Por Júlio Evangelista Santos Júnior*
Costumo dizer em minhas andanças que somos um povo de mente colonizada e subconsciente racista parafraseando J. Martiniano Silva em seu livro Racismo à Brasileira, ao qual recomendo aos colegas leitores. Em um país com mais de 350 anos de escravização de povos africanos e seus descendentes transladados para o Brasil de forma desumanizada e opressora, que em 2013 completou 125 anos de uma abolição inconclusa e sem as devidas reparações, com 25 anos de uma Constituição Cidadã inconstitucionalmente descumprida pelos brasileiros e seus representantes republicana e democraticamente eleitos, os 318 anos da morte de Zumbi e conseqüente declínio de Palmares não comovem e nem alteram o modus operandi de um Estado baseado na desigualdade e violação de direitos humanos básicos própria de um modelo hegemônico e racista de desenvolvimento.
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Costumo dizer também neste dia, e em todos os outros diga-se de passagem, que a hipocrisia do cidadão brasileiro é tão sofisticada e irônica que faz do ‘racismo à brasileira’ o pior tipo de racismo existente no mundo, pois traz o raciocínio defensivo como arma de desincompatibilização do racismo de si próprio, ou seja, ‘eu não sou racista’, mas a sociedade é, eu não discrimino, mas a sociedade sim.
Enfim, é 20 de novembro, dia em que incontáveis e incontestáveis ativistas escrevem e bradam nas redes sociais, e pelas ruas do país, por igualdade e fim do racismo e que os não menos incontáveis, mas contestáveis, ‘cidadãos de bem e de todas as cores’ bradam que ‘somos todos iguais’ e que só existe a raça humana, o que nos remete a pensar o porquê de tanta resistência a um dia em que enaltecemos a nossa resistência a um processo de desumanização que já dura 513 anos. É inegável a ampliação das formas de organização e de luta do movimento negro e antirracista, ao qual agradeço constantemente pela minha formação e sobriedade, como também é inegável a aprovação de leis em favor da igualdade racial e de iniciativas governamentais nesse sentido, porém nada disso surtirá efeito se a mente colonizada e o subconsciente racista continuarem moldando os comportamentos humanos de forma a degradar incessantemente uma parcela significativa da população que sempre foi a ‘maioria minorizada’ e invisibilizada deste país. Essa mente colonizada produz fenômenos que substituíram a forma escravocrata de extermínio da população negra no Brasil a partir de, e desde, 1888 e que devem ser combatidos com toda a desenvoltura e resistência possíveis. Somente políticas públicas não serão suficientes nesse processo que invisibiliza o feminicídio, desdenha da luta quilombola, amplia o genocídio da juventude negra, demoniza as religiões de matriz africana, desqualifica e macula as iniciativas afirmativas de promoção da igualdade racial e de enfrentamento ao racismo e ainda confere legitimidade a um racismo institucional cada vez mais poderoso e ingrato diante das relevantes contribuições do povo negro no processo de formação nacional.
Pela efetiva implementação das ações afirmativas, pela aprovação imediata de cotas no serviço público em todos os entes federativos, pela criação onde ainda não existam de órgãos municipais e estaduais de promoção da igualdade racial, por um feriado nacional da Consciência Negra (projeto de lei que está engavetado no Congresso), pela ampliação do debate por um Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (que já está em construção e precisa de maior participação popular), pelo empoderamento da população sobre o Estatuto da Igualdade Racial, por mais representantes negros nos espaços políticos e em todos os espaços democráticos!
Axé Zumbi, axé Dandara!
*Júlio Evangelista Santos Júnior, também conhecido por Tumbi Are Nagô de Oyò, é militante e ativista do movimento negro, coordenador da Regional Baixada Santista do Projeto Educafro, poeta, angoleiro, Tecnólogo em informática com ênfase em gestão de negócios, advogado, pós-graduando em direito constitucional aplicado e gestor público municipal de promoção de igualdade racial e étnica na Prefeitura de Cubatão/SP
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