Por Wanda Chase*
Sempre tive vontade de entrevistar Pelé. Certamente, uma das perguntas seria sobre racismo.
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Na adolescência, eu e meus irmãos tínhamos um Ídolo: o campeão de Box estadunidense Cassius Clay, o grande Muhammad Ali. Eu e meus quatro irmãos acompanhávamos a vida do pugilista através do programa de rádio A Voz da América.
Certa vez, saiu uma reportagem com ele na revista REALIDADE (Ed. Abril, 1967). Na entrevista, Muhammad falava: “Eu sou o melhor, porque sou negro. Eu sou bonito, sou um campeão”. Isso era como um mantra pra nós. O pugilista dizia ter orgulho por ser negro. E eu me perguntava: por que Pelé não falava sobre o assunto.
Na minha casa era natural falar sobre racismo, contávamos dos apelidos que nos davam na escola .Vovô não aliviava, nos dava muitas lições de vida. Tínhamos uma educação diferente dos nossos colegas da escola e da igreja. Tornar-se negro é muito complicado para algumas pessoas. O mundo é branco impõe o tempo todo negarmos o nosso “Eu”, a nossa essência, para sermos aceitos.
Imaginem isso há 40, 50 anos…
Eu e meus irmãos, como tantos outros, fomos privilegiados. Aprendemos a ser negros desde crianças. Até hoje soam as palavras de Muhammad Ali e as cenas do filme “Ao mestre com carinho”, com o ator Sidney Poitier. Acho que muitos de nós nascemos marcados para sempre, para ter referências, passar por um trabalho de base.
Daí, me pergunto: Será que Pelé teve essa chance? Teve essa oportunidade? Quantas vezes ele foi humilhado por ser negro? Quantas vezes foi induzido a negar sua raça? Quem é negro sabe de todo esse processo. Nao estou passando pano, não! Deixem que ele assuma sua história. É tarde? Näo! Talvez essa seja a hora dele.
Wanda Chase é jornalista e ativista do Movimento Negro. Comentarista e repórter, conhecida principalmente pelos 27 anos de trabalho na TV Bahia, afiliada Rede Globo. Passou também pela Globo Nordeste, Rádio Jornal (Recife), TV Paraíba, Diário de Pernambuco e Jornal do Commercio. Entre os muitos troféus que recebeu, o Troféu Maria Felipa 2009, da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, e o Troféu Ujaama, concedido pelo Grupo Cultural Olodum. Amazonense de nascimento, reside em Salvador, onde recebeu o título de cidadã soteropolitana.
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