Mulheres negras na liderança e o apagamento profissional

Por Priscilla Arantes é gerente de comunicação do Sistema B Brasil, e articuladora do Coletivo Pretas B

Hoje, no mundo corporativo, o ESG (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança)
cresce como área fundamental na construção de reputação de qualquer tipo de negócio.
Dentro da pauta, fala-se bastante sobre diversidade e adoção de boas práticas como cotas
de gênero e raça. O investimento em diversidade é um ponto diferencial, por exemplo, para
se tornar uma empresa B, certificada pelo B Lab, organização internacional que reúne
empreendimentos comprometidos com um sistema econômico mais inclusivo, equitativo e
regenerativo.

E neste movimento por empresas diversas, com a distribuição de cargos de lideranças às mulheres negras, surge também a necessidade de potencializar ações antirracistas. Uma líder negra percebe com facilidade, por exemplo, o racismo por trás da fala que questiona a sua capacidade profissional ou a prática de abusos, como tentar silenciar e tirar a autonomia dessa mulher.

Priscilla Arantes, Lygia Anthero e Dila Nascimento – Créditos: Wally Morais

O racismo atinge especificamente as mulheres negras nas empresas em forma de
apagamento, resultante de atitudes como a redução do orçamento do setor que ela lidera,
sua exclusão de reuniões importantes, ou ainda, situações absurdas, como indicar alguma
outra liderança para falar em nome de um projeto feito por ela na imprensa ou eventos.
Todos esses exemplos são reais e bastante comuns, também conhecidos como micro-
agressões cotidianas.

As violências são mais facilmente reconhecidas pois muito antes do ambiente corporativo,
se fazem presentes na experiência de vida da mulher negra na sociedade, estruturalmente
misógina e racista. Antes de acessarem os espaços de tomada de decisão, muitas se viram
pressionadas a se adequarem ao padrão branco, e para isso, mudaram a forma como
ajeitam o cabelo, as roupas que usam e até o próprio tom de voz como estratégia de
carreira. A maioria também alimentou a ideia de que precisariam estudar o dobro em
comparação com as profissionais brancas e o triplo em relação aos homens.

A presença das mulheres negras no universo corporativo depende do combate ao racismo.
Colocar a profissional negra em cargos de liderança é cada vez mais uma missão pelo
coletivo. Mas o desafio é grande, para se ter uma ideia, um pouco mais de 300 negócios
compõem a Rede B no Brasil, país com aproximadamente 21 milhões de CNPJs. Ou seja,
ainda está na faixa das centenas, a quantidade de empresas certificadas e
comprovadamente comprometidas com o ESG.

As cotas de gênero e raça nas empresas são muito recentes e alvo de desconfiança. O
investimento em comitês de diversidade e grupos de afinidade ainda é visto com finalidade
apenas decorativa quando esses setores são criados onde não se vê um negro liderando qualquer outro setor. A adoção dessas práticas só tem credibilidade quando há
contratações de pessoas negras em todas as áreas.

O cargo de liderança para a mulher negra ainda é um lugar novo. As empresas vivem o
desafio de ampliarem a participação das mulheres negras, seja pelo valor agregado da
inclusão na construção da reputação das marcas, ou mesmo pelo que se chama hoje de
PIB negro – o dinheiro que vem da população negra.

Na prática, há empresas que só possuem lideranças negras na gestão do setor de
Diversidade e Inclusão. E essas profissionais se sentem isoladas e enfraquecidas. O
sentimento de impotência é mais forte entre as mulheres negras. Ser a única negra entre
dezenas de brancos ainda é frequente no ambiente corporativo.

O Sistema B tem criado espaços de diálogo com as profissionais negras inseridas no
ecossistema das empresas B, com o objetivo de acolher e empoderar essas mulheres. A
iniciativa é o Coletivo Pretas B, uma ferramenta de aquilombamento. A agenda do projeto
envolve uma rede de apoio engajada em ações como mapeamento, mentorias, consultorias
e capacitação.

A experiência aponta para um futuro de equidade. Mulheres negras na liderança são aliadas
na promoção da diversidade. A partir do que observamos entre as empresas B, onde elas
conseguem acessar a liderança em setores variados, suas presenças contribuem para que
todos se sintam livres para serem quem são e não ficarem limitados a aceitar o cargo que
aparece, mas aquele que faz mais sentido para a carreira sonhada. Lideranças negras
influenciam na transformação cultural por um mundo do trabalho sem preconceitos e mais
saudável.

*Priscilla Arantes é gerente de comunicação do Sistema B Brasil, e articuladora do Coletivo
Pretas B, um projeto que apoia mulheres negras na rede do Sistema B Brasil por meio de
mapeamento, mentoria, consultoria e capacitação, e fundadora do Instituto Afroella.

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