionismo e sentimento de solidão”.

A psicanalista também avalia como as redes sociais, em especial o TikTok, podem causar danos emocionais em adolescentes negros. “Há uma espécie de normatização inatingível, pois todo esse padrão dito de perfeição só pode ser alcançado a partir dos filtros das redes. Esse processo é ainda mais insalubre para os adolescentes negros. O padrão estético imposto não abarca a diversidade dos corpos e a real beleza da população negra. Os adolescentes tendem a projetar a diferença como defeito, insuficiência criando para si mesmo um olhar distorcido e desconexo com a realidade. Sem contar a possibilidade de estarem expostos a conteúdos de violência racial, situações de assédio e cyberbullying, causando sentimentos de ansiedade, depressão e baixa autoestima”.

Vanessa Rodrigues (Foto: Arquivo pessoal)

Para finalizar, Vanessa reforça a importância do papel da família para o bem-estar emocional dos adolescentes. “É preciso incentivar o autocuidado, recomendar cautela com os conteúdos expostos nas redes e nos compartilhamentos de informações. Os responsáveis devem acompanhar o uso das mídias sociais dos adolescentes, incentivando-os a ter uma atitude crítica em relação aos conteúdos. Promover tempo de qualidade fora das telas ou redes sociais .É importante orientar os adolescentes para que abandonem as redes, todas as vezes que se sentirem mal. Que eles possam procurar um lugar de apoio e acolhimento com a família e tutores”.

Aos 12 anos, Miguel Ângelo dá aula de boa autoestima

Em contrapartida ao que normalmente ocorre, levantado pela Vanessa, o ator mirim Miguel Ângelo, de 12 anos, é um adolescente superconfiante, mas entende porque a baixa autestima ocorre entre os jovens desta faixa etária. “A aceitação de um adolescente, principalmente negro, é muito difícil. Porque eles vão ver aquelas pessoas que estão no hype, que são brancas e no máximo um light skin e que tem um cabelo totalmente diferente do dele. Por exemplo, o meu cabelo é 4C e o cabelo que tá muito em alta é o cabelo 3A para baixo. [Os adolescentes] ficam tipo eu não sou o ideal, porque minha pele é muita escura, meu cabelo é muito crespo. Eles não serão páreos para a aceitação”, diz em entrevista ao Mundo Negro. 

Foto: Jordan Vilas

Apesar da pouca idade, o protagonista da novela infantil do SBT ‘A infância de Romeu e Julieta’ foge das estatísticas e agradece à mãe pela autoestima elevada. “Minha mãe sempre falou que eu sou lindo, que eu posso fazer o que eu quiser, que meu sorriso lindo, que minha pele é linda e que sou descendente de reis e rainhas. Eu acho que isso é muito importante para que no futuro, a criança tenha uma boa autoestima”, destaca o ator.

Além da base familiar, Miguel também acredita no poder do humor para a saúde mental. “O humor, como o Paulo Gustavo disse, também salva vidas. É uma forma de esvaziar a sua mente”.

Segundo o ator, muitos adolescentes cabam desativando as contas nas redes sociais por serem muito nocivas para a saúde mental. “As pessoas tem mania de não mostrar muito o seu rosto. E quando elas te xingam, tacam hater pesado em cima de você, isso vai afetando o psicológico”.

Entre outros métodos que a mãe Vania Regina da Silva, 54, também usa para fortalecer a autoestima de Miguel é a leitura de livros com protagonismo negro. “A gente leu todos do Lázaro Ramos, ‘Na Minha Pele’, Você Não é Invisível. Eu também li o Malcolm X, Nelson Mandela, que ganhei do Pastor Henrique Vieira, ‘A Princesa e a Ervilha’ e O Pequeno Príncipe Preto’ do Rodrigo França”, finaliza citando obras incríveis.

Foto: Jordan Vilas

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