Mundo Negro

Mulher negra latino-americana em primeiro lugar

Foto: Pablo Grotto

Texto: Claudia Di Moura

Ser uma mulher negra latino-americana, para mim que nasci no Brasil, é um abraço doloroso. Doloroso por todos os enfrentamentos que vêm junto com meu gênero e minha cor, dentro de uma sociedade machista e racista. Quando trago a analogia do abraço, falo também de um lugar para além da dor, da reiteração de um pertencimento muito maior e poderoso, que é a identidade latino-americana. 

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Sempre me senti pertencente a essa grande bandeira da América Latina. E, por mais que isso seja uma obviedade topológica, as particularidades da construção do Brasil como colônia, e depois como país, de alguma forma nos geraram esse distanciamento dos nossos vizinhos e irmãos. Primeiro pela barreira linguística, depois pela nossa grandeza territorial. Mas o reconhecimento de nossa familiaridade, na perspectiva de uma mulher afro-indígena, é inevitável. 

Somos filhas da diáspora africana e da resistência dos povos nativos americanos. Nossas interseccionalidades identitárias são visíveis mesmo nos nossos fenótipos, nos traços ameríndios e africanos que, juntos, tornam-se uma língua universal; nos nossos modelos de família, no nosso exercício da maternagem, no nosso talento para o empreendedorismo e na nossa resiliência.

E tudo isso me traz um orgulho continental. Fazer parte deste imenso quilombo feminino que não se permite a delimitação de fronteiras, que cultiva a sua raiz sem perder de vista por nenhum momento os desafios e interesses que nos irmanam globalmente, que conhece sua história, mas sabe que ela é uma obra aberta e que temos as canetas nas mãos, isso é ser uma mulher negra latinoamericana e caribenha. Isso é traçar no mundo as linhas que nos unem em nossas matrizes ancestrais e no nosso espírito de liderança que nos conduzem para o futuro. 

Somos plurais e singulares, letradas e sábias, mestras e mágicas, criadoras, transformadoras. E nossa casa não está fundada em recortes de terra, mas na costura das nossas idiossincrasias em um senso revolucionário de coletividade.

*Claudia Di Moura é uma atriz afro-indigêna e ativista. Como atriz, busca levar para o mercado audiovisual e para o teatro as múltiplas lutas pelos direitos das mulheres, do povo negro e dos povos originários.

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