Dois acontecimentos recentes colocaram o debate sobre masculinidades negras em evidência. O primeiro foi o final do reality show “Casamentos às Cegas”, em que o participante Will (homem negro) disse “não” à participante Verônica (mulher negra), no altar. Na ocasião, Will alegou não estar preparado para se casar e estar confuso em relação aos seus sentimentos. O mais recente foi a separação do casal Luís Navarro e Ivi Pizzott. Em seu comunicado sobre a separação, o ator disse estar confuso com a vida e que por isso daria um tempo no relacionamento para “reencontrar sua essência”. No texto, ele também diz querer tempo para ficar sozinho, refletir, olhar-se no espelho, ler um livro. Obviamente, que o pronunciamento do rapaz não pegou bem, sobretudo, dentro da comunidade negra.
Historicamente, uma das formas de homens brancos humilharem homens negros era os fazendo passar por instáveis emocionalmente e incapazes de prover o sustento de suas famílias. Assim, estes homens brancos poderiam surgir como os verdadeiros patriarcas. Entendo que o racismo nos desumaniza, nos desestabiliza, e estar confuso sobre a vida, e sobre os sentimentos é algo normal dado este contexto. Porém, as situações mencionadas envolvem outras pessoas igualmente violentadas pelo racismo. Neste sentido, devemos levantar o importante debate sobre nossa responsabilidade para com as mulheres negras nas relações afetivas.
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Não querer se casar, tudo bem. Mas decidir não se casar no altar depois de todos os preparativos, das famílias reunidas, é um problema. Querer estar sozinho para refletir, dar um tempo, ok. Mas querer estar sozinho para refletir, dar um tempo, quando se está em um casamento tendo duas filhas pequenas, sendo uma recém-nascida, não é algo razoável. Isso se torna um problema maior quando a outra pessoa envolvida neste processo é uma mulher negra. Estes abandonos, inevitavelmente, remontam a velhas histórias de preterimento. Não à toa, várias pessoas estão especulando que o motivo da separação de Navarro e Pizzott seja uma mulher branca.
Os episódios mencionados revelam uma lacuna importante na discussão sobre masculinidades negras: as relações de gênero. É verdade que a forma como estamos discutindo masculinidade negra foca nas dores e silenciamentos dos homens negros, e pouco falamos de que mesmo sendo negros, somos homens que foram criados e estão imersos em uma cultura machista. Afastar-se do cotidiano familiar não é uma opção que se apresenta da mesma forma para homens e mulheres. As relações de gênero são relações de poder, mesmo quando racializadas, e a parte mais beneficiada não nota as vantagens que tem no processo.
Ao falar destes ocorridos, não quero generalizar negativamente os homens negros, e digo que compartilho de inseguranças parecidas, mas quero alertar que precisamos falar sobre nossa forma de se relacionar com as mulheres negras. Sobre como pedimos às mulheres negras que entendam nossas dores e estejam ao nosso lado, mas pouco nos comprometemos a entender e a estar ao lado delas. Masculinidade é uma experiência coletiva, e a gente quer e deve falar sobre nossas dores, confusões, abandonos. Isso é uma forma de quebrar os estereótipos de violência que nos colocaram. Mas neste processo também é importante repensar a forma com a qual lidamos com as mulheres com quem nos relacionamos. Isso é fundamental para nos diferenciarmos dos homens brancos que tanto criticamos.
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