Eu acredito que quando eu era criança, se tivéssemos passado por uma situação como a que estamos vivendo com essa Pandemia, eu me recordaria, com muito afeto e alegria, dos dias que passei junto com a minha mãe e meu pai dentro de casa, e tudo que fizemos juntos.
Meus pais trabalhavam muito quando eu era pequena. Minha mãe era auxiliar de enfermagem e trabalhava numa jornada de 12×36 horas, ou seja, ela estava em casa um dia sim e outro não (incluindo os finais de semana). Meu pai era gráfico, na cidade do interior paulista, onde morávamos, ele não conseguia trabalho, então, por boa parte dos anos, ele trabalhava na capital e só voltava para casa aos finais de semana.
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Acho que não ficou nenhum trauma grave, por causa dessa ausência, mas ficaram boas lembranças de quando estávamos todos em casa e podíamos fazer as refeições juntos, brincar, assistir televisão ou passear. Ficou na memória também, quando meu pai tomava a tabuada, ou pedia para ver meus cadernos, eu me sentia cuidada e amada.
A realidade de muitas famílias é igual à da minha infância: pais ausentes por muitas horas e a alegria das crianças em vê-los voltar para casa. Mas tudo mudou bruscamente: pais e filhos o dia todo dentro de casa, o dia todo (eu já disse, o dia todo?).
Será que dá para olhar o lado positivo?
Boa parte das crianças que estudam em escolas públicas estão sem aulas. Essa ausência do ensino, do aprendizado pode estar deixando as crianças angustiadas, com medo de não aprender, ficar para trás e perder oportunidades.
Eu sei que a rotina está complexa, são muitas demandas para os adultos, mas sugiro um exercício para acalmarmos o coração dos pequenos e a angústia pela falta das aulas, ou mesmo com aulas EAD. Faça uma educação antirracista.
Muitas vezes a gente reclama do que é ensinado na escola, principalmente se estamos falando sobre cultura africana e afro-brasileira. Então, a minha proposta é que vocês, pais e criadores de crianças pretas, realizem uma nova educação para os pequenos. Não precisa necessariamente ser conhecedor da cultura africana e afro-brasileira para isso. Resgate o que você sabe, resgate a sua ancestralidade presente. Como? Assim:
- Conte sobre as histórias da sua família, as histórias de quem veio antes.
- Resgate a música favorita e apresente para as crianças, vejam a letra e os significados. Sambas-enredos renderão boas conversas
- Sabe aqueles passinhos que dançamos tanto nos bailes de charme? Será a aula de hoje aqui em casa!
- Pegue o álbum de família e conte uma história curiosa sobre aquele momento ou aquelas pessoas.
- Relembre aquela receita deliciosa e faça junto com as crianças.
- Façam bonecas Abayomi juntos.
- Façam turbantes e amarrações de tecidos africanos e estudem (brinquem também) sobre os reinos da África.
- Busque na internet provérbios africanos e reflitam sobre eles.
- Descubra inventores, cientistas, escritores, pesquisadores negros e relembrem as histórias deles.
- Tem tantos contos e histórias da mitologia Africana, dos Orixás, espalhados por aí, vale à pena procurar.
Vivenciar isso juntos é resgatar e manter a ancestralidade presente, manter a essência de quem são!
Você também pode se aprofundar mais nessa proposta. Lei ou assista vídeos no Youtube sobre temas importantes para a formação de uma consciência antirracista e converse com as crianças sobre o assunto, torne-se o professor de assuntos essências para a vida e formação dessas crianças.
Uma mãe, seguidora do Criando Crianças Pretas, pela passagem do dia 13 de maio, me pediu conteúdo para crianças do ensino infantil, que falasse sobre a data. Ela estava aborrecida com os vídeos que a escola havia mandado. Como não encontrei na internet materiais que pudessem atender à demanda, sugeri que ela assistisse vídeos e lesse textos para produzir, ela mesma, um conteúdo para a filha.
Esse período ficará guardado para sempre na cabeça das crianças. Sei muito bem, e na pele, que para nós adultos, está sendo, com muita frequência, um verdadeiro caos, mas um provérbio Africano diz: Se você pode andar, você pode dançar. Se você pode falar, você pode cantar. Dance e cante para tornarmos esses dias mais leves. Eu estou tentando.
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