Uma carreira de sucesso na alta gastronomia é o sonho de muita gente, mas parece distante para muitas pessoas negras. Também era assim para o chef Paulo Rocha, nascido no Vale do Jequitinhonha, em Minhas Gerais. Influenciado por sua avó, que era quituteira e tinha uma barraca na feira, desde cedo ele se encantou pelo mundo da confeitaria.
Hoje no ar como chef desafiante no reality show Iron Chef (Netflix) e apresentador do programa Esse Doce Tem História, no canal GNT, o chef confeiteiro acredita que está vivendo o melhor momento de sua carreira, e celebra poder ter se tornado uma referência para outros jovens negros que sonham com uma carreira no mundo da gastronomia. “Eu sempre sonhei em poder ser a referência que eu não tive. Quando eu comecei na confeitaria, você não tinha um chef preto na televisão, não existiam as redes sociais. Eu comecei com a força de vontade e aproveitando uma oportunidade”, relembra o chef.
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Confira a entrevista completa que o chef deu ao MUNDO NEGRO, abaixo.
Como começou sua história com a gastronomia? Já foi direto na confeitaria?
“Minha história na gastronomia começa com a minha avó, que era quitandeira. Eu sou mineiro, então desde criança, minha vó fazia pães, doces, ela tinha uma barraca na feira. Então, eu conto que a minha história na gastronomia começou aí, porque desde pesqueno eu sempre via ela fazendo os pães e os doces. Quando adolescente, eu venho morar em São Paulo. Para ir pra escola, meu pai me ensinou a cozinhar para eu me virar. Já com uns 15, 16 anos, eu começo a ter vontade de trabalhar, pra comprar um tênis, comprar uma roupa, meu pai nunca deixou faltar nada, mas também nunca deu além do que precisava. Nessa época eu já era muito preocupado com que profissão eu iria seguir e um primo meu vai trabalhar em uma confeitaria de bairro, que fazia confeitaria popular, e vai trabalhar de atendente. E eu, como andava junto com ele, também pedi emprego no mesmo lugar onde ele tinha arrumado. De tanto eu bater lá, um dia a dona falou pra mim: “Ah, você quer trabalhar, então vem amanhã porque o rapaz que trabalhava na confeitaria saiu, então você vai trabalhar lá”. Quando eu entrei na confeitaria, eu tive a resposta de tudo que eu pensava, que eu me preocupava, o que eu seria. Eu olhei para aquele ambiente e me lembrei muito da minha avó, fazendo os pães, os bolos, os doces, e comecei lá como auxiliar e trabalhei lá por cinco anos.
Quando eu saio de lá, vou trabalhar em confeitaria de mercado, de buffet, mas sempre com doces populares, e sempre sonhando com a confeitaria francesa. Até que um dia uns amigos em comum falaram que tinham um conhecido que trabalhava numa confeitaria francesa no Jardins. Coindidentemente, esse rapaz frequentava a mesma escola de samba que eu, só que eu nunca tinha visto ele lá. No final de semana seguinte, eu encontrei ele lá, e disse que eu tava procurando emprego. Ele disse que ia contratar, mas somente em março, isso era fevereiro. Quando chegou março, eu liguei pra ele, ele disse que tava de pé e eu comecei a trabalhar nessa confeitaria francesa, que foi onde eu me encontrei e cheguei no ponto onde eu queria.
Depois disso eu entrei na faculdade, me formei e Gastronomia. Fui trabalhar num restaurante no Jockey Club e depois disso, eu vi que o Jacquin ia abrir um restaurante e eu me inscrevi e ele me chamou. Peguei uma fila enorme com um monte de gente, fiz entrevista com ele e foi assim que começou minha história.
Como você avalia esse momento atual da carreira, podendo falar do seu trabalho para mais pessoas por meio da televisão?
O momento atual é o meu melhor momento desde que eu comecei na confeitaria. Eu sempre sonhei em poder ser a referência que eu não tive. Quando eu comecei na confeitaria, você não tinha um chef preto na televisão, não existiam as redes sociais. Eu comecei com a força de vontade e aproveitando uma oportunidade. Então, eu considero que esse momento é o melhor momento, estou no caminho de ser a referência, acho até que já sou, porque recebo muitas mensagens de pessoas pretas, pobres, me parabenizando, falando que se inspiram em mim. Hoje eu posso falar com elas através do programa Esse Doce tem História, mostrar que é possível chegar nos lugares que a gente deseja, é possível a gente conseguir visibilidade, é possível a gente chegar na televisão, participar de um reality, trabalhar num grande restaurante. Então, eu acredito que estou no melhor momento e muito feliz com isso.
Qual é o seu grande sonho na profissão?
Meu grande sonho na profissão é chegar em lugares onde pretos ainda não chegaram na gastronomia. Conseguir mostrar para pessoas pretas como eu que elas podem estar onde elas quiserem, mas isso também depende de muito estudo e correr atrás. Que tudo é possível, desde que você também empregue esforço para alcançar seu objetivo.
Ainda é raro vermos chefs negros com grande visiblidade, o que você acha que ainda falta pra transformar essa realidade?
Hoje em dia já temos alguns chefs pretos com destaque, mas ainda é pouco. O que falta para transformar essa realidade, é que nós, que estamos nesse lugar de visibilidade, transmitir tudo o que a gente precisa passar para que outros meninos e meninas pretas entendam que eles podem. Quando eu comecei, muita gente me disse que eu não conseguiria me formar em gastronomia porque é uma faculdade de rico. Então, é mostrar para eles que é possível e conseguir transmitir todo o esforço que a gente teve que fazer para chegar.
Também falta ainda mais empenho da mídia, da televisão, de querer deixar a gastronomia de pessoas pretas evidente. As faculdades conseguirei ser menos burocráticas e darem mais acesso a pessoas pretas. Temos que tentar fazer com que isso seja maior.
Tem alguma novidade vindo por aí que você possa nos contar?
Essa é a parte boa. Tem novidade vindo, sim. A primeira novidade é que eu vou ser pai do meu primeiro filho. Minha esposa está grávida. Outra novidade é que eu vou ser o apresentador do Prêmio Gastronomia Preta, que é o Prêmio que foi criado para dar visibilidade apessoas pretas na Gastronomia, e vou apresentar esse prêmio que vai acontecer no mês de novembro no Rio de Janeiro. E outra novidadeé que fui convidado para participar do maior evento gastronômico do Brasil, que é o Mesa São Paulo. Vou ministrar uma aula-show neste evento que reúne os maiores cozinheiros do Brasil. Para mim é uma alegria imensa porque é algo que eu sempre via acontecendo, sempre imaginei, mas ainda achava que estava longe pra mim, mas fui convidado para ministrar aulas no maio evento de gastronomia do Brasil.
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