
“Muitos homens negros sequer chegam a envelhecer.” A frase é de Alexandre da Silva, Secretário Nacional dos Direitos Humanos da Pessoa Idosa, especialista em envelhecimento e doutor em Saúde Pública. Em uma reflexão publicada em suas redes, ele revela o que os números confirmam e o país insiste em ignorar: o envelhecimento da população negra brasileira acontece sob o peso da desigualdade racial, da precarização histórica do trabalho e da ausência de políticas públicas estruturantes.
“Homens negros enfrentam uma das mais baixas expectativas de vida do país. Muitos sequer chegam a envelhecer, a chegar aos 60 anos”, escreve. Aqueles que ultrapassam essa marca carregam o corpo e a mente marcados por doenças crônicas não diagnosticadas, abandono médico e violência estrutural. Segundo dados do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social (IMDS), entre 2010 e 2019, homens negros viveram, em média, 5,9 anos a menos do que homens brancos. E isso não é uma coincidência: é reflexo de um projeto histórico de exclusão.
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A velhice também é um marcador de gênero e classe. Alexandre chama atenção para as mulheres negras idosas, muitas delas “maioria entre as trabalhadoras domésticas aposentadas”, com “contribuições previdenciárias instáveis, aposentadorias de um salário mínimo e sem acesso pleno à saúde pública”. Ao longo da vida, essas mulheres sustentaram lares e famílias, quase sempre à margem do sistema previdenciário e invisíveis aos olhos do Estado.
Esse processo é agravado pela territorialidade. “Pessoas negras que vivem em territórios periféricos sofrem com a exclusão dos serviços públicos, a insuficiência das políticas habitacionais e a presença exacerbada da violência urbana, que afeta direta e indiretamente a população idosa.” O direito à cidade, à saúde e à segurança é sistematicamente negado a essas pessoas, que chegam à terceira idade com pouca rede de apoio, renda instável e escasso acesso a cuidados especializados.
E como se não bastasse o racismo estrutural, essas pessoas ainda enfrentam outro tipo de violência simbólica. “Enfrentam o idadismo somado ao racismo, um duplo apagamento que exclui, silencia e invisibiliza.” A velhice negra é atravessada por camadas de abandono do mercado, da mídia, das políticas públicas e da sociedade em geral.
“Envelhecer com dignidade é um direito de todas as pessoas”, defende Alexandre. “Mas é preciso reconhecer que, para isso se tornar realidade, é necessário combater as desigualdades raciais com ações concretas, reparatórias e estruturantes.” Não basta reconhecer o problema é preciso agir com intenção, orçamento e prioridade.
Na conclusão de sua análise, ele propõe um caminho claro: “Valorizar o envelhecimento da população negra é romper com o ciclo da exclusão, e construir um futuro mais justo, onde todas as vidas importam em todas as idades.”
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