Pessoas negras com um nível razoável de consciência racial não vão se surpreender com o conteúdo do “Dentro da minha pele”, documentário sobre o racismo na sociedade brasileira, que entra na programação da plataforma Globoplay, nesse domingo,23. As narrativas do projeto não são muito diferentes das que a gente já conhece.
“O seu filme é o que eu penso passado pelo seu filtro”, diz brilhantemente o historiador e músico Salloma Salomão ao responder uma das perguntas do diretor do documentário, Toni Venturi, que durante o documentário dá umas pinceladas nos temas como privilégio, incluindo o dele próprio, branco, bem sucedido e descendente de imigrantes italianos.
Notícias Relacionadas
Artistas brasileiros constroem uma linguagem e estética únicas do afrofuturismo
FOTO 3X4: Valéria Monã, Animadora Cultural, Atriz, Coreógrafa e Diretora de Movimento
Val Gomes, socióloga de descendência indígena e negra, faz sua estreia no documentário assinando a co-direção do projeto.
O fato de Toni ser branco é questionado também por uma das entrevistadas, a funcionária pública e ativista trans Neon Cunha que no documentário tem falas potentes sobre branquitude. “As pessoas não sabem a diferença entre direitos e privilégio (…) Por que não tem uma diretora preta no seu lugar?”, provoca Neon.
O filme se divide entre depoimentos de pessoas da comunidade negra que contam momentos da sua vida onde racismo deus as caras e intelectuais que fazem uma interpretação crítica e intelectualizada sobre como a relação de brancos e negros se dão na sociedade.
Os personagens do documentário são a médico Estefânio Neto, a modelo-performer Rosa Rosa, os estudantes universitários Wellison Freire e Jennifer Andrade, a funcionária pública e ativista trans Neon Cunha, da trabalhadora doméstica Neide de Sousa, a corretora de imóveis Marcia Gazza e o casal formado pela professora do ensino público Daniela dos Santos e pelo garçom Cleber dos Santos.
O elenco escolhido para fazer a análise sócio-política-histórica das relações raciais no Brasil trazem um conteúdo precioso para quem está iniciando e não entende a importância das cotas, o que é genocídio negro e branquitude, mas não traz nada de novo para quem está por dentro desses assuntos. Entre nomes escolhidos para trazer o conteúdo mais teórico ao documentário estão a psicóloga Cida Bento, a escritora Cidinha da Silva, a arquiteta Joice Berth, o dramaturgo e pesquisador José Fernando de Azevedo, o historiador e músico Salloma Salomão ( já citado) e a filósofa Sueli Carneiro. Para complementar as entrevistas o diretor escolheu três cientistas sociais – o sociólogo Jessé Souza, a psicóloga Lia Vainer Schucman e o tenente-coronel da Polícia Militar Adilson Paes .
Um grande presente do documentário é a arte que entra como um alívio depois de depoimentos tensos , muitos deles gatilhos para uma audiência negra mais sensível.
As cantoras Bia Ferreira e Doralyce interpretam a canção “Cota não é Esmola”, Chico César apresenta uma nova versão de “Respeitem meus cabelos, Brancos”, Luedji Luna aparece cantando “Iodo”, Thaíde traz o rap “Algo Vai Mudar”, Valéria Houston interpreta o samba “Controversa” e Anicidi Toledo, junto do Batuque de Umbigada, dançam a umbigada “Luís Gama”. Numa favela do Capão Redondo, os jovensslamers Bione e Barth Viera trazem sua poesia periférica e necessária.
Faltou o depoimentos de pessoas negras com narrativas de ascensão econômica para que a audiência entendesse que racismo é sobre cor e não condições sociais. É uma pena que os documentários ainda se prendem nas histórias triste, estatísticas perversas e ignoram a importância de discutir propostas, como reparações, por exemplo.
Agora, se “Dentro da Minha Pele” foi pensado para pessoas brancas, cruas sobre a temática racial, aí ele cumpre bem o seu papel.
Notícias Recentes
OMS mantém status de emergência global para mpox
"Seguimos também batalhando por reparação", diz Anielle sobre desculpas à escravidão do Governo