Todos os olhares em mim e eu não sabia para onde olhar. A professora falava sobre negros escravos (não escravizados), chibata, mortes, famílias separadas, até que uma princesa branca chamada Isabel, assinou a lei Áurea e libertou os meus ancestrais, no dia 13 de maio de 1888.
Uma salvadora branca, como todas as minhas bonecas.
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E eu, a única negra da sala era a representação dessa tragédia, a personificação de um povo que só sofreu, de acordo com os meus professores. Uns olhares eram de dó, outros me intimidavam, mas todos me deixavam desconfortável.
O período da escravidão até a abolição era a única menção à população negra em quase toda a minha vida escolar, durante os anos 80 e 90. Como gostar de ser negra, se tudo o que eu aprendi na escola sobre meus antepassados estava atrelado ao maior ato terrorista da humanidade que foi a escravidão negra, que durou mais que o Holocausto e a maioria das guerras?
No dia 10 de maio, o programa Conversa com o Bial, da Rede Globo teve como tema a abolição, e bem no começo do bate-papo de altíssima qualidade, que teve o professor Doutor Hélio Santos, a Phd em Física Sonia Guimarães ( a primeira negra com esse título no Brasil) e o rapper Emicida, a maneira como as escolas abordam a abolição foi comentado por eles.
“O pior momento da escola era quando falavam sobre escravidão. Eu me sentia humilhado, pouco protagonista”, descreve o professor Santos.
“Era desagradável (falar sobre abolição), já que o protagonismo da nossa história não era nosso. Era comum sermos alvos de piadas e insultos”, explicou Emicida.
Sonia Guimarães só descobriu há poucos anos as contribuições dos negros para ciência, sua área de atuação. “Eu só descobri sobre as riquezas da África, recentemente, só nos anos 2000”.
Uma luz no fim do seria se sanção da Lei No. 10.639/03 que completa 15 anos em dezembro, tivesse saído do papel. O primeiro parágrafo do documento prevê que “ O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil”.
Muitas iniciativas apareceram nos últimos anos para cobrir essa lacuna deixada pelo não cumprimento da lei. O EMEI Nelson Mandela e Afroeducação em São Paulo, o projeto Quilombinho no ES, e centenas de livros paradidáticos que contam outras narrativas negras para as os pequenos afro-brasileiros em idade escolar têm feito a diferença.
Essas duas últimas gerações de pais negros, mais empoderados e conscientes já são responsáveis por uma mudança positiva. Vemos os pequenos e pequenas amando seus cabelos, querendo brinquedos com representatividade, naturalmente gostamos mais de si mesmos.
Resta agora que as escolas educadores se preparem para ensinar sobre os negros, não só sobre suas dores, mas sobre suas contribuições para humanidade, para alunos de todas as etnias.
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