Debora Simões
O corpo do homem negro é o principal alvo de violência policial. No último dia primeiro de dezembro, circulou nas redes sociais um vídeo que mostra um homem negro algemado na moto de um policial militar passando pelas ruas da capital paulista. O jovem acusado de roubo corre atrás da moto.
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Não é um caso isolado. A cada 100 pessoas assassinadas 75 são negras, segundo dados produzidos em 2019 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Entre 2007 e 2017, a taxa de homicídios de negros cresceu 33,1% enquanto entre os não negros a taxa de homicídios cresceu 3,3. Os números de 2021 só pioraram, o Fórum, chegou à conclusão de que em uma década, 405.811 indivíduos negros foram mortos. Isso significaria que nesse período a capital do Tocantins, Palmas, seria dizimada. Nos anos de 2017 e no seguinte, 75,4% das pessoas mortas em intervenções policiais eram negras. Os policiais negros também são os que mais morrem nos confrontos. A conclusão é terrível: independente de qual lado o negro está, ele é o principal foco letal.
O imaginário social que criamos sobre os corpos negros banaliza as atrocidades às quais foram e são submetidos. Nos livros didáticos, aqueles que usávamos na escola quando éramos crianças, representavam os negros sempre trabalhando ou recebendo algum castigo físico. Os viajantes europeus, nas suas expedições artísticas, no século XIX, produziram muitas dessas imagens, certamente você deve ter visto num livro as pinturas do francês Jean Baptiste Debret. Em suas obras, os escravizados foram retratados no pelourinho ou em outros instrumentos de tortura, ou mesmo exercendo trabalho pesado e forçado. Aprendemos desde de cedo que corpos negros poderiam sim, sofrer pelo trabalho excessivo e se fizessem algo de errado deveriam receber severas punições. Essa construção faz parte da colonialidade onde impera a subordinação dos nossos corpos, dos nossos saberes, da naturalização das nossas dores (físicas e psicológicas).
O assassinato dos sujeitos negros é uma faceta cruel do racismo, que estrutura nossa sociedade. Diante de tantos números, que também são histórias de vidas interrompidas, evidencia-se a eficácia da necropolítica, para mencionar o termo usado pelo filósofo e historiador camaronês Achille Mbembe. Observamos, cotidianamente, o Estado brasileiro exercendo o necropoder selecionando os corpos que deixa morrer e que faz morrer. Aquela política de morte instituída cotidianamente pelo Estado brasileiro. Para a política da polícia, o jovem negro arrastado em São Paulo é um corpo que não merece viver, então, qualquer exploração e violência sobre esse corpo é possivel. Mas como diz a aniversariante do último dia 29 de novembro, a escritora Conceição Evaristo: “eles combinaram de nos matar, mas nós combinamos de não morrer”. Que não esqueçamos do conto “A gente combinamos de não morrer”.