O universo corporativo ainda é formado em sua maioria por homens brancos, principalmente quando falamos sobre as pessoas que ocupam os cargos de decisões, como os conselhos administrativos.
Dados compartilhados pelo Coletivo Pacto das Pretas apontam que “Um estudo da Deloitte de 2018 com mais de 10 mil empresas em 51 países, inclusive Brasil, chamado Women in the Boardroom, mostra que no ritmo atual, levaremos mais de 28 anos para alcançar a paridade entre homens e mulheres nos conselhos, e quando olhamos para o recorte racial, um estudo da internacional McKinsey com 279 companhias de diversos países, apontam que elas representam menos de 5%. Traduzindo em números, observa-se uma pesquisa feita pela B3 onde há 423 empresas listadas, e 37% não possuem mulheres nos conselhos, ao trazer o recorte racial, esse número fica invisibilizado”.
O desafio para mudanças nesse cenário são inúmeros e também inclui uma mudança na mentalidade de quem contrata. Com um trabalho voltado para transformar o cenário empresarial, o Coletivo Pacto das Pretas apresenta métricas e metas para equidade racial a partir dos conceitos de ESG (inglês, Environmental, Social and Governance), que em português significa “Meio ambiente, social e governança”.
Em entrevista para o Mundo Negro, as integrantes do coletivo contaram como tem formado mulheres negras para integrar os conselhos e deram detalhes sobre o desenvolvimento de seu trabalho em prol da diversidade racial e de gênero nas corporações.
Qual a importância da presença de mulheres negras nos conselhos das empresas?
A presença de mulheres negras nos conselhos, para além de garantir a representatividade social do entorno no qual a empresa está inserida em sua estratégia, visto que no Brasil a população negra é mais de 50% por autodeclaração e a mulher negra representa 28% da população, promove redução nas desigualdades sociais e cria um ambiente propício à criatividade por favorecer o acesso de grupos invisibilizados a outras esferas nas quais podem aprender, trocar e evoluir, gerando melhoria social, econômica e ambiental.
O racismo estrutural, só pode ser superado, se houver o rompimento com padrões comportamentais e atitudinais que hoje são normalizados nos ambientes corporativos assim como na sociedade, a mudança precisa acontecer de forma consciente e perene. Aliar o ESG como norteador de ações que poderão ser monitoradas e aferidas, garante transparência e permite criar modelos que servirão de base para outras ações inclusivas e sustentáveis, garantindo permanência e equidade.
Como manter o trabalho que estão realizando para que mais mulheres pretas atuem nos conselhos das grandes organizações?
Mulheres negras nas lideranças aumentam a possibilidade da diversidade e equidade estarem na estratégia e na estrutura da companhia como um todo. Voltadas a romper barreiras do preconceito, são lideranças que geralmente agregam pessoas diversas e oportunizam crescimento pessoal e profissional. No Brasil, há um projeto chamado Conselheiras 101, voltado à formação de conselheiras negras que tem em sua base 40 formandas. O que ainda pesa no mercado, no entanto, são as barreiras criadas pelos viéses excludentes.
E como garantir a continuidade de ações como do Pacto das Pretas, para criar um ambiente propício à inovação e inclusão, promover a equidade, se os pontos de partida das pessoas em cargos de liderança não são os mesmos? A partir de ações afirmativas voltadas a reduzir os efeitos dos marcadores que se somam a gênero, como classe social, cor da pele, entre outros que vão afastando as oportunidades, limitando o acesso delas a cargos na base operacional ou média gestão nas empresas, e criando um teto limitante seja por meio de salários três vezes menores que de pessoas não negras, exigências de performance maiores que de outras pessoas que exercem as mesmas atividades, inclusive com descrições de cargos que não levam em conta as realidades das quais a grande maioria dessas mulheres se origina.
Em julho, foi realizado o Primeiro Fórum Pacto das Pretas. Quais resultados vocês têm colhido desde então?
O Fórum surgiu como um espaço que se abre para evidenciar a urgência de se estabelecer, como presença real e permanente, a participação das mulheres negras nos lugares de tomada de decisão. Um esforço coletivo em que buscamos trazer, para o centro das discussões, a necessidade da derrubada dos modos de fazer que se constituem em alicerces racistas, machistas e sexistas. Desde então, nos fortalecemos enquanto iniciativa que inspira, articula e engaja pessoas negras, aliadas, parceiros para adesão e compromisso com os marcadores de gênero e raça.
Conquistamos um espaço periódico para falar dos nossos desafios, potencialidades e caminhos a serem percorridos nas academias, empresas, organizações sociais na perspectiva de romper o isolamento e ampliar a presença feminina nas posições de lideranças. As 25 integrantes conquistaram maior notoriedade nas redes sociais e nos espaços profissionais que atuam, fortaleceram as potencialidades e estão mais empoderadas pessoal e profissionalmente.
Como tem sido o trabalho de encorajar e formar mulheres negras para os conselhos?
Para tanto, a Associação Pacto tem atuado enquanto agente impulsionador para construção de políticas afirmativas, investimento social privado e produção de conhecimento orientando os seus stakeholders numa direção que evidencia a importância de promover a equidade racial, justifica a necessidade de dialogar sobre a especificidade da mulher negra, acompanhar e mostrar caminhos que inspirem cada vez mais empresas e lideranças engajadas na busca por alternativas sustentáveis, justas, socialmente responsáveis e também orientadas a geração de resultados.
Quais os próximos passos do Pacto das Pretas?
O plano de ação do Pacto das Pretas conta as seguintes atividades:
• Palestras, Oficinas e Workshops de Letramento Racial para diferentes grupos e segmentos profissionais;
• Coletivo Vozes Negras que escreve mensalmente com a Conselheira e Embaixadora Rachel Maia;
• Planejamento e Organização do II Fórum Pacto das Pretas a ser realizado em julho que ocorre 2023, período em que se comemora o mês da mulher preta, e que ele entre no calendário racial dos eventos de São Paulo.
• Potencializar a divulgação do Índice ESG de Equidade Racial e disseminação do Protocolo ESG Racial – fomentando a participação das empresas;
• Co-criação no GT Mulheres – Grupo que está elaborando um Índice ESG de Equidade Racial – Mulheres Negras – Relatório sobre Diversidade e Inclusão da Mulher Negra no Mercado de Trabalho Brasileiro;
• Presença na Comissão Gestora da Iª Conferência Empresarial ESG Racial que acontecerá nos dias 29 e 30 de novembro – São Paulo.
Para além das estratégias supracitadas, todo material produzido está disponível no site da Associação, além nos aquilombar, articular, disseminar e participar das atividades que cada pessoa realiza em seu contexto profissional, ativismo ou social.