
Texto: Rodrigo França
Um corpo negro em movimento é um ato político, uma declaração de existência e uma celebração de sabedoria ancestral. É com esse princípio que a Cia de Dança AfroOyá, uma das mais conceituadas companhias de dança do Brasil, reverberando sua arte em palcos nacionais e internacionais, apresenta seu novo espetáculo: AFRO-SAPIÊNCIA. A obra será apresentada nos dias 04, 05 e 06 de abril, no Sesc Santana, em São Paulo, com direção e coreografia de Tainara Cerqueira e Priscila Borges – duas das principais referências da dança afro-brasileira contemporânea.
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O nome do espetáculo já diz tudo: sapiência é sabedoria. E quando se fala de povo negro, falar de sabedoria é falar de estratégias de resistência, de criatividade cotidiana, de espiritualidade e memória. Criado a partir da vivência de Tainara Cerqueira, professora, dançarina e pesquisadora, AFRO-SAPIÊNCIA nasceu como uma celebração da inteligência negra em sua forma mais pura – aquela que garante a sobrevivência, reinventa a estética e estrutura o futuro.
“Pensar AFRO-SAPIÊNCIA é validar esse lugar de existência plena e ancestral. É dar nome à sabedoria do nosso povo que foi, por séculos, silenciada ou subestimada. Mas ela está viva, no terreiro, na sala de aula, na roda de samba e, principalmente, no palco”, afirma Tainara.
A potência do espetáculo também se revela na recepção do público. Em sua temporada no Centro de Referência em Dança da cidade de São Paulo, a obra bateu recorde de público, com mais de 300 pessoas em uma estrutura que não comportava tanta gente. Esse impacto direto com o público se deve, em parte, ao profundo enraizamento da companhia em territórios culturais da cidade. Professora em centros como o Centro Cultural Grajaú, Quilombolas de Luz e diversas unidades do Sesc, Tainara e sua companheira de direção, Priscila Borges, formam não apenas bailarinos, mas comunidades inteiras apaixonadas pela dança afro-brasileira.
Dança, teatro, música ao vivo e artes visuais se entrelaçam em cena, sem que um elemento sobreponha o outro. A percussão, comandada por Priscila Borges e Magnata, se harmoniza com a discotecagem afrofuturista de DJ DefBrks. Tudo isso veste o corpo de balé que reverencia, em cada gesto, a presença dos orixás, uma escolha estética e espiritual que também é um posicionamento político: “A dança afro-brasileira é fundamentada na dança dos orixás. Portanto, ela é, por essência, um combate ao racismo religioso”, defende Tainara.
A trajetória das coreógrafas é marcada pela inquietação com o modo como a arte negra é tratada nos bastidores e nos palcos. Ao fundar a AfroOyá, elas decidiram que não esperaria mais por convites que nunca chegavam. Transformaram a inquietude em criação e ofereceram aos bailarinos uma estrutura de valorização, protagonismo e autonomia.
O processo de criação da companhia nasce do cotidiano: dos terreiros, das festas populares, da observação atenta da comunidade. Para Tainara, a Bahia – onde passa três meses por ano – é o grande laboratório da dança afro. “Ali, a dança afro é traço cultural da identidade. Eu volto para me alimentar dessa fonte viva.”
Apesar dos desafios que ainda enfrentam para manter e expandir seus projetos, as conquistas da AfroOyá já podem ser sentidas em São Paulo e Salvador. O avanço é fruto de uma luta coletiva, que inclui companhias e núcleos como o Núcleo AJEUM, o Coletivo Calcâneos e o Desterro Coletivo. “Queremos mais e podemos mais. A dança afro-brasileira constrói a identidade cultural desse país e merece ser tratada com a mesma dignidade que qualquer outra forma de arte”, afirma.
Depois da temporada no Sesc Santana, o objetivo é circular com AFRO-SAPIÊNCIA por outras regiões, incluindo Salvador, além de levar também o espetáculo Xirê de Rua, contemplado pelo fomento à dança. E vem coisa nova por aí: Tainara já planeja o próximo espetáculo. “A gente escreve, se inscreve nos editais da vida, reza pra ser aprovado e segue dançando. Porque dança afro é vida.”
SERVIÇO
Espetáculo: AFRO-SAPIÊNCIA
Dias 04 e 05 de abril, às 20h
Dia 06 de abril, às 18h
Local: Sesc Santana – São Paulo
Ficha Técnica
Direção e Coreografia: Tainara Cerqueira e Priscila Borges
Bailarines: Maiwsi Ayana, Munique Costa, Vick Fonseca, Dalila Leal, Adejatay, David Sena, Wesley Peixinho
Percussionistas: Priscila Borges e Magnata
DJ: DefBrks
Figurino: Maiwsi Ayana
Iluminação: Renato Banti
Dom: Carlos e Guina Theodoro
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