“A Força do Querer”, telenovela da Rede Globo, exibida em “horário nobre”, chegou ao fim com uma grande audiência! O Último capítulo bateu o recorde do ano em vários estados, entre eles São Paulo e Rio de Janeiro. Você pode não ter assistido à novela, mas, com certeza, viu alguma cena rolando no Facebook, acompanhada de inúmeros comentários.
“Bibi Perigosa”, “Jeisa”, “Ivan” (no início da novela conhecido como “Ivana”) e outros personagens, entraram na casa das pessoas e fizeram parte de suas rotinas. Durante meses essas histórias arrebataram o coração do público, coisa que poucos produtos além de uma novela, conseguem fazer aqui no Brasil.
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“A Força do Querer” pode até ser vista como “inovadora” em alguns aspectos, como, por exemplo, o personagem transexual, a drag queen no elenco, ter 3 mulheres fortes e independentes como protagonistas da trama… Mas, em vários quesitos, ela continuou usando a mesma “receita” de sempre! Perpetuando preconceitos e invisibilidade.
Essa novela usou e abusou de brigas entre mulheres para alavancar a audiência. As principais foram de Joyce e Irene; Bibi e Carine – onde houve agressão física de fato. Então o cara traia a esposa e todo mundo espera a surra que a mulher vai dar na amante. Oi? Ou o “Ruy” abandona a noiva as vésperas do casamento e a culpa é da “Ritinha”, que o seduziu. Jura?
Mas, o que mais me incomodou nessa trama foi a dificuldade que a autora, Glória Perez, demonstrou em escrever personagens negros complexos, interessantes e com vidas próprias. Quando soube que Lucy Ramos estaria na novela, fiquei feliz! Lucy é uma ótima atriz, mulher negra que impõe presença e já fez ótimos papeis. Na trama ela era “Leila”, personagem retratada como uma mulher “bem sucedida, sofisticada, independente”.
Qual foi minha surpresa quando percebi que Leila não era nada além de uma “pedra no caminho” de Caio e Bibi! Leila não teve trama própria, não teve um real desenvolvimento enquanto personagem, enquanto indivíduo. Ela esteve presente, orbitando a casa dos brancos, o arco dramático dos brancos e, quando ela não era mais útil, simplesmente saiu da trama, sem maiores explicações.
E o que dizer de Marilda? Outra mulher negra sem história! Eu até hoje não sei se ela trabalhava, onde morava, se tinha pai, mãe, se estudava, se tinha sonhos, se namorava… A única coisa que nos foi permitido saber sobre Marilda é que ela era “Amiga de Ritinha”, uma das brancas protagonistas, mais nada!
E isso é tão comum, que dá raiva! A gente fala tanto sobre mudar os nossos papeis, que não somos só empregadas… Mas, o que adianta ser a mulher “sofisticada”, se no fim das contas você nem mesmo tem uma história própria pra contar? Ou não ser a doméstica, mas também não ser nada além de amiga da personagem branca?
Sem falar de “Sabiá”, o típico bandido negro! Parece mais fácil para a Glória Perez escrever bons personagens indianos, turcos e até árabes – desde que sejam interpretados por atores brancos – que um personagem afro-brasileiro!
Eu poderia listar várias personagens negras, densas, fortes, profundas e maravilhosas (e o farei, em outro texto) mas, por hora, só quero deixar esse questionamento (fingindo não saber a resposta): qual a dificuldade de autores brasileiros em criar bons personagens com a pele preta?
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