A hipersexualização do corpo negro fez com que renegássemos a nossa sexualidade. Não mais.

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A hipersexualização do corpo negro fez com que renegássemos a nossa sexualidade. Não mais.
Imagem: Nappy Images

A hipersexualização do corpo negro é uma pauta recorrente dentro da causa. Vemos com frequência, nossos homens e mulheres tendo seus papéis na mídia limitados a ‘entreter’ os brancos. Infelizmente, isso não é algo que começou hoje e, embora lutemos para que caminhe para um fim, isso ainda parece um tanto quanto distante de acontecer.
Recebemos esse tratamento historicamente, desde o período da escravidão quando nossos antepassados escravizados eram, dentre outras coisas, sexualmente abusados pela casa grande. Com o passar do tempo, esse tom foi mudando para algo (na visão da branquitude) ligeiramente mais sutil e engraçado como os estereótipos de “negão dotado”, “cor do pecado” entre tantos outros, que viraram temas de músicas e nomes de novela (hoje, felizmente vistos como problemáticos)

Todavia, precisamos reconhecer a sexualidade como algo intrínseco ao ser humano, sendo assim é um direito que temos de falar e expressar esse comportamento natural, tal como falamos sobre autoestima, amizade, família, saúde, comida e tudo o que faz parte da vida do ser humano. É entendido que, o tópico sexualidade por si só já é considerado (indevidamente) um tabu, e isso é indevido pois, embora o assunto seja constantemente banalizado, falar sobre isso seriamente é visto como algo constrangedor por muitas pessoas. Algo demonizado. Quando afunilamos ainda mais esse tema e focamos na comunidade preta, encontramos um cenário onde existe uma repulsa pela exploração e exibição da sensualidade, mesmo quando esse conteúdo é produzido e publicado pela própria pessoa e compartilhado respeitosamente por outras pessoas negras.

Analisando o contexto histórico que citamos aqui, não é difícil entender o real motivo de tal repulsa, (praticamente um trauma) todavia é um problema que devido à hipersexualização que sofremos por parte dos brancos durante todos esses séculos, tenhamos “perdido” o direito de experimentar e conhecer o nosso próprio corpo da maneira como bem entendermos. Usar roupas sensuais ou não, postar fotos sensuais ou não, cantar músicas sensuais ou não é um direito nosso e que deve ser reconquistado e reafirmado. É algo que cabe a nós decidir se vamos fazer ou não. Precisamos retomar as rédeas desse âmbito em nossas vivências e normalizar o fato de termos nossos homens e mulheres falando de sexo finalmente não por que isso foi imposto por terceiros brancos, mas porque eles querem. E isso não tem nada a ver com “biscoitar” (termo usado na internet para dizer que alguém busca por atenção e curtidas), mas com o fato de se sentir bem naquela posição, o que é de fato, perfeitamente normal.

A branquitude nos ensinou a odiar nosso cabelo, nossa pele, nossos lábios e narizes grossos na mesma medida em que se beneficiava de tudo isso para entreter a si mesmos. Eles nos ensinaram que éramos feios na mesma proporção em que nos hipersexualizavam. Contraditório, não acham? Mas agora, finalmente, temos a consciência de quão lindo somos e vamos reconquistar o poder de falar sobre a nossa sexualidade com autoridade no assunto, pois nós somos o assunto.

LOS ANGELES, CALIFORNIA – JUNE 27: Lil Nas X performs onstage at the BET Awards 2021 at Microsoft Theater on June 27, 2021 in Los Angeles, California. (Photo by Johnny Nunez/Getty Images for BET)

Na indústria musical por exemplo, temos o Lil Nas X. Rapper, preto e gay que passou várias semanas no top 10 da Billboard Hot 100 com músicas que falam abertamente sobre relações sexuais. Para quem sempre pode falar sobre isso quando bem entendesse, não parece grande coisa, mas ter uma representatividade (visual e lírica) LGBTQIA+ em um cenário tão heteronormativo como o RaP, é sim uma grande conquista. E ter o Lil Nas X nessa posição faz com que outros jovens na mesma posição que ele, que sempre se sentiram sexualmente reprimidos, tenham a coragem de assumir esse lado sem medo da reação alheia pois independentemente de qualquer comentário racista ou homofóbico quem está no controle da situação é ele.

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Durante a ultima edição do BET Awards, após apresentar sua canção “Call Me By Your Name” o cantor deu um beijo no palco da premiação. O beijo não dividiu opiniões, mas dividiu o público, entre os homofóbicos e os não homofóbicos. No Twitter, o cantor foi bem incisivo ao responder a tweets que criticavam a performance, dizendo que “se ficaram assim por um beijo, da próxima vez ele transaria no palco”. O mesmo podemos dizer de rappers como Lil Kim, Nicki Minaj, Cardi B e Meghan Thee Stallion que mostram em seus versos o ponto de vista, os desejos, os sentimentos da mulher negra com relação a tudo aquilo que os homens -inclusive os brancos- já estavam cansados de falar. E é claro, ainda assim sofreram retaliações por parte deles, como aconteceu quando Snoop Dogg (que nunca teve censura em suas composições), criticou o conteúdo lírico do hit WAP.

Por fim, gostaria de frisar que não se trata de banalizar o corpo negro. Mas trata-se de inspirar outros corpos negros a se mostrarem, se essa for a vontade. De nos orgulharmos da nossa beleza. É sobre autoconfiança e empoderamento. Chega de ouvir frases como ”mas não precisa mostrar tanto o corpo”. Não precisa, mas se queremos, nós iremos. Chega de nos acostumarmos com o fato de que para sermos respeitados não podemos falar sobre tais assuntos. Chega de sempre seguirmos o padrão de imagem e comportamento que os brancos querem ver de nós.



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