Em março, o assassinato da vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Pedro Mathias Gomes, completa um ano e ainda não sabemos por quem e o motivo pelo qual a vida de uma mulher negra eleita pelo povo foi interrompida de forma tão violenta. Desde a morte da vereadora, temos testemunhado pelos noticiários e redes sociais crimes e abusos em relação aos direitos humanos do brasileiros, sobretudo da população negra. A morte do jovem Pedro Gonçalves a luz do dia dentro do Hipermercado Extra, no RJ, mostra o extremo que a sociedade brasileira chegou, visto que seu assassino está solto.
Porém a esperança é maior que o medo. A eleição de nomes relevantes para uma corrente política que preza pela humanidade e direitos iguais, é a luz no final de um túnel onde um presidente como Jair Bolsonaro, não é um aliado das pautas progressistas. Nessa última terça-feira, 26, a deputada Renata Souza, do PSOL, assumiu a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro. Ela é a primeira mulher negra no comando dessa pasta, criada há 20 anos e que atende vítimas de violações de Direitos Humanos além de analisar e discutir as propostas dos deputado e políticas públicas.
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“Por dez anos trabalhei nesta comissão ao lado da minha amiga e vereadora Marielle Franco. Assumir a presidência hoje é ter a certeza de que nosso trabalho, construído na última década junto com o deputado Marcelo Freixo, terá continuidade. Quando uma mulher negra ocupa um lugar que socialmente foi negado para nós, ela representa todas as mulheres. Mães que perderam seus filhos para a violência do estado, esposas que perderam seus maridos em serviço, mães que não conseguem matricular seus filhos na escola por não ter vaga e tantas outras mulheres negras que batalham diariamente para sobreviver”, diz a deputada Renata Souza.
Conheça mais sobre o trabalho da Deputada por meio dessa entrevista exclusiva para o Mundo Negro.
- No momento atual do país, qual a importância de ter uma mulher preta como deputada estadual?
R: É importante porque esses lugares são os espaços que legislam sobre os nossos corpos os nossos, corpos negros, nossos corpos de mulheres então a gente precisa estar na construção de políticas públicas na ponta dessa construção pra propor ideias e políticas que possam resguardar nosso direito a vida. Quando a gente fala de feminicídio de homicídio os dados são concretos né, a gente vê que são as mulheres negras que mais morrem e são assassinadas. Aí na lógica do feminicídio, nos últimos 10 anos cresceu em 22% o número de assassinatos de mulheres negras enquanto de mulheres brancas diminuiu. Isso é um absurdo se você olhar sob o ponto de vista da política em quais são as políticas públicas hoje pra reduzir o número de feminicídio, quais são as políticas hoje pra reduzir o número de homicídios em especial da nossa juventude negra então a gente precisa estar nesses espaços pra poder legislar sobre as nossas vidas também.
Enquanto jornalista e militante, quais foram os maiores enfrentamentos que teve?
R: Os nossos maiores enfrentamentos, assim, enquanto militante e jornalista é ser não só reconhecida e respaldada pelo movimento, num processo de construção de políticas, isso é realmente um desafio muito grande, mas para além disso a gente precisa questionar quais são os mecanismos hoje de visibilidade e de potencialização que o nosso próprio movimento enquanto pessoas negras, mulheres negras, tem viabilizado. Isso para que essas as nossas “pratas da casa”, na verdade sejam iluminadas, a gente precisa também rever a nossa construção enquanto grupo vulnerável né e estar cada vez mais juntos se construindo nessa sociedade que é extremamente racista, machista, misógina, classista. A gente precisa se colocar esses desafios para superar a lógica de desigualdade social. Isso é fundamental.
Como será sua atuação enquanto posição do governo Witzel no Rio?
R: É uma atuação muito responsável porque a gente não quer fazer uma oposição a qualquer custo. A nossa oposição é sobre uma defesa intransigente desse governo de abate daquelas pessoas que vivem nas favelas e isso pra gente é algo que nos remete a uma oposição imediata. De qualquer forma, esse mesmo governo Witzel não apresentou nenhum programa ou proposta que pudessem reduzir o número de homicídios o número de feminicídio, pelo contrario o que Witzel tem feito é se organizar a partir do abate de supostos criminosos. O Witzel quando faz isso ele está cometendo um crime contra a humanidade, afinal de contas, não temos a pena capital, que é a pena de morte e o Witzel está aplicando na pratica, a partir dos seus agentes de segurança pública. O assassinato de jovens negros na favela e nas periferias do Rio de Janeiro são pra gente, um dos pontos mais prioritários de oposição a esse governo, que corrobora com o estado de barbárie e ódio, então a gente precisa se organizar, inclusive pra fazer com que essa oposição seja produção também de alternativas de políticas públicas, para superar essa lógica de confronto de guerra organizada pelo próprio Estado.
Por muito tempo esteve ao lado de Marielle, qual o legado deixado por ela e como isso influencia no seu trabalho?
R: Bom, o legado da Marielle é um legado universal, porque com todos os temas que ela carregava e carrega para gente, temos dificuldade de falar sobre ela no passado, a Marielle é presente. Ela construiu uma base muito sólida da discussão empoderamento e visibilidade das mulheres negras, das mulheres negras na política, da favela, da periferia. Nesse lugar de poder, então sem dúvida, é um legado pra toda humanidade, porque ela fala de superação dessas desigualdades. Então se pra gente fazer com que esse legado da Marielle numa forma geral é um legado que no geral não se desumanize. A gente tem muita referência na construção do nosso mandato, da nossa mandata, gente chama assim como Marielle chamou a mandata dela, na construção de pautas que tenham relação direta com a questão da mulher da mulher negra da juventude negra e da população LGBT. Estamos construindo muito coletivamente com esses grupos que são mais oprimidos pelo Estado. Vemos o Estado como principal violador dos direitos humanos e nesse sentido quando, é ele próprio o agente de uma ação contra esses grupos, o próprio Estado é negligente com essas vidas.
Sua eleição foi considerada uma vitória para as mulheres negras. Você tem projetos voltado a elas? Quais?
R: Temos sim e sem dúvida o primeiro grande ato que a gente faz pela vida das mulheres é a CPI do hospital da mulher em Cabo Frio. Estamos observando os relatos dessas mães que perderam os filhos lá e são mulheres, mulheres negras que sofreram ali um processo de violência obstétrica. Então sem duvidas, a nossa CPI já é um elemento fundamental pra essa construção para saúde da mulher negra nesse sentido. Outras ações com relação, a por exemplo, em um debate de mais mulheres na política. Apresentamos uma proposta de emenda constitucional que diz respeito a uma observância de 50% das vagas destinadas a mulheres, com certeza as mulheres negras estarão aí. Vamos ter esse projeto votado logo assim que a pauta for definida , mas é sim também um projeto de inclusão de mais mulheres e mulheres negras na política. Outra questão para gente que é fundamental é construir um programa de redução do número de feminicídio. A gente entrou agora recentemente na composição de uma CPI que acontece na ALERJ, a CPI do feminicídio, para que a gente possa a partir de audições da sociedade, de grupos de mulheres que já estão envolvidas num trabalho preventivo pela vida das mulheres, construir um programa pra redução do número de homicídios no estado do Rio de Janeiro . Essas são as nossas propostas mais concretizadas nesse momento.
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