Texto de Shenia Karlsson
Eis que estamos a encerrar o mês da consciência negra com poucos avanços. Embora tenha aumentado a procura de profissionais negres para eventos, palestras, talks, entrevistas, construção de conteúdo e tudo que possamos imaginar, esse mês tornou-se um mercado feroz em que a especulação e a precarização de profissionais negres naturalizou-se como norma.
Tenho tido experiências muito surreais, pedidos estranhos e muitas tentativas de sucateamento de meu trabalho, e eu possuo tolerância zero diante desse cenário nefasto que instalou-se no mês de Novembro. Bancos, Indústrias, Instituições, Empresas privadas, Revistas e suas propostas simpáticas para trabalho gratuito ou por um punhado de moedas. É de uma desfaçatez sem tamanho um representante de banco ter a falta de vergonha em convidar uma profissional negra para um papo informal para seus colaboradores brancos “nesse mês tão especial”, disse ele.
Aliás, por que faríamos isso? Estamos muito ocupados, branquitude!
Nossas caixas de mensagens enchem de pedidos de orçamentos para a realização de diversas atividades, contudo os bastidores dessa movimentação das empresas em tentar fazer bonito nessa época, demonstra que pouco mudou. Primeiramente, mensagens em massa são enviadas para muitos profissionais ao mesmo tempo, e a procura não leva em conta nem a expertise e nem sua relevância, somente o orçamento mais baratinho.
As empresas e Instituições tornaram-se famosas ao enxergar pautas raciais como temas merecedores de pouco investimento, e como profissionais negres tiveram sempre suas atividades laborais desvalorizadas, nessa época não seria uma exceção. Além da prática da especulação dos orçamentos temos a especulação de ideias,sim, várias tentativas de apropriação de conteúdos e um comportamento predatório praticado através de tentativas de exploração disfarçadas de propostas ou as famosas “parcerias”, em que o intuito é estabelecer o contato para um assalto de iniciativas à luz do dia.
Mas, como nós, profissionais negres podemos contornar essa triste situação numa época em que nossas expertises deveriam ser altamente valorizadas? Como proteger nossos saberes angariados às duras penas num mercado em que ao mesmo tempo que precisa de nossa contribuição precariza nossa participação?
Muitas mudanças temos pela frente. Uma realidade incontornável é que nos tornamos detentores de saberes fundamentais para discutir qualquer assunto na atualidade, e o mercado está num beco sem saída enquanto nós estamos lutando nas encruzilhadas.
Eu adotei medidas para me proteger nesta selva de expropriação, nessa terra de Malboro: 1- estabeleci uma cartela de serviços com valores estabelecidos com margem razoável para negociação, sem que me sinta explorada; 2- evito reuniões antes de contratações, geralmente são onde as especulações de conteúdo acontecem; 3- Após qualquer contato, minha assessoria pede que enviem informações fundamentais para o envio de orçamentos, essa medida afasta os oportunistas.
Nem meu relógio trabalha de graça, e eu uso Rolex. De grátis não rola meu bem!