Por: Hilton P. Silva*
Não se sabe exatamente quantas comunidades quilombolas existem no Brasil. Em 2019, o IBGE havia identificado 5.972 grupamentos. Segundo o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a Covid-19 do Ministério da Saúde, essas populações têm elevada vulnerabilidade social, logo, são prioritárias para imunização. Com a chegada das vacinas, haverá necessidade de planejar as formas de abordar esse grupo para garantir o acesso e a eficácia da campanha.
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É fundamental que os municípios se preparem, reconhecendo quantas comunidades existem em seu território e qual a população total sujeita à vacinação. Além disso, é papel da Secretaria Municipal de Saúde coordenar com as associações representativas dos quilombos para identificar as condições de acesso, a fim de planejar os modos de transporte, quantidade de insumos, equipamentos, combustível e equipes necessárias para a ação. As turmas novas devem ser imediatamente sensibilizadas, seguindo as diretrizes da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Para o adequado cumprimento de sua missão, as equipes de saúde devem ser preferencialmente das próprias comunidades, ou serem os Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e outros profissionais já familiarizados com a população local. E, claro, com pleno acesso aos equipamentos de proteção individuais (EPIs).
Já o acesso aos territórios e a abordagem da população precisam ser feitos com o apoio das lideranças e/ou organizações locais, responsáveis também por indicar os espaços destinados à vacinação, cabendo aos técnicos a avaliação de possíveis adaptações a serem executadas pelo município.
Como o isolamento geográfico dos territórios pode dificultar o retorno no prazo adequado, será preciso planejar para que todos os grupos sejam vacinados em cada visita, bem como a logística para a volta a todas as comunidades para aplicação da segunda dose. Em virtude da precariedade das condições sócio-sanitárias da maioria dos quilombos, a prefeitura deve garantir a entrega de materiais de higiene e máscaras para todos os moradores, em ambas as etapas de imunização, reduzindo assim, o risco de contaminação.
Dada a situação de vulnerabilidade das pessoas, é fundamental que a vacinação seja organizada de forma a evitar aglomerações. Como podem ocorrer efeitos colaterais, recomenda-se que a equipe permaneça no local de 12 a 24 horas, para acompanhar eventuais intercorrências.
Em tempos de grande circulação de notícias falsas, o sucesso do Plano Municipal de Vacinação dependerá também da sua divulgação, com uma ampla campanha informando datas, locais e público-alvo para evitar que outros se dirijam aos postos quilombolas, causando aglomeração e potencial infiltração da doença.
Como as duas vacinas foram aprovadas para uso emergencial, é preciso fazer um cuidadoso acompanhamento individual, uma vez que podem ocorrer eventos adversos pós-vacinação (EAPV) em dias subsequentes, e que todos devem receber a segunda dose. O Ministério da Saúde desenvolveu um software com esse propósito (aplicativo Conecte-SUS), mas este está ainda em fase de implantação. Então, talvez seja necessário planejar alternativas localmente.
Finalmente, considerando o racismo estrutural vivido pelas comunidades tradicionais, e com a finalidade de garantir a democracia do acesso, a imunização não deve ser condicionada a apresentação de qualquer tipo de documento ou cadastro prévio, e tampouco ser solicitado a assinatura de termo de consentimento para o usuário. Porém, cada um deverá receber um comprovante de imunização e ser informado para trazê-lo ao voltar para a dose complementar.
*Hilton P. Silva, é membro do GT Racismo e Saúde da Abrasco e Prof. Dr. da Universidade Federal do Pará (UFPA). Este artigo é uma produção do GT Racismo/Abrasco com apoio institucional do Fundo de População das Nações Unidas no Brasil (UNFPA)
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