Igor Cavalari, 26, mais conhecido como Igão, cresceu na periferia de Osasco, na Grande São Paulo e criou o Podpah Podcast junto com o amigo Mítico, e hoje é um dos comunicadores mais influentes do país, sendo listado na Forbes Under 30 2022, divulgado em dezembro do ano passado.
Nesta semana, o podcast começou o projeto Podpah de Verão, onde os apresentadores receberão dez entrevistados durante duas semanas nas praias do Rio de Janeiro. Já foi entrevistado o humorista Marcelo Adnet, Mc Maneirinho, e nesta quarta-feira (18) será a vez do Orochi, MC Cabelinho, na quinta (19); e o streamer Nobru na sexta-feira (20).
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Em entrevista exclusiva ao Mundo Negro, Igão falou sobre sua carreira e planos para o futuro. “Já realizei o sonho de entrevistar muita gente preta de muito sucesso. Mano Brown, Emicida, Liniker, Ice Blue, Djonga. Mais do que um nome específico, o que eu mais quero é continuar dando espaço para que as pessoas que, assim como eu, também vieram da quebrada, possam mostrar quem são, o trabalho deles e delas”.
Quebrando recordes, a transmissão da conversa com o rapper Mano Brown em março do ano passado, teve um pico de mais de 340 mil espectadores simultâneos e se tornou a maior audiência simultânea entre todos os programas do tipo já transmitidos no YouTube Brasil.
Igão também reflete como a negritude influencia na sua carreira. “Sou preto, vim da periferia e hoje tenho o maior podcast do Brasil, já entrevistei o presidente da República, outras pessoas f***s, artistas pretos fantásticos, faço propaganda para as maiores marcas do país e do mundo. Ainda assim, acredito que se [eu] tivesse a pele retinta teria ainda mais dificuldade de conquistar tudo que conquistei. Quando poderíamos pensar que isso seria possível levando em consideração que o jovem preto da periferia é quem mais morre por arma de fogo?”, questiona.
Leia a entrevista completa abaixo:
Igor, é um prazer ter você aqui no Mundo Negro. Primeiro, gostaria de te parabenizar pelo sucesso impressionante do Podpah. Você é hoje, um dos comunicadores mais influentes do Brasil. Como você observa essa posição?
Obrigado a vocês por me receberem, poder contar um pouco sobre mim e, quem sabe, inspirar outras pessoas. Eu vejo exatamente do jeito que eu acabei de falar: oportunidade de inspirar pessoas, principalmente o pessoal de ‘quebrada’, os que não têm privilégios e muitas vezes não têm esperança de que podem conseguir chegar nesta posição. Desde quando começamos o Podpah, eu e o Mítico respondemos muito sobre o que a gente queria com o sucesso do canal. E nós sempre respondemos que era inspirar pessoas e mostrar que é possível sair da periferia, de onde você é pouco notado, e vencer. E não cair nesses papos de coachs sobre meritocracia. Estamos realizados também principalmente porque podemos mostrar para a menina preta e o moleque preto da quebrada que, apesar de tudo, é possível chegar lá.
Recentemente, você foi listado dentro da ‘Forbes Under 30’. No Instagram, você comemorou declarando que está ‘contrariando estatísticas’. Poderia falar mais um pouco sobre isso? Sabemos que as oportunidades para a população negra são bem mais difíceis.
É isso. Essa resposta está muito ligada à resposta anterior. Falta oportunidade. Agora, nos últimos anos, depois de séculos nos rejeitando, nos limitando a poucos papéis de destaque, que uma parte da sociedade tem dado espaço para pessoas pretas e pobres, que não tiveram a mesma oportunidade que muitos brancos têm. Eu ainda sou privilegiado porque sou homem. Para as mulheres pretas é ainda mais difícil. Mas é isso, sou preto, vim da periferia e hoje tenho o maior podcast do Brasil, já entrevistei o presidente da República, outras pessoas f***s, artistas pretos fantásticos, faço propaganda para as maiores marcas do país e do mundo. Ainda assim, acredito que se [eu] tivesse a pele retinta teria ainda mais dificuldade de conquistar tudo que conquistei. Quando poderíamos pensar que isso seria possível levando em consideração que o jovem preto da periferia é quem mais morre por arma de fogo? Ou quando não morre está fadado a ter uma vida difícil porque não teve educação que deveria ter tido, que foi negado para ele os direitos de fazer uma universidade, de poder ter uma vida decente. Por isso não só eu, mas muita gente que veio de baixo está contrariando as estatísticas. A cada aniversário contrariamos as estatísticas. Porque estamos tendo o destaque que merecemos, não estamos sendo limitados às páginas policiais do jornal. E não sou só eu. Vários amigos meus estão tendo esse reconhecimento. Meu parceiro Mítico também, ele já morou em barraco, vem de uma família simples de Belém, tem origem indígena e nós fomos considerados pela Bloomberg duas das pessoas mais influentes da América Latina. Ainda falta muito para que o povo preto tenha o mesmo espaço e direitos de outros, mas estamos mudando como sociedade.
Quais são seus planos profissionais para o futuro, principalmente enquanto comunicador?
Entre muitos planos talvez o principal seja consolidar minha carreira como comunicador. Eu quero que as pessoas me vejam cada vez mais como alguém que comunica, ser um porta-voz da comunidade da periferia, do povo de quebrada. Eu tenho um grande sonho de um dia talvez ser um dos grandes apresentadores do país, ter um programa em um domingo, sábado. Sou muito novo, tenho 26 anos, e eu sonho muito com isso. Daqui 26 anos terei só 52, então vou poder fazer muita coisa. O que eu tenho na cabeça é cada vez mais poder fazer coisas grandes. Eu amo trabalhar com comunicação, é o que eu quero fazer para sempre da minha vida. Eu sonho muito em um dia poder ser Marcos Mion, um Faustão. Quem sabe?
Você acredita que seu trabalho pode impactar e inspirar positivamente outras pessoas, em especial pessoas negras?
Sem dúvida. É uma das coisas que fazem a gente seguir produzindo e criando coisas: poder inspirar e motivas pessoas que normalmente são levadas a acreditar que, por serem são pretas ou pobres, não podem realizar seus sonhos. Podem sim. A gente muitas vezes para e não acredita no que estamos vivendo, e eu e o Mítico pensamos: “quantas pessoas se inspiram na gente, quantas pessoas nos veem como é possível chegar lá”? Por isso, a gente tenta cada vez mais ter responsabilidade sobre o que a gente fala. Somos jovens, mas também estamos atentos a essa responsabilidade que é extremamente necessária. A gente quer levar essa mensagem para as pessoas também. Não apenas a diversão, o entretenimento. Queremos mostrar que é possível.
Vocês já entrevistaram personalidades muito importantes no Podpah. Existe alguma personalidade negra que vocês ainda sonham em entrevistar?
Já realizei o sonho de entrevistar muita gente preta de muito sucesso. Mano Brown, Emicida, Liniker, Ice Blue, Djonga. Mais do que um nome específico, o que eu mais quero é continuar dando espaço para que as pessoas que, assim como eu, também vieram da quebrada, possam mostrar quem são, o trabalho deles e delas.
Igor, qual conselho você dá pra quem deseja seguir carreira como comunicador, pra quem se inspira no seu trabalho, seja como creator ou como empresário?
Continuar trabalhando sempre, ter foco, persistir muito. Hoje olham para o Podpah fazendo sucesso, mas muita gente não sabe que eu produzo conteúdo desde 2015, estou na internet desde 2011. Então, é uma parada diária, todos os dias pensar em coisas novas, fazendo tudo, testando tudo. O melhor aprendizado é esse, tempo ao tempo, esperar as coisas no seu momento, no melhor momento acontece tudo, e sempre continuar trabalhando, é importantíssimo. Além disso, creio que o mais importante é você ser você mesmo, ser autêntico, saber da onde veio. Apesar de já estarmos há algum tempo na internet, eu e o Mítico “estouramos” há dois anos e meio com o Podpah. Desde então, sempre nos preocupamos em criar cada vez mais conteúdos e não apenas o mesacast. Inovamos fazendo o podcast 24 horas ao vivo no ar, o Podpah de Verão, que tem a segunda temporada iniciada dia 16, o Arraiá Podpah. Além disso, estamos ampliando nossos conteúdos para além do Podpah, como o Rango Brabo, programa com o Diogo Defante, que também é um cara que veio da periferia do Rio, enfim. Vamos inaugurar a loja do Podpah ainda neste mês de janeiro com uma coleção escolhida por nós. Ou seja, é preciso ter paciência para as coisas acontecerem. Nada cai do céu, é sempre uma construção, nunca se acomodar e sempre acreditar no trabalho.
Texto: Halitane Rocha
Entrevista: Arthur Anthunes